Discurso de Amílcar Cabral na CONCP?

Cota
0088.000.049
Tipologia
Discurso
Impressão
Policopiado
Suporte
Papel Comum
Autor
Amílcar Cabral
Data
1966 (estimada)
Idioma
Conservação
Razoável
Imagens
11
Acesso
Público

*[Manuscrito: Amílcar Cabral - S/ data - 66 ou 65”]

Caros camaradas e amigos:

Não vou fazer um discurso. Vou falar-vos como camarada e companheiro de luta.

Contrariamente ao que se possa supor, não vou falar da luta na Guiné e em Cabo Verde. Todos vocês conhecem já o bastante desta luta. Por outro lado, têm aqui uma pequena exposição onde poderão encontrar muitos dos nossos documentos; podem adquirir no fim da nossa sessão alguns desses documentos e, em caso de necessidade, informar-vos assim melhor do que eu o poderia fazer com as minhas próprias palavras.
Em todo o caso, nós convidamos a virem visitar o nosso país para verem o que lá se passa, todos aqueles para quem os documentos não cheguem. (aplausos). Pedimos-lhes apenas que esperem o fim da estação das chuvas porque as condições são agora muito más. Mas, a partir da metade de Novembro, os que estão aqui nesta sala, e outros, poderão vir ao nosso país, quer seja do Norte, quer seja no Sul, para verem a vida nova que lá construímos, para verem os nossos combatentes expulsar, pouco a pouco, centímetro a centímetro, os retrógrados colonialistas portugueses do solo da nossa pátria africana. (aplausos).

Caros camaradas:

Também não quero repetir saudações. Já tive aqui o prazer, na qualidade de presidente duma das sessões, em substituição do nosso caro companheiro da luta, Agostinho NETO, de apresentar as nossas saudações. Arriscar-me-ia apenas a uma repetição, saudando aqui, particularmente, os nossos irmãos, os nossos caros irmãos da Argélia, porque é a 1ª vez que falo nesta sala na presença deles. Tudo o que nos disse o camarada DOS SANTOS não é bastante para traduzir perante nós, perante a África, perante o Mundo, a singular gratidão que todos nós temos pela Argélia, que nos deu o exemplo a seguir, o exemplo da luta armada para libertar uma parcela querida à África (aplausos).

Caros camaradas e caros amigos:

Vou falar-nos o mais simples e brevemente possível da nossa posição, da nossa situação e, se o quiserem das nossas opções. Gostaríamos que esta nossa rápida análise fosse objectiva, sem paixão. Na realidade, se não perdemos as perspectivas históricas dos grandes acontecimentos da vida da Humanidade; se, mantendo o respeito que devemos a todas as filosofias, não nos esquecermos que o Mundo é criação do próprio homem, podemos considerar o colonialismo como a paralisia ou o desvio, ou mesmo a paragem total, da história dum povo em favor da aceleração do desenvolvimento histórico de outros povos.

Eis porque, ao falarmos do colonialismo português, não o devemos isolar do conjunto de outros fenómenos que caracterizaram a visa da Humanidade desde a Revolução Industrial, desde o advento do capitalismo até à 2ª guerra mundial. Eis porque, ao falarmos da nossa luta - a luta dos povos contra o colonialismo português - não devemos isolá-lo do conjunto dos fenómenos que caracterizaram a vida da Humanidade, em particular da África, após a 2ª guerra mundial.
Lembro-me muito bem desse período. Sim, começamos a envelhecer. Lembro-me muito bem de que, em Lisboa, ainda como estudantes, alguns de nós nos reuníamos, influenciados pelas correntes que sacudiam o Mundo, e começávamos a discutir aquilo a que hoje podemos chamar a reafricanização dos nossos espíritos. Pois bem, alguns desses encontram-se aqui nesta sala. E tal facto, é, caros amigos, uma grande vitória contra as forças retrógradas do colonialismo português. Encontram-se aqui, entre vós, Agostinho NETO, Mário de ANDRADE, Marcelino Dos SANTOS; está aqui entre vós Vasco CABRAL, está aqui entre vós o Dr. MONDLANE.

Todos nós, em Lisboa, alguns de uma forma mais permanente, outros temporariamente, começamos esta marcha, uma marcha já longa pela libertação dos nossos povos.

No decurso da 2ª guerra mundial, milhões de homens, de mulheres e de crianças, milhões de soldados deram a sua vida por um ideal, o ideal da democracia, da liberdade, do progresso, duma vida justa para todos os homens. Nós sabemos evidentemente que a 2ª guerra mundial resultou de contradições fundamentais no próprio campo do imperialismo. Mas sabemos também que um dos objectivos fundamentais dessa guerra lançada por Hitler e a sua horda era a destruição do campo socialista nascente.

Caros amigos:

Sabemos igualmente que no coração de cada homem que se batia nesta guerra havia uma esperança - a esperança dum mundo melhor. Foi esta esperança que nos tocou a todos, fazendo de nós combatentes, combatentes pela liberdade dos nossos povos. Mas, é também necessário dizer abertamente que foram, de igual modo, ou duma forma mais forte, as condições concretas da vida dos nossos povos - a miséria, a ignorância, os sofrimentos de toda a espécie, a alienação dos nossos direitos mais elementares - que nos ditaram uma firme tomada de posição contra o colonialismo português e, por consequência, contra todas as injustiças no mundo.

Caros amigos:

Já nos reunimos muitas vezes, criámos diversas organizações. Vou apenas lembrar uma dessas organizações: o Movimento Anticolonialista - M.A.C. Um dia publicaremos o célebre, o para nós muito célebre e histórico Manifesto do M.A.C., no qual poderão decerto descobrir o prefácio da nossa luta, e se assim o quiserem, também a linha geral da luta que travamos hoje vitoriosamente contra o colonialismo português.

Lutamos contra o colonialismo português. Em toda a luta é fundamental definirmos claramente quem somos nós, quem é o inimigo. Nós, povos das Colónias portuguesas, somos povos africanos desta África ultrajada pelo imperialismo e pelo colonialismo durante décadas e, em alguns casos, durante séculos. Nós somos esta parte de África a que os imperialistas chamaram África Negra. Sim, somos negros. Mas somos homens como todos os outros. (aplausos). Os nossos países são países economicamente atrasados. Os nossos povos encontram-se numa etapa histórica precisa, caracterizada por esta condição de atraso da nossa economia. Devemos estar conscientes disso. Somos povos de África, não inventámos muitas coisas, não possuímos hoje as armas especiais que outros possuem, não temos grandes fábricas, não temos mesmo, para dar às nossas crianças, os brinquedos que as outras crianças possuem, mas temos o nosso coração, as nossas cabeças, a nossa História. Foi esta História que os colonialistas nos tiraram.

Os colonialistas têm o hábito de dizer que foram eles que nos fizeram entrar na História. Demonstraremos hoje que não: eles fizeram-nos sair da História, da nossa própria História para seguir no último lugar do comboio da sua História. Hoje, pegando em armas para nos libertarmos, seguindo o exemplo de outros povos que pegaram em armas para se libertarem, queremos, pelos nossos próprios passos, pelos nossos meios e sacrifícios, regressar à nossa História. (aplausos).

Nós, povos de África que lutam contra o colonialismo português, sofremos condições muito especiais, porque no decurso dos últimos quarenta anos, sofremos a dominação dum regime fascista. Todos vocês sabem muito bem o que isto quer dizer. Nos nossos países, de Cabo Verde a Moçambique, a S. Tomé, a Angola, nunca tivemos liberdade política, sindical ou outra. É isto que caracteriza fundamentalmente a nossa condição para a diferenciar da condição dos outros povos de África que lutaram contra o colonialismo. Foi nestas condições, apesar de todas as interdições a que se referiu o nosso camarada da União Nacional de Trabalhadores da Guiné, que começamos a nossa luta clandestina, foi nestas condições que fomos capazes de fecundar os nossos esforços, os nossos sacrifícios, pegar em armas e hoje estar aqui presentes para reforçar a coordenação da nossa acção para a última fase da nossa luta contra o colonialismo português. (aplausos).

Como todos os povos do mundo nós queremos viver em paz, queremos trabalhar em paz, queremos construir o progresso do nosso povo. Como todos os povos do mundo temos o direito de nos rebelar contra a dominação estrangeira. Como todos os povos do mundo, nós hoje temos uma base legal para a rebelião, para reivindicar os nossos direitos - temos a Carta das Nações Unidas, temos as resoluções das Nações Unidas. E se nem a Carta das Nações Unidas, nem as suas resoluções, nem as próprias Nações Unidas forem suficientes, os nossos povos são suficientes para, por si próprios, à custa dos sacrifícios que eles consentem todos os dias, expulsar para sempre do solo das nossas pátrias o colonialismo português. (aplausos).

Caros camaradas e amigos:

Quem é este inimigo que nos domina, que teima em dominar-nos, desprezando todas as leis e a moral internacionais dos nossos dias? Este inimigo, não é o povo português, nós é Portugal por si mesmo; para nós, combatentes da liberdade das colónias portuguesas, este inimigo é o colonialismo português representado pelo Governo colonial-fascista de Portugal. Mas, evidentemente, um Governo é, duma certa forma, também o resultado de condições históricas, geográficas, económicas, etc. do país que governa Portugal, caros amigos, é um país economicamente atrasado, é um país em que quase 50% da população é analfabeta, um país que figura sempre em último lugar em todas as estatísticas da Europa. A culpa não é do povo português que, num dado momento da sua História, soube mostrar o seu valor, a sua coragem, a sua capacidade e que, hoje mesmo, possui filhos capazes, filhos justos, filhos que também desejam reconquistar as liberdades e a felicidade do seu povo.

Caros amigos:

Portugal é um país sem condições para dominar qualquer outro país. Portugal chegou ao nosso país proclamando que vinha ao serviço de Deus e ao serviço da civilização. Hoje respondemos-lhes de armas na mão: qualquer que seja o Deus dos colonialistas portugueses, qualquer que seja a civilização quer representam, vamos destrui-los, porque destruiremos no nosso país toda a espécie de dominação estrangeira (aplausos).

Caros amigos:

Não me prolongarei muito na caracterização do colonialismo português. O que, nos nossos dias, caracteriza fundamentalmente o colonialismo português é um facto muito simples: é que o colonialismo português - se preferis, a infraestrutura económica portuguesa - não pode dar-se ao luxo de fazer neocolonialismo. A partir deste ponto nós podemos compreender toda a atitude, toda a teimosia cega do colonialismo português em relação aos nossos povos. Se Portugal possuísse um desenvolvimento económico avançado, se Portugal pudesse ser classificado como um país desenvolvido, decerto que hoje não estaríamos em guerra contra Portugal (aplausos).

Mas muita gente critica Salazar, diz mal de Salazar. Salazar é um homem como outro qualquer. Ele tem muitos defeitos, é um fascista, nós odeia-mo-los, mas nós não lutamos contra Salazar, lutamos contra o sistema colonial português. Nós não alimentamos o sonho de que se Salazar desaparecer o colonialismo português desaparecerá (aplausos). Portanto, na base desta característica fundamental - a incapacidade de Portugal para fazer o neocolonialismo - o governo português recusou-se sempre a aceitar todo o pedido de compreensão da nossa parte, o governo português teimou em desencadear no nosso país, na Guiné, em Angola, em Moçambique, e preparar-se para o fazer noutras colónias, uma nova guerra colonial contra a África, contra a Humanidade. Nós, povos pacíficos mas orgulhosos do nosso amor à liberdade, orgulhosos da nossa dedicação à ideia do progresso neste século vinte, pegamos em armas com determinação duma forma inabalável, pegamos as armas para defender os nossos direitos, dado que não há lei alguma no mundo que o fizesse por nós. Eu apenas desejava chamar a vossa atenção para o facto de que somos povos pacíficos, não amamos a guerra; mas a guerra, a luta armada de libertação nacional, foi a única saída que nos deixou o colonialismo português para a reconquista da nossa dignidade de povo africano, da nossa dignidade humana. E queremos dizer que, duma certa maneira, devemos agradecer isso ao governo português. Sim, a guerra implica para o nosso povo muitos sacrifícios, mas implica também muitas vantagens.

Não somos fautores de guerra, e repito que não amamos a guerra; mas vemos hoje, face ao exemplo geral, que a luta armada de libertação nacional cria condições concretas para um futuro livre de certos obstáculos, ela pode contribuir para o desenvolvimento crescente da consciência política dos homens, das mulheres e até mesmo das crianças. Por conseguinte, dado que Portugal nos impôs a guerra, à qual respondemos com a nossa luta armada de libertação nacional, devemos saber tirar desta condição, desta imposição, todas as vantagens. (aplausos).

Mas a nossa luta armada de libertação nacional tem uma significação profunda tanto para a África como para o Mundo. Estamos a provar que povos como o nosso, economicamente atrasados, vivendo no mato algumas vezes quase nús, não sabemos ler nem escrever, não conhecendo mesmo os dados elementares da técnica moderna, são capazes, à custa dos seus sacrifícios e esforços, de forças imperialistas no Mundo. Perguntamos, portanto, perante o Mundo e perante a África: Tinham os portugueses razão quando afirmavam que somos povos não-civilizados, povos sem cultura? Perguntamos: qual é a mais brilhante manifestação de Civilização e de Cultura do que a de um povo que pega em armas para defender a sua pátria, para defender o seu direito à vida, ao progresso, ao trabalho e à felicidade? (aplausos).

Caros amigos:

Devemos estar conscientes, nós, os movimentos de libertação nacional integrados na C.O.N.C.P., que a nossa luta armada não é senão um aspecto da luta geral dos povos oprimidos contra o imperialismo, da luta do Homem pela sua dignidade, pela liberdade e pelo progresso. É neste quadro que devemos ser capazes de integrar a nossa luta. Devemos considerar-nos como soldados, muitas vezes anónimos, mas soldados da Humanidade, na vasta frente de luta que é a África dos nossos dias. Nós, da C.O.N.C.P., batemo-nos em África porque a África é a nossa pátria, mas estaríamos dispostos, todos nós, a ir fosse onde fosse para nos batermos pela dignidade do Homem, pelo progresso do Homem, pela felicidade do Homem (aplausos).

Caros amigos:

É exactamente neste quadro que devemos ter a coragem de proclamar, tanto no decurso desta Conferência como em qualquer outro lado, e de proclamar em voz alta, as nossas opções fundamentais, as nossas opções em favor da Humanidade. Por outro lado, devemos saber definir claramente a nossa posição em relação à África, em relação ao Mundo. Vamos fazê-lo, vamos talvez repetir-nos aqui, mas eu posso afirmar o seguinte: nós, da C.O.N.C.P., aceitamos um compromisso com os nossos povos, lutamos pela libertação total dos nossos povos mas não lutamos apenas para pôr uma bandeira no nosso país e ter um hino (aplausos). Nós, da C.O.N.C.P., queremos que nos nossos países martirizados durante séculos, humilhados, insultados, o insulto nunca mais exista, que nunca mais os nossos povos sejam explorados não somente pelos imperialistas, caros amigos, não somente pelos europeus, não somente pelas pessoas de pele branca, porque nós não confundimos exploração ou factores de exploração com a cor da pele dos homens, mas também nem mesmo pelos negros. (aplausos).

Caros amigos:

Lutamos para edificar nos nossos países, em Angola, em Moçambique, na Guiné, em Cabo Verde, em S. Tomé, uma vida de felicidade, uma vida em que cada homem tenha o respeito de todos os homens, em que a disciplina não seja imposta, onde o trabalho não falte seja a quem for, em que os salários sejam justos, em que cada um tenha o direito a tudo o que o homem construiu e criou para a felicidade dos homens. É para isso que lutamos. Se não o conseguirmos, teremos faltado ao nosso dever, ao adjectivo da nossa luta. (aplausos).

Caros amigos:

Queremos dizer-vos, em relação à África, que nós, da C.O.N.C.P., confiamos no destino da África. Há em África exemplos a seguir e há também em África exemplos que não devemos seguir. Portanto, hoje, a África é rica em exemplos e se, amanhã, trairmos o interesse do nosso povo e dos nossos povos, não será porque o não soubéssemos, será porque quisemos trair. Não merecemos, por conseguinte, a menor desculpa. (aplausos e gritos).


Caros amigos:

Em África, somos pela unidade africana, mas pela unidade africana em favor dos povos africanos. Consideramos a unidade como um meio e não como um fim. A unidade pode reforçar, pode acelerar a realização dos fins a alcançar, mas não devemos trair o objectivo em vista. E mesmo por isso que não estamos muito apressados na realização da unidade africana. Sabemos que ela surgirá, passo a passo, com um resultado de esforços fecundos dos povos africanos. Ela surgirá ao serviço da África, ao serviço da Humanidade. Estamos convencidos, profundamente convencidos, na C.O.N.C.P., que a valorização, em conjunto, das riquezas do nosso continente, das suas capacidades humanas, morais e culturais, contribuirá para criar um espaço humano rico, consideravelmente rico que, pela sua parte, contribuirá para enriquecer ainda mais a Humanidade. Mas não desejamos que o sonho de tal objectivo possa trair a realização dos interesses de cada povo africano. Por exemplo, nós, na Guiné e em Cabo Verde, declaramos abertamente no Programa do nosso Partido que estamos prontos a unir-nos seja com que povo africano for (aplausos) e para isso apenas pomos uma condição: que as conquistas, as aquisições do nosso povo na luta de libertação nacional, as aquisições económicas, sociais, de justiça que prosseguimos, e que já estamos a realizar passo a passo, não fiquem comprometidas pela unidade com outros povos. Essa é a nossa condição para a unidade.

Caros amigos:

Somos, em África, não só por uma política africana que procure defender os interesses dos povos africanos e de cada país africano, mas também por uma política que não esqueça em nenhum momento os interesses do Mundo, de toda a Humanidade. Somos, em África, por uma política de paz e de colaboração fraternal com todos os povos do Mundo.

No plano internacional, caros amigos, defendemos na C.O.N.C.P. uma política de não-alinhamento. E esta política a que mais convém aos interesses dos nossos povos na etapa actual da nossa História. Estamos convencidos disso. Mas, para nós, não-alinhamento, não quer dizer voltar as costas aos problemas fundamentais da Humanidade, à Justiça. O não-alinhamento para nós é não não comprometermos com os blocos, não alinharmos nas decisões dos outros. Nós reservamo-nos o direito de decidir nós mesmo e se, por acaso, as nossas opções, as nossas decisões coincidem com as dos outros, a culpa não é nossa.

Caros amigos:

Somos por uma política de não-alinhamento, mas consideramo-nos profundamente engajados com o nosso povo e com toda a causa justa no Mundo (aplausos). Nós, da C.O.N.C.P., consideramo-nos, caros amigos, como fazendo parte de uma vasta frente de luta para o bem da Humanidade. É compreensível que lutemos primeiro pelos nossos povos. Essa é a nossa tarefa nesta frente de luta. Isto implica todo um problema de solidariedade. Nós, da C.O.N.C.P. somos ferozmente solidários com toda a causa justa. Eis porque nós, da FRELIMO, do M.P.L.A., do P.A.I.G.C., do C.L.S.T.P., como de qualquer outra organização de massa afiliada à C.O.N.C.P., sentimos bater os nossos corações em uníssono com os corações dos irmãos do Vietnam (aplausos) que dão um exemplo singular de como se pode fazer face à mais vergonhosa, á mais injusta agressão da parte dos imperialistas dos Estados Unidos da América contra o povo pacífico do Vietnam. Os nossos corações batem igualmente em uníssono com os nossos irmãos do Congo que no mato deste vasto e rico país africano procuram resolver os seus próprios problemas face à agressão dos imperialistas e às manobras dos imperialistas através dos seus lacaios. Por isso nós, da C.O.N.C.P. gritamos alto e em bom som que somos contra Tschombé, contra todos os Tshombés da África (aplausos e gritos). Igualmente, caros amigos, os nossos corações batem em uníssono com os dos nossos irmãos de Cuba, que mostraram também que um povo, mesmo quando está cercado pelo mar, é capaz de defender de armas na mão, e vitoriosamente, os seus interesses fundamentais e de decidir ele próprio do seu destino. Estamos com os negros dos Estados Unidos da América, estamos com eles nas ruas de Los Angeles, e quando eles são afastados de toda a possibilidade de vida, sofremos com eles (aplausos e gritos).

Caros amigos:

Estamos com os refugiados, os martirizados refugiados da Palestina, que foram injuriados, expulsos da sua pátria pelas manobras do imperialismo. Estamos ao lado dos refugiados da Palestina e apoiamos com toda a força dos nossos corações tudo o que os filhos da Palestina fazem para libertar o seu país, e apoiamos com todas as nossas forças os países árabes e os países africanos em geral para ajudar o povo palestiniano a recuperar a sua dignidade, a sua independência e o seu direito à vida (aplausos). Estamos igualmente com o povo da Arábia do Sul, da Somália francesa (Costa dos Somalis), da Guiné Espanhola; mas estamos duma forma muita reflectida e muito dolorosa, caros irmãos, com os nossos irmãos da África do Sul que enfrentam a mais bárbara das discriminações raciais (aplausos). Estamos absolutamente certos de que o desenvolvimento da luta nas colónias portuguesas, e as vitórias que dia a dia nós alcançamos contra o colonialismo português, são uma contribuição eficaz para a liquidação do vergonhoso, do vil regime de discriminação racial, do “apartheid” na África do Sul. Estamos também certos de que os povos como o de Angola e de Moçambique, e nós mesmos na Guiné e em Cabo Verde, longe da África do Sul, poderão desempenhar amanhã, num amanhã que esperamos que não esteja distante, um papel muito importante para a liquidação final do último bastião do colonialismo, do imperialismo e do racismo em África, que se encontra na África do Sul (aplausos).

Caros amigos:

Somos solidários com toda a causa justa no mundo, mas fortalecemo-nos com a solidariedade dos outros. Recebemos uma ajuda concreta de muita gente, de muitos amigos, de muitos irmãos. Dos SANTOS, há alguns instantes, falou-vos da ajuda da Argélia; poderíamos falar-vos de outras ajudas, de muitos ajudas na própria África. Mas não vou fazê-lo agora. Queria apenas dizer-vos que, na C.O.N.C.P., seguimos um princípio fundamental que é o de contarmos primeiro com os nossos próprios esforços, com os nossos próprios sacrifícios (aplausos). Mas, no quadro concreto da colonização portuguesa, caros amigos, e na etapa actual da história da Humanidade, estamos conscientes também de que a nossa luta não é só nossa. Ela é de toda a África, ela é de toda a humanidade progressista. Eis porque, nós, da C.O.N.C.P., face às dificuldades particulares da nossa luta, e face ao contexto da história actual, tivemos consciência da necessidade duma ajuda concreta por parte da África à nossa luta, duma ajuda concreta da parte de todas as forças progressistas do mundo. Aceitamos toda a espécie de ajuda, venha donde vier, mas nunca pedimos sem olhar a quem a ajuda de que temos necessidade. Nós esperamos apenas a ajuda que cada um pode conceder à nossa luta. É essa a nossa ética da ajuda, caros amigos. Queremos dizer-vos que consideramos nosso dever proclamar aqui em voz alta e clara que temos aliados seguros nos países socialistas. Todos nós sabemos que os povos africanos são nossos irmãos. A nossa luta é deles também. Cada gota de sangue que cai no nosso país, cai igualmente dos corpos e do coração dos nossos irmãos africanos. Mas nós sabemos também que, desde a Revolução Socialista de Outubro e após a 2ª guerra mundial, o mundo mudou definitivamente de face. No mundo, um campo socialista surgiu. Isso mudou completamente a relação de forças e este campo socialista mostra-se hoje muito consciente dos seus deveres internacionais, deveres históricos e não deveres morais, porque os povos dos países socialistas nunca exploram os povos coloniais (aplausos). eles mostram-se conscientes do seu dever e é por isso que eu tenho a honra de vos dizer aqui abertamente, que recebemos ajudas substanciais, eficazes, da parte destes países, que vêm reforçar a ajuda que recebemos dos nossos irmãos africanos (aplausos). Se há pessoas que não gostam de ouvir isto, que venham elas também ajudar-nos na nossa luta. Mas elas poderão estar certas de que nós somos orgulhosos da nossa soberania. Nós, nos manteremos a nossa posição: recebemos ajuda de todos. E receberemos com orgulho a ajuda dos países socialistas porque eles indicam hoje o caminho que pode servir o Homem, o caminho da Justiça (aplausos). Temos aqui nesta sala representantes de países socialistas que cá vieram como amigos. Não perderei esta oportunidade para dizer ao representante da União Soviética, ao representante da China, da República Popular da China, ao representante da Jugoslávia, que aqui se encontram presentes, aos representantes dos países socialistas, que transmitam aos povos trabalhadores que representam, a expressão da nossa gratidão pela ajuda concreta que eles concedem à nossa luta (aplausos e gritos).

Caros amigos:

E que fazem aqueles que não gostam de nos ouvir dizer que os países socialistas nos ajudam? Esses ajudam Portugal, o governo fascista - colonialista de Salazar. Hoje já não é segredo para ninguém que Portugal, o governo português, se não tivesse, se não pudesse dispor da ajuda que lhe concedem os seus aliados da OTAN, não seria capaz de travar a luta que trava contra nós (aplausos). Mas é preciso que digamos claramente o que quer dizer a OTAN. Sim, nós sabemo-lo. A OTAN é um bloco unitário que defende os interesses do Ocidente, da «civilização ocidental». etc. Mas não é disso que queremos falar. A OTAN, são países concretos, governos de Estados concretos. A OTAN são os Estados Unidos da América. No nosso país apanhamos muitas armas dos Estados Unidos da América (aplausos). A OTAN é a República Federal da Alemanha. Temos muitas espingardas «Mausers» apanhadas aos soldados portugueses. (aplausos). A OTAN é, pelo menos de momento, a França. No nosso país há «Allouettes», helicópteros. Mas já começamos a abater os «Allouettes» (aplausos e gritos). A OTAN é ainda, duma certa forma, o governo desse povo heroico que soube dar tantos exemplos de amor à liberdade, o povo italiano. Sim, também apanhámos aos portugueses metralhadores e granadas fabricadas nas oficinas italianas. Mas para nós tão agradável, tão encorajante ouvir um amigo da Itália, um irmão da Itália, dizer-nos palavras tão justas, tão sentimentais e tão sinceras como aquelas que aqui ouvimos ontem ao nosso irmão que falou em nome da Itália (aplausos). Eu queria dizer ao nosso irmão que aqui falou ontem que nós não confundimos o povo italiano com o governo italiano que faz parte da OTAN (aplausos).

Caros amigos:

Portugal tem ainda outros aliados: é a África do Sul, é o Sr. Smith, da Rodésia do Sul, é o governo de Franco, são outros aliados obscuros que escondem a sua face perante a vergonha que isso representa. Mas, caros amigos, toda esta ajuda que o Governo de Salazar recebe para matar as nossas populações, para incendiar as nossas aldeias em Angola, em Moçambique, na Guiné, em Cabo Verde, em S. Tomé, para massacrar as nossas populações, toda esta ajuda, dizíamos, não foi capaz de parar a nossa luta de libertação nacional (aplausos). Pelo contrário, as nossas forças são cada dia mais fortes. Porquê, caros amigos? Porque a nossa força é a força da justiça, é a força do progresso, é a força da história. E a justiça, o progresso, a história são apanágio do povo. Porque as nossas forças fundamentais são os nossos povos.

Caros amigos:

São os nossos povos que apoiam as nossas organizações, são os nossos povos que se sacrificam todos os dias, alimentando todas as necessidades da nossa luta, todas as necessidades fundamentais da nossa luta. São os nossos povos que garantem o futuro e a certeza da nossa vitória.

Caros amigos:

Possuímos uma outra força: é a força da nossa unidade. Unidade em Angola. É mentira, caros amigos, é pura mentira que não haja unidade em Angola. Pessoalmente, eu sou testemunha da unidade de Angola. Eu militei em Angola ao lado dos nacionalistas de Angola. Em Angola, no interior de Angola, em Luanda, no Norte de Angola, a Sul, a Leste, a Oeste, eu nunca vi as pessoas divididas diante do colonialismo português (aplausos). E eu posso testemunhar que no interior deste país nunca conheci outra organização que não fosse o M.P.L.A. (aplausos e ritos de entusiasmo). Foi essa, caros amigos, a força dos representantes do M.P.L.A. no exterior, a força fundamental do nosso irmão Dr. Agostinho NETO (aplausos e gritos de entusiasmo).

Caros amigos:

Se o M.P.L.A. não estivesse seguro de que o povo angolano está unido à sua volta, como seria possível à sua direcção conseguir o milagre de operar todas essas transformações a que, assistimos recentemente, em África? Como é que o M.P.L.A. teria levado uma organização como a própria O.U.A. a reconsiderar a sua posição e a conceder hoje uma ajuda concreta ao M.P.L.A. para a luta de libertação em Angola? (aplausos e gritos). Nós dizemo-vos, caros amigos, que a nossa força é a unidade: unidade em Moçambique, unidade criada no interior do país, unidade traduzida no exterior do país por uma frente comum que reflecte tudo o que se passa no interior de Moçambique e que possui aqui a sua sede exterior - a FRELIMO (aplausos). Caros irmãos, a FRELIMO, baseada na unidade sólida do povo moçambicano e cada dia mais forte, não defrontou no começo da sua luta com problemas de unidade. Mas o inimigo não desespera. O inimigo está sempre vigilante. E no próprio momento em que a luta de Moçambique começa a tomar amplitude, a impor-se à África e ao mundo, vê-se começar a nascer, por aqui e por ali, pequenos movimentos moçambicanos.

Caros amigos:

Podemos garantir-vos aqui, em nome da C.O.N.C.P., e também particularmente em nome do nosso partido, que tais manobras não triunfarão (aplausos), elas não passarão! (aplausos e gritos de entusiasmo). Compreendemos muito bem as manobras do imperialismo. Compreendemos muito bem todas as manobras subreptícias do colonialismo português. Mas estamos dispostos, ferozmente determinados, a nunca compreender que um Estado, qualquer que ele seja, que reclama o seu amor a África, à Humanidade, ao progresso, à justiça, à liberdade, possa apoiar, alimentar, manter as manobras dos colonialistas portugueses na criação de pequenos movimentos de divisão (aplausos e gritos de entusiasmo).

Caros amigos:

Sim, unidade também em S. Tomé. O povo de S. Tomé foi dos primeiros a sofrer massacres da parte do colonialismo português. Em 1953, se não estou erro, num só dia, os colonialistas portugueses mataram - a 4 de Fevereiro, na mesma data da insurreição de Angola - em S. Tomé, 1.000 pessoas, 1.000 africanos, de uma população de 40.000 pessoas. Porquê? Porque eles não queriam sujeitar-se, submeter-se ao trabalho forçado. O povo de S. Tomé merece o nosso maior respeito nesta luta. S. Tomé é uma pequena Ilha no Golfo da Guiné, mas o povo de S. Tomé deu-nos o primeiro exemplo de rebelião contra a dominação colonial portuguesa. Sim, mas eu também conheço S. Tomé: o povo de S. Tomé está unido, todas as camadas sociais estão unidas contra o colonialismo português. A um dado momento da evolução da nossa luta, eram mesmo, talvez, as pessoas mais conscientes do ponto de vista político. E nós, na C.O.N.C.P., estamos determinados a não admitir que indivíduos, no exterior, vivendo como querem, passeando, passando as férias aonde querem, e reclamando-se dirigentes do povo de S. Tomé, continuem a destruir, a sabotar, a retardar o avanço, o progresso da luta do povo de S. Tomé (aplausos e gritos de entusiasmo). A C.O.N.C.P. soube, num dado momento, tomar uma posição nítida em relação ao caso moçambicano. Também havia manobras, tentativas de sabotagem da luta do povo de Moçambique, através de certos indivíduos. A C.O.N.C.P. soube corajosamente, como disse o nosso irmão MONDLANE, denunciar estes indivíduos e levar à exclusão tais indivíduos da luta do povo moçambicano. Podemos fazer o mesmo com qualquer outro povo e eu digo-vos aqui que, se amanhã nos virem a nós, do P.A.I.G.C., que se me virem a mim, como dirigente do P.A.I.G.C., trair, no seio da C.O.N.C.P., os interesses do nosso povo, vocês devem fazer tudo por me expulsar, porque não merecerei então permanecer mais na vossa companhia (aplausos e gritos).

Caros amigos:

Sim. Unidade também na Guiné e em Cabo Verde. Não falaremos muito disso. Como seria possível que um pequeno povo de 800.000 habitantes e de 200.000 nas Ilhas, distanciadas de quase 500 Kms, que um pequeno país de 40.000 Km2, um país atrasado, um país ocupado por 20.000 soldados portugueses, como seria possível - perguntava eu - que um pequeno país que nunca teve uma experiência da guerra moderna, que estava dividido em tribos, batesse os colonialistas portugueses como nós o batemos, libertasse quase metade do eu território num ano e meio de luta? Como seria possível fazer tudo isto se não estivéssemos unidos? Não. Não percamos tempo a falar da nossa unidade porque a prova mais concreta da unidade do nosso povo na Guiné e em Cabo verde são as vitórias flagrantes, espantosas da nossa luta de libertação nacional! (aplausos e gritos).

Caros amigos:

No nosso país também houve tentativas de divisão. Pessoas a quem não interessava a nossa luta de libertação nacional tornaram-se inimigos do nosso Partido e tentaram criar no exterior do nosso país pequenos movimentos de libertação nacional. Chegou mesmo a criar-se “frentes”, mas muito longe do nosso país. Não discutimos, não publicamos qualquer documento para combater esses pequenos movimentos do exterior. Nós, nós trabalhámos no interior do país, mobilizámos as massas populares do nosso povo, formámos quadros políticos no mato, aproveitámos cada elemento válido do nosso povo, pegámos em armas, organizámos as tabancas, as cidades e aguardámos no nosso país não só as manobras militantes ou políticas dos colonialistas portugueses mas também a chegada dos ditos movimentos do exterior. Felizmente essa gente não tem tempo para lutar, para se bater seja contra quem for e hoje todos esses movimentos estão completamente desintegrados. Não por causa das palavras, mas por causa da realidade concreta do nosso país (aplausos). É por isso que aqui, caros amigos, o nosso Partido como membro da C.O.N.C.P., tem o dever de dizer a todos os nossos irmãos que se batem nas outras colónias que não percam o seu tempo a combater os movimentos do exterior. É necessário sempre ganhar tempo, mobilizar cada dia mais o povo, as massas populares, viver no seio delas, bater-se ao seu lado, organizar as aldeias, organizar por toda a parte, mostrando ao povo, a cada passo, a cada dia, em cada momento, que vale a pena bater-se porque ele é o primeiro, o único a ganhar com a luta (vivos aplausos).

Sim, também devemos falar aqui, em nome da C.O.N.C.P. e do nosso Partido, das perspectivas da nossa luta. Os nossos amigos desejam conhecê-las porque querem ajudar-nos, reforçar as suas ajudas. Os nossos inimigos desejam conhecê-las porque querem corrigir os seus planos.

Em Angola, como em Moçambique ou na Guiné, a perspectiva da luta é desenvolver cada vez mais a consciência política dos nossos povos. Ela é, igualmente, reforçar cada vez mais, a nossa unidade e desenvolver a cada passo a luta armada de libertação nacional. Mas há ainda o povo de Cabo Verde que, ele também, é organizado e dirigido pelo nosso Partido - porque nós, na Guiné e em Cabo Verde somos as mesmas pessoas. Cabo Verde foi fundamentalmente povoada por escravos levados da Guiné. Possuímos um destino comum, temos a mesma língua e um só Partido. A perspectiva da luta em Cabo Verde é, igualmente, a de desenvolver cada vez mais a consciência política das massas que atingiu já um nível bastante elevado para passar a uma nova fase da luta. Declaramos aqui perante vós, e isto daqui em diante constitui um objectivo sagrado no seio da C.O.N.C.P., que nos preparamos, que o nosso povo se prepara activamente em Cabo Verde para desencadear a luta armada contra os colonialistas portugueses (aplausos). Que os colonialistas portugueses o saibam: vamos desencadear a luta armada em Cabo Verde. Evidentemente que não vamos dizer o dia e a hora em que o faremos. Mas vamos fazê-lo (aplausos). Que eles o saibam e que também se preparem porque estamos certos disso. Assim como um Baptista e todos os seus agentes, os servidores do imperialismo, e o próprio imperialismo, não foram capazes de evitar a vitória das forças progressistas em Cuba, nós, igualmente, em Cabo verde, seremos capazes, na base dos esforços do nosso povo, que já sofreu tanto no decurso da sua história, de bater os colonialistas portugueses e expulsá-los definitivamente do solo da nossa pátria (aplausos).

Caros amigos:

Na perspectiva da nossa luta, esta conferência coloca-se duma maneira muito adequada. Vocês compreendem o interesse da nossa conferência. Devemos reforçar a nossa unidade, não somente em cada país mas entre nós, povos das colónias portuguesas. A C.O.N.C.P. tem para nós uma significação muito especial. Possuímos o mesmo passado colonial, aprendemos a falar e a escrever o português, mas temos uma força ainda mais forte, talvez mesmo mais histórica: é o facto de termos começado a lutar em conjunto. É a luta que fez os camaradas, que faz os companheiros do presente e do futuro. A C.O.N.C.P. é para nós uma força fundamental de luta. A C.O.N.C.P. está no coração de cada combatente do nosso país, de Angola, de Moçambique. A C.O.N.C.P. também deve representar, e nós temos orgulho nisso, um exemplo para os povos da África. Porque nesta luta gloriosa contra o imperialismo e o colonialismo em África somos as primeiras colónias que se reúnem para discutir em conjunto, para planificar em conjunto, para estudar em conjunto os problemas respeitantes ao desenvolvimento da sua luta. Isso não deixa de ser uma contribuição muito interessante para a história da África e para a história dos nossos povos.

Caros amigos:

Não podemos deixar perder o que já fizemos no quadro da C.O.N.C.P. e asseguramo-vos aqui que estamos determinados a sair desta conferência com resultados concretos. Estamos determinados a sair daqui e a reforçar a nossa luta duma maneira coordenada, a acelerar, portanto, significativamente, a quebra total, a derrota total do colonialismo português nos nossos países (aplausos).

Encontramo-nos hoje numa fase nova da nossa luta. A luta de libertação nacional desenvolve-se em 3 frentes. Isso implica maiores responsabilidades para nós, quer seja para cada um dos nossos partidos, quer seja para o C.O.N.C.P. no seu conjunto. Mas implica também responsabilidades maiores para os nossos amigos e para os nossos irmãos. A África deve dar-se conta do problema. Sim, a África ajuda-nos. Há países africanos que nos ajudam o máximo que podem, duma forma directa, duma forma bilateral. Mas a nossa opinião é que a África não nos ajuda o bastante. A nossa opinião é que a África nos pode ajudar muito mais, se ela chega a compreender exactamente o valor e a importância da nossa luta contra o colonialismo português (aplausos e gritos). Esperamos, portanto, que na base da experiência dos 2 anos que já decorram depois de Addis-Abeba, a próxima Conferência dos Chefes do Estado Africanos saberá tomar medidas concretas para reforçar duma forma concreta e eficaz a ajuda aos combatentes da Guiné, de Cabo Verde, de S. Tomé, de Moçambique e de Angola. Por outro lado, os nossos amigos do mundo, e em particular os nossos amigos dos países socialistas, estão seguramente conscientes de que o desenvolvimento da nossa luta implica o desenvolvimento da sua ajuda fraternal. Estamos convencidos de que tanto as forças dos países socialistas como as forças progressistas do Ocidente saberão desenvolver cada dia a sua ajuda, o eu apoio político, moral, material, à nossa luta, de acordo com o desenvolvimento da nossa luta.

Caros amigos:

Falei-vos demasiado, mas eu tinha necessidade de vos dizer estas coisas. Acabarei simplesmente por estas palavras: no nosso país, na Guiné e em Cabo Verde, as tropas coloniais encontram-se acantonada num espaço cada vez menor. Hoje, se queremos bater-nos contra as tropas coloniais, temos de ir procurá-las às casernas. Mas devemos ir lá porque é necessário acabar com o colonialismo português no nosso país (aplausos). Estamos certos, caros camaradas e amigos, que em breve o mesmo acontecerá em Moçambique. E começa já a acontecer em certas zonas. Em Angola será o mesmo. E começa já a sê-lo em Cabinda. Caros amigos: os colonialistas portugueses começam a ter medo de nós. Eles sentem agora que estão perdidos, mas garanto-vos que se eles aqui estivessem presentes, ao ver-vos, ao ouvirem falar todas as delegações que aqui se expressaram, ao ouvirem falar cada um de nós, ao verem esta assistência, ao verem o acolhimento fraternal que nos deu o Governo da Tanzânia, o seu medo seria ainda maior. Mas, camaradas e irmãos, vamos para a frente, de armas na mão, por toda a parte onde se encontre um colonialista português. Vamos para a frente, destruamo-lo, e libertemos depressa o nosso país das forças retrógradas do colonialismo português. Mas preparemo-nos também, dia a dia, com vigilância, para não permitir que o neocolonialismo que começa já a tornar-se um cancro em certos cantos do mundo e da África, atinja o nosso próprio país.
Viva a nossa luta de libertação nacional! Vivam os esforços dos nossos povos pela libertação dos nossos países! Viva a solidariedade activa à nossa luta dos povos da África e dos países socialistas, e de todas as forças progressistas do mundo! Abaixo o imperialismo, o colonialismo e o neocolonialismo! (aplausos e gritos delirantes).

Discurso de Amílcar Cabral (talvez na CONCP).

A publicação, total ou parcial, deste documento exige prévia autorização da entidade detentora.

Nomes referenciados