Carta-circular de Agostinho Neto aos estudantes

Cota
0098.000.007
Tipologia
Circular
Impressão
Policopiado
Suporte
Papel Comum
Autor
Agostinho Neto, Presidente do MPLA
Locais
local doc
URSS
Data
Idioma
Conservação
Razoável
Imagens
3
Acesso
Público
Carta-Circular aos estudantes

Moscovo, 15 de Novembro 1967

Aos queridos camaradas estudantes angolanos na URSS

Camarada:
1- Durante a passagem de vários membros do Comité Director por este País, e nomeadamente durante a permanência na capital da URSS da delegação do nosso Movimento para as solenes comemorações da Revolução de Outubro, não houve a oportunidade de percorrer as cidades por onde se encontram dispersos os estudantes angolanos membros do MPLA, temporariamente afastados do nosso território nacional onde se desenvolve com sucesso a luta pela libertação completa do nosso povo da dominação colonial.
2- A falta de uma informação constante e conveniente sobre os acontecimentos ligados ao desenvolvimento da luta, não tem facilitado aos camaradas estudantes o conhecimento dos progressos feitos nem das novas tarefas que se põem ao nosso Movimento ou dos deveres actuais de cada estudante.
3- Assim, muitos estudantes não compreenderam devidamente as decisões tomadas pelo Congresso Constitutivo dos Estudantes Angolanos, realizado em Brazzaville em Setembro de 1966, da qual resultou a formação da União dos Estudantes Angolanos (UEA). Devemos registar com o maior orgulho e satisfação, que o Presidente eleito dessa Organização já se encontra no interior da Primeira Região, ocupando-se da formação da Juventude, sob as difíceis condições que a guerra acarreta. Outros membros da U.E.A. estão dando contribuição válida para superar as dificuldades naturais da nossa luta.
4- Nesta carta que vos dirijo com o fim de facilitar a vossa compreensão da orientação do nosso Movimento: TODOS PARA O INTERIOR! desejo expor-vos alguns dos pontos mais salientes dessa palavra de ordem:
a) No plano Político, é forçoso reconhecer que somente pela insurreição armada e total do nosso povo, poderemos chegar à vitoria contra o colonialismo português e empreender a marcha para a reconstrução nacional, seguindo as vias que nos livrem do neocolonialismo e da submissão económica aos países capitalistas. Por isso é dever de cada militante do MPLA, seja onde estiver, de fazer que todos os angolanos participem activa e dignamente da nossa luta de libertação.
b) Tem sido evidente o progresso da nossa acção militar em Cabinda, no norte e na parte sul-oriental do país.
Em Cabinda, depois de um período de desorientação, provocada pela traição de Alexandre Taty, ao mobilizar uma parte da Juventude Cabinda pra seguir o conselho português: «primeiro lutem contra o M.P.L.A. que anda a fazer confusão nesta terra e depois vos daremos a independência», depois deste período, dizia eu, a população está-se tornando mais activa e as notícias que nos chegam nas últimas semanas mostram que o povo compreendeu o logro em que caiu e volta-se para o M.P.L.A., como força capaz de se opôr consequentemente aos colonialistas. O CREC (Comité Revolucionário do Enclave de Cabinda) criado pelo oportunista Nzita André instalado em Ponta Negra e estranhamente autorizado pelo Governo de Brazzaville a funcionar ali não conseguiu mobilizar senão alguns elementos corrompidos e que normalmente trabalham para a Pide portuguesa.
Nos Dembos e Nambuangongo, depois do envio de abastecimento em material e homens e nosso Movimento, sob o comando do camarada Jacob Caetano, conquistou posições estratégicas que lhes permitem não só defender a população heroica daquela região, mas também impedir que os bandos contra-revolucionários da UPA voltem a comprometer naquela região a nossa acção patriótica. Segundo as notícias recebidas nas últimas semanas o conhecido António Fernandes desapareceu e Panzo Glória fugiu para o Congo. Toda a população está pois sob o controle do M.P.L.A. a partir do rio Loje.
Nos distritos de Moxico e de Cuando-Cubango, verifica-se o maior progresso e a maior actividade, alargando-se constantemente as áreas de luta. Certamente os camaradas têm tido conhecimento dos êxitos obtidos pelos comunicados frequentemente publicados nos jornais de todo o mundo. Nesta Região, a Direcção do nosso Movimento impôs como tarefa aos militantes que ali se encontram, não somente o aumento da luta militar contra o colonialista, não só a intensificação da preparação dos quadros políticos e militares no CIR instalado numa base, mas também fazer compreender a população e fazê-la participar das tarefas de reconstrução nacional, tais como, o aumento da produção agrícola, o estabelecimento do comércio para suprir a população em alguns produtos que faltam completamente, como sabão, fósforos, roupa, sal e açúcar; assim como no incremento da educação e da assistência médica.
Como os camaradas estudantes podem imediatamente ver, o alargamento da nossa luta, impõe cada vez maiores responsabilidades e a presença no terreno de mais quadros capazes de dirigir e cumprir correctamente com as tarefas impostas pela direcção do nosso Movimento. E não somente no plano militar, é exigida cada vez maior soma de conhecimentos técnicos e de aperfeiçoamento em determinadas especialidades, como também nos planos não estrictamente militares, como por exemplo no que respeita a assistência médica, a instrução em geral (necessitados iniciar uma campanha massiva de alfabetização), aperfeiçoamento das técnicas agrícolas, como ao estabelecimento das indústrias mais elementares.
Tudo isto EXIGE A PRESENÇA DOS ANGOLANOS QUALIFICADOS NO INTERIOR DO PAÍS.
c) Os nossos inimigos não deixam de agir para pretender paralisar esta acção patriótica do MPLA. No norte, além de Alexandre Taty, cuja neutralização nós podemos encarar para mais ou menos breve tempo existe também o fantoche dos americanos, Holden. Este, aliado ao governo Congolês e com o auxílio de técnicos negros americanos que têm estado a «treinar» os seus adeptos em Kinkuzu, não têm outra acção senão de impedir o abastecimento dos nossos guerrilheiros através do Congo-Kinshasa. Já é conhecida a sua última acção, empreendida em estratégia colaboração com o governo de Mobutu de apelar para o exército congolês afim de impedir, no mês de Julho deste ano, a passagem para a primeira região de 200 dos nossos militantes, com um grande volume de equipamento. E, embora os nossos militantes tenham sido libertados alguns dias depois, graças à intervenção de alguns governos africanos, todo o armamento e outro material, ainda não foi devolvido.
Quer dizer que o Congo, apesar de estar a sofrer a pressão de mercenários cujas bases se encontram em Angola, não têm a possibilidade de nos permitirem o desenvolvimento da nossa luta que poderia em breve tempo, resolver também o seu próprio problema. Caros camaradas, devemos compreender que neste caso aparentemente contraditório o que acontece é o choque entre os imperialismos americano e europeu (belgo-franco-britânico) que, nenhum deles, tem interesse numa completa libertação do nosso país. Holden e Mobutu, não são senão instrumentos dos mais modestos desta luta de interesses e, em Angola, só Desejo-vos boa saúde.
A vitória é certa. Bom Trabalho.

*[Rubricado: Agostinho Neto].
Agostinho Neto
Presidente do MPLA
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