Discurso de Neto pelo «4 de Fevereiro» in Vitória ou Morte

Cota
0082.000.030
Tipologia
Discurso
Impressão
Policopiado
Suporte
Papel Comum
Autor
Agostinho Neto, Presidente do MPLA
Data
Idioma
Conservação
Bom
Imagens
4

[Começa na Pág. 3]
4 de Fevereiro


BRAZZAVILLE

A comemorar o 5º aniversario do 4 de Fevereiro realizou-se na Câmara Municipal de Brazzaville uma sessão solene em que participaram representantes das autoridades locais, membros do corpo diplomático de países africanos, europeus e asiáticos acreditados no pais. A abrir a sessão o camarada Presidente do MPLA Dr. Agostinho Neto proferiu um discurso que Vitoria ou Morte passa a reproduzir na integra.

Excelências
Minhas Senhoras
Meus Senhores
Camaradas

É hoje a 5a. vez que celebramos o 4 de Fevereiro. O significado desta data memorável para o Povo angolano não escapou a ninguém. A insurreição armada angolana praticamente começou com acção armada comandada pelo MPLA, que, em seguida, se alastrou a outras regiões do País.

A conjuntura internacional era, nesse momento, extraordinariamente favorável à eclosão da luta armada. Em Junho de 1960 fora aprovado na ONU a declaração da Independência dos Povos sob a dominação colonial; no país vizinho Congo-Leopoldville, a acção heróica do herói congolês Patrice Lumumba, electrizava as populações do Norte de Angola. Por toda a África enfim, vivia-se a euforia das independências recentes.

Contudo, ainda que as condições históricas fossem favoráveis, a infiltração imperialista no nacionalismo angolano tornou pouco tempo depois, a luta difícil, afastou-a dos seus objectivos reais e assistimos assim à luta fratricida e à divisão das forças combatentes em duas tendências principais.

Ainda hoje não foi ultrapassada esta falta. A corrente reacionária do movimento libertador renega a união das nossas forças, crendo poder evitar a presença do MPLA em Angola.

É evidente que o principal motivo desta recusa sistemática é o motivo da hesitação de alguns países africanos que nos ajudam são devido à afirmação do MPLA como organização pro-progressistas.

Dado o reflexo revolucionário de que a África é vítima os nossos amigos poderão supor que o MPLA não resistirá aos assaltos do imperialismo.
Lembrarei entretanto que o MPLA já assistiu a um forte assalto imperialista, exactamente em 1963, quando a OUA cedendo as pressões resolveu considerar-nos inexistentes e pediu aos países africanos para não nos ajudar. Estes apressaram-se em reconhecer um «governo angolano» que conceitue hoje a humilhação da África. Nesta ocasião, graças, a firmeza dos seus militantes, graças aos seus amigos fiéis, graças, sobretudo à influência revolucionária do Povo congolês em Agosto de 1963, o MPLA resistiu.
Ouve-se muitas vezes dizer que a luta em Angola não está mais avançada que a unidade. A unidade é apresentada como remédio único de salvar o Povo angolano. Hipertrofia-se o valor da unidade.
Estamos de acordo que a unidade é um factor essencial numa luta de Libertação. Nós saudemos-la. Fazemos hoje, tal como temos feito sempre, esforços para obter a unidade. A unidade favorece consideravelmente a acção contra o inimigo.
Considerando, entretanto, objectivamente as circunstâncias da luta em Angola, compreendemos que não há apenas a unidade, que não podemos colocar a unidade como preâmbulo para a revolução dos problemas da luta. Como ponto de partida ou como pretexto.

Vejamos:
O MPLA não tem liberdade de acção em certos países limítrofes, enquanto que florescem aí abundantemente os pretensos partidos políticos angolanos que não têm nenhuma influência e que não conduzem nenhuma acção contra o colonialismo.

Por falta de liberdade de acção o MPLA não pode fazer chegar à grande maioria do nosso Povo o material de guerra que possui e de que o Povo tem necessidade. É justamente ao MPLA, hoje a organização política angolana mais importante, mais capaz que possui o apoio popular, que não se confere a liberdade de acção ou simplesmente de passagem em certos países limítrofes.
E esta questão é muito importante porque, uma vez resolvida, o problema da unidade apresentar-se-ia talvez noutros termos.
Pensamos que a OUA, os países amigos que nos querem ajudar devem sempre pôr o problema da unidade ligado ao da liberdade de acção ou de passagem nos países limítrofes, afim de serem suspeitados as proporções do nosso problema real.
A luta das colónias portuguesas dá-nos exemplos bem evidentes se a luta anti-colonial se desenvolve na Guiné dita portuguesa é porque o país do grande africano Sékou Touré permite a liberdade à organização mais dinâmica da Guiné e das ilhas de Cabo Verde - o PAIGC. Esta organização não fez unidade com as organizações reacionárias e colaboracionistas que não fariam senão entravar a sua luta. E a sua luta avança.
Se em Moçambique a FRELIMO desenvolve a guerra contra os colonialistas portugueses, é porque a Tanzânia lhe confere a liberdade de acção e que permite separar imediatamente a FRELIMO de outras organizações pseudo nacionalistas.
Mesmo no caso angolano é preciso notar que se a luta na região angolana de Cabinda, não é consequência da unidade com as organizações reacionárias ou com os colaboracionistas que existiam no Congo-Leopoldville.

Essas organizações acabaram simplesmente por desaparecer.
Quero dizer que não nos parece razoável subordinar o problema angolano à unidade e que se fala muito pouco da liberdade de acção nos países limítrofes.
Sentimos jubilosos quando *[escrito à mão: falamos] de liberdade de acção diante dos nossos irmãos africanos dado que toda a África está empenhada na luta contra o colonialismo.
O recuo das forças revolucionárias na África não deve fazer-nos perder as perspectivas.
É com uma grande apreensão que nós vemos certos compromissos tácticos realizados na África na esperança de evoluir mais agilmente vias revolucionárias.
A firmeza do Povo do Vietnam é um exemplo vivo e actual da possibilidade de fazer face ao imperialismo.
É cepticismo que assistimos a complacência e à apregoada ofensiva de paz americana no Vietnam e compreendemos imediatamente que essas suspensões tinham por único fim preparar um novo período de actos agressivos contra o pacífico Povo do Vietnam. Tinham também por fim fugir das dificuldades no Vietnam do Sul e dar satisfação à pressão da opinião pública internacional. Mas o essencial é que o Povo Vietnamita se mantém firme e combativo.
Regozijo-me nesta ocasião render homenagem ao Povo heroico Vietnamita e aos seus dirigentes que souberam conduzir sem desfalecimento a luta contra o imperialismo.

Excelências
Camaradas

Portugal é um país que manterá a todo custo as suas colónias, tanto mais que os interesses materiais e estratégicos que elas possuem ultrapassem largamente as fronteiras portuguesas.
Não é senão o desenvolvimento da guerra que poderá obrigar os colonialistas e os seus aliados da OTAN a modificar as suas posições. Nenhuma actividade diplomática atingirá o seu objectivo se não for mantida por uma forte pressão popular.
É necessário, a todo o custo, aumentar o nível de guerra e a luta que forçará Portugal e os comparsas a modificar a sua atitude.
O MPLA, os seus militantes e os seus dirigentes meditam neste momento o exemplo dado pelos heróis do 4 de Fevereiro.
Foi a audácia que fez e eclodir a insurreição: a coragem e a certeza nos resultados finais da luta.
Rendendo homenagem aos nossos heróis pensamos também na necessidade de fazer imediatamente um passo adiante para encontrar a liberdade.
Os que apodrecem nas masmorras da PIDE em Angola, nas Ilhas de Cabo Verde e em Portugal; os que lutam neste momento nas florestas de Angola; os exilados não representam senão uma parte de um grande povo submetido à escravatura e à dominação colonial portuguesa e é nosso dever de tudo fazer pela sua libertação.
Neste momento em que o problema angolano se apresenta de uma maneira dramática, dirigimos um novo apelo à OUA e aos países amigos afim que nos ajudem e vencer as dificuldades políticas que entravam a nossa luta.
Voltemos ao ponto de partida.
O MPLA tem a necessidade de liberdade acção nos países limítrofes.
De qualquer modo, o Povo angolano dirigido pela sua organização de vanguarda, o MPLA derrotará o colonialismo.
Para terminar, quero agradecer ao Povo congolês, ao seu Partido, o MNR e ao Presidente, Sua Excelência Massamba-Débat, pela ajuda eficaz que sempre dispensaram ao nosso Movimento, depois de Agosto de 1963.
Quero também agradecer aos países africanos que nos ajudam do ponto de vista moral, político, e material, contribuindo assim para a libertação do nosso Povo.
Agradeço, enfim, aos países socialistas que têm sempre dispensado um apoio concreto à nossa luta.

VIVA O 4 DE FEVEREIRO!
VIVA A SOLIDARIEDADE AFRICANA CONTRA O COLONIALISMO E CONTRA O IMPERIALISMO!
VIVA A UNIÃO DO MUNDO INTEIRO CONTRA O IMPERIALISMO!
VIVA O M.P.L.A.!


*Dentro de caixa
A Luta Armada é a Linguagem que o colonialismo português entende.
Ensinemos-lha, Angolanos!


*Dentro de caixa

AOS NOSSOS LEITORES E AOS NOSSOS MILITARES

VITORIA OU MORTE apresenta as suas desculpas aos seus leitores que por altura do 4 de Fevereiro enviaram cartas que não puderam ser publicadas por falta de espaço.

Estava o Boletim a ser rodado quando fomos informados que se encontrava em Brazzaville o Secretário Executivo do Comité de Libertação da OUA em viagem de contactos com o MPLA.

Aproveitamos a oportunidade para informarmos aos leitores do nosso órgão que o MPLA pretende fazer inovações na Secção de Imprensa, encarando a hipótese de o Boletim passar a ser impresso.
Tudo dependerá da maneira como serão resolvidos alguns problemas técnicos delicados.

Notícias de última hora dizem que os nacionalistas do território sob dominação colonial espanhola do Rio Muni desencadearam a luta armada.
Enquanto isso os marroquinos pedem a integração dos seus irmãos dominados pelos espanhóis.

Discurso de Agostinho Neto pelo «4 de Fevereiro» in Vitória ou Morte de 19 de Fevereiro de 1966 (fotocópia).

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Nomes referenciados