Colectânea de documentos sobre o GRAE

Cota
0064.000.027
Tipologia
Dossier
Impressão
Policopiado
Suporte
Papel comum
Autor
MPLA - Movimento Popular de Libertação de Angola
Data
Jul 1964
Idioma
Conservação
Bom
Imagens
10
Observações

Foi publicado no 3º volume de «Um amplo movimento…»

COMUNICADO DE IMPRENSA1 Após a demissão do Sr. Jonas Savimbi, Secretário-Geral da UPA e Ministro dos Negócios Estrangeiros do pretenso “grae” – governo revolucionário angolano no exílio –, o Movimento Popular de Libertação de Angola (MPLA) traz ao conhecimento da opinião pública internacional os últimos acontecimentos surgidos no seio do ­movimento nacionalista angolano: Vários membros do dito “grae”, entre os quais o Dr. JOSÉ LIAHUCA, Ministro da Saúde, Director do Serviço de Assistência aos Refugiados Angolanos (SARA) e Membro do Bureau Político da FNLA; Sr. Alexandre Taty, segundo Vice-Presidente da UPA e Ministro da defesa, demitiram-se das suas funções refugiando-se no Congo-Brazzaville, onde pediram a sua adesão ao MPLA. Segundo as suas declarações, justificaram as suas demissões acusando Holden Roberto de ser o responsável pela paralisação e pela desorganização da luta armada em Angola; de levar a cabo uma política tribalista, de proceder ao desvio de fundos e de armamento destinados ao desenvolvimento da luta do Povo Angolano; da detenção arbitrária de centenas de patriotas angolanos civis e militares encarcerados até agora nas prisões do Congo-Léopoldville, entre os quais os militantes do MPLA, JOB CARVALHO, ARSÉNIO MESQUITA, MUBEMBA AMBRÓSIO e JACINTO MANUEL. Prosseguindo a sua declaração, os ministros demissionários denunciaram o envolvi­mento do “GRAE” com as potências imperialistas, nomeadamente o seu cabecilha, o imperialismo americano. Estes factos vêm confirmar a justeza das denúncias feitas pelo MPLA em relação ao dito “GRAE”, instrumento ao serviço de interesses não Angolanos. O COMITÉ DIRECTOR DO MPLA Brazzaville, 26 de Julho de 1964 [carimbo do MPLA em Argel] ------------------------------ Movimento Popular de Libertação de Angola (MPLA) A declaração feita pelo Sr. Jonas Savimbi, quando se demitia das suas funções de Ministro dos Negócios Estrangeiros do GRAE, contém graves acusações contra o governo angolano no exílio. Considerando não só a gravidade dessas acusações mas também o facto de elas confirmarem o que o Movimento Popular de Libertação de Angola (MPLA) sempre afirmou, o Comité Director do MPLA considerou ser seu dever difundir este documento. * * * * * * * * * DECLARAÇÃO DO SENHOR JONAS SAVIMBI MINISTRO DOS NEGÓCIOS ESTRANGEIROS DO GRAE Senhor Presidente, Senhores Ministros, Distintos delegados, Minhas Senhoras, Meus Senhores, O Problema da Libertação de Angola entrou no seu quarto ano sem que, até hoje, tenha sido aberto um caminho seguro para os Patriotas Angolanos, tanto do interior como do exterior. Esta situação que já durou demais não se deve eternizar. Examinando o caminho percorrido desde 1960, momento em que a República do Congo LÉOPOLDVILLE acedeu à independência, até à hora presente, constatamos que a divisão no seio do Movimento nacionalista tornou impossível qualquer progresso no sentido da libertação. Tendo falhado todas as tentativas de reagrupar os diferentes e múltiplos partidos políticos numa única frente, a Organização da Unidade Africana achou por bem seguir o exemplo do CONGO-LÉOPOLDVILLE que consistiu em reconhecer o GRAE. Acreditámos então que esta decisão iria acelerar a Unidade dos patriotas angolanos e apressar assim a hora da libertação nacional. Os irmãos Africanos, hoje libertados do jugo colonial, sabem muito bem quão difícil é unificar as forças nacionalistas. Contudo não ignoram que a unidade das forças vivas no combate é a condição indispensável para a vitória. Senhor Presidente, Distintos delegados, a experiência de quatro anos prova-nos que isto se mantém válido para Angola. As forças divididas impedem a mobilização das massas angolanas. Uma luta de libertação sem a participação das massas está condenada ao fracasso a mais curto ou longo prazo. Só as massas populares constituem um apoio duradouro para uma luta de libertação contra um inimigo como Portugal que beneficia do apoio material e moral das potências colonialistas e imperialistas. Rendemos homenagem aos países Africanos que reconheceram o GRAE, na intenção de dotar a luta de libertação de Angola de um instrumento político capaz de organizar a luta armada e susceptível de lhe trazer o apoio diplomático indispensável à mobilização da opinião internacional. Gostaria aqui de chamar a melhor atenção de todos para o facto de que, não tendo sido atingidos estes objectivos, é dever de todos os Angolanos em particular, sem excepção, e de todos os Africanos em geral, estudar de novo o problema e propor soluções. Estimo que numa luta de libertação como a nossa não existe nenhuma equação resolvida de antemão. Nunca na história dos movimentos de libertação de África houve uma tão marcante solidariedade dos países africanos como em relação a Angola. Nunca nacionalistas tiveram de enfrentar um inimigo como Portugal, país no entanto cronicamente subdesenvolvido. Contudo, nunca uma confusão tão grande se apoderou das fileiras nacionalistas como no caso de Angola. Senhor Presidente, A revolução não é um processo mecânico. Seja qual for a ajuda material que possa ser concedida a um movimento de libertação, este está votado ao fracasso, como o disse há pouco, se não houver mobilização das massas populares e, portanto, a união das forças combatentes. Qualquer pretexto para justificar a estagnação da luta será vão. Pois ajuda-te a ti mesmo e o céu te ajudará. Certos países africanos recusam-se a estudar de novo o problema angolano tendo em consideração as realidades angolanas. Essas realidades são: – Ausência de apoio às forças de guerrilha no interior de Angola; – Não realização da Unidade dos movimentos nacionalistas; – Mudanças ocorridas nos países limítrofes de Angola; – Falta de programa saído de um congresso reunindo todas as forças vivas angolanas; – Perigo do neocolonialismo ameaçando cada vez mais a parte austral da África; – Ineficácia do Governo Angolano no exílio. Tendo em conta o acima exposto; Tendo em conta sobretudo o facto de o GRAE, em vez de intensificar a acção militar e o agrupamento das massas populares, únicos meios que podem acelerar a libertação de Angola, se limita a declarações sem futuro. Eu, Jonas SAVIMBI, Ministro dos Negócios Estrangeiros do GRAE, para estar de acordo com a minha consciência, decido, perante a mais alta instância africana, demitir- -me das minhas funções que não vão ao encontro do interesse do povo angolano e dos objectivos dos países irmãos que consentiram sacrifícios para ajudar a causa angolana. Senhor Presidente, Distintos delegados, antes de me retirar, chamo a vossa melhor atenção para o facto de me consagrar de corpo e alma à libertação do meu país e peço-vos que reconsiderem com toda a atenção necessária o problema de Angola, insistindo na necessidade de se convocar imediatamente uma Conferência de todas as forças vivas angolanas. Senhor Presidente, estou à disposição dos distintos delegados que me queiram fazer perguntas. Cairo, 16 de Julho de 1964 Jonas SAVIMBI ------------------------------ COMUNICADO DE IMPRENSA JOSÉ JOÃO LIAHUCA, médico Director do Serviço de Assistência aos Refugiados Angolanos, SARA, na República do Congo‑Léopoldville, anuncia ao Povo angolano e à opinião internacional, a sua voluntária demissão do cargo que ocupava na citada Organização (até 24 de Julho de 1964) como protesto contra a desorganização e estagnação da luta pela libertação de Angola sob a responsabilidade de Holden Roberto. Considera que só a unidade verdadeira e sincera dos partidos políticos angolanos pode organizar uma luta capaz de arrancar o País do jugo colonial português. Denuncia as manobras tribalistas de Holden Roberto que tudo faz para se rodear de elementos de sua família no seio do Governo Revolucionário no Exílio (GRAE), ao mesmo tempo que manda encerrar centenas de Angolanos, militares ou civis de outras etnias, nas prisões congolesas de Ndolo, Makala, Lusumu, Campo militar Hardy de Thysville, como medidas tendentes a dividir o Povo, a retardar a Revolução e prolongar o sofrimento e os massacres do Povo angolano. Feito em Brazzaville aos 25 de Julho de 1964 J. J. LIAHUCA Nota da Delegação Permanente do MPLA na Argélia: 1 – (SARA) Serviço de Assistência aos Refugiados Angolanos da FNLA. 2 – O Dr. LIAHUCA era o único médico angolano que lá trabalhava. ------------------------------ Movimento Popular de Libertação de Angola (MPLA) O Movimento Popular de Libertação de Angola (MPLA) considera ser seu dever difundir a carta do Sr. Fidelino Loy de Figueiredo, militante Representante do “GRAE” na Áustria-Viena, dirigida à Direcção da União das Populações de Angola “UPA” a 28 de Julho de 1964. * * * * * * * * * À DIRECÇÃO DA UNIÃO DAS POPULAÇÕES DE ANGOLA “UPA” CAIXA POSTAL 1205 LÉOPOLDVILLE Compatriotas, A demissão do Ministro dos Negócios Estrangeiros do “GRAE”, Jonas Malheiro Savimbi, faz luz sobre muitos factos que, bem analisados, põem em relevo a situação desastrosa na qual se encontra a Revolução Angolana. Uma verdade vergonhosa para todos os nacionalistas sinceros se apresenta. Depois de mais de três anos de luta armada, e apesar da ajuda recebida de países africanos independentes, a luta limita-se hoje a pequenos confrontos nas fronteiras; houve portanto um retrocesso. Assim os factos revelam-se claramente. Os portugueses, uma vez que a tarefa em Angola “está quase terminada”, transferem os contingentes para a Guiné dita Portuguesa com o objectivo de combater contra os nacionalistas desta colónia. Outros factos muito graves são flagrantes na conduta dos dirigentes da FNLA (UPA-PDA). O assassinato de milhares de compatriotas nossos, só por não pertencerem a uma determinada tribo, é um crime. Também há casos de desvios de somas importantes concedidas ao Povo Angolano por países africanos. Os dirigentes de Léopoldville esbanjam e esbanjam somas enormes; o Presidente do Partido e Chefe do “GRAE” permite-se o luxo de possuir uma viatura de grande luxo; cada um dos ministros tem um automóvel à disposição enquanto os refugiados morrem de fome; a existência, em bancos estrangeiros, de elevadas somas em nome de dirigentes é um roubo ao Povo. Todos estes factos, citados no encontro do Cairo, não foram refutados já que a verdade revela-se claramente; a luta retrocede. Enquanto membro do Partido e enquanto nacionalista consciente, não posso permanecer em silêncio a partir do momento que se trata de uma traição evidente ao Povo. Muitos e muitos já tombaram para que Angola fosse libertada e a atitude dos dirigentes é um insulto ao Povo e uma traição à memória daqueles que preferem morrer do que aceitar o colonialismo. Os dirigentes devem estar ao Serviço das massas angolanas e não estas ao Serviço dos dirigentes. Hoje percebemos que a razão está com os que acusam os dirigentes da FNLA de se comportarem de forma irresponsável e de terem uma linha política contrária aos verdadeiros interesses do Povo Angolano. Estivemos sempre dispostos a dar o nosso contributo à Revolução através do Partido que tínhamos considerado estar em condições de servir o Povo, mas verificamos que nos enganámos quando demos a nossa confiança aos nossos dirigentes. Savimbi era o segundo homem tanto no Partido como no Governo. Estas acusações não vêm de um simples estudante, na Europa, mal informado; vêm de um responsável da Revolução. Declaro que me oponho totalmente à conduta dos dirigentes e condeno as suas acções. Tendo em conta que as estruturas actuais, tanto do Partido como da Frente, não permitem aos militantes uma acção a fim de intervirem para substituir todos os indivíduos que se encontram à cabeça do Partido e da Frente, tomei a decisão de me retirar do Partido e, a partir de hoje, considero-me desligado da União das Populações de Angola – UPA e de todos os seus organismos da juventude e estudantis. Tenho a precisar que considero terminadas todas as diligências no sentido de fazer funcionar, na Áustria, um serviço de informação do GRAE. Que isto fique bem claro: não me oponho à existência do GRAE enquanto organismo dirigente da Revolução, mas exijo a adopção de uma política que represente os interesses do Povo Angolano. Quando isto acontecer, estarei disposto a dar o meu contributo. ASSINADO Fidelino Loy de Figueiredo Representante do GRAE em Viena – Áustria ------------------------------ PARTIDO DEMOCRÁTICO DE ANGOLA PDA Léopoldville, 10 de Março de 1964 Caixa Postal nº 8085 LÉOPOLDVILLE N/Ref.DIR/1201/64 Senhor Agostinho NETO V/Ref.238/43/64 Presidente do Movimento Popular de Libertação de Angola (MPLA) C.P. 2353 BRAZZAVILLE Senhor e Caro Compatriota, Temos a honra de acusar a boa recepção da sua estimada carta nº 238/43/64 de 8 do corrente, que agradecemos. Através desta carta, o Senhor expressa-nos a sua fé na Unidade das organizações nacionalistas angolanas, cuja necessidade – como o Senhor reconhece – se torna cada vez mais urgente em cada patriota angolano. Notamos com satisfação que o MPLA, tal como nós, sabe onde estão as dificuldades para a nossa Unidade de acção. Com efeito, existem certos factores inibidores que retardam muito o entendimento tão indispensável, entre os filhos de um mesmo país, todos ardendo no desejo de libertar o seu país e que, infelizmente, sofrem cruelmente com a falta de unidade de acção, apesar da vontade de união que sempre se manifestou em muitos irmãos Angolanos, preocupados com uma coisa: abreviar o sofrimento do seu povo mártir. Mas reconhecendo esses factores que paralisam a unidade angolana e que contam em muito para o sofrimento do nosso povo rasgado pela desunião dos seus líderes, temos no entanto de reconhecer um outro mal, que não é dos menores e que abriu o grande fosso que separa os Angolanos de boa vontade e em quem o desejo de união e de colaboração continua a ser tão forte como sempre. Este mal é a atitude de repulsa e de desdém de certos Angolanos em relação a outros Angolanos, devido aos seus preconceitos que os caracterizam e que tornam difícil, se não impossível, qualquer diálogo, e ainda pior: um diálogo sincero, despido de qualquer calculismo. Posto isto, estamos inteiramente de acordo consigo em que, neste momento, precisamos de esquecer todas as querelas do passado com vista a encontrar um terreno de entendimento. Acrescentaremos, quanto a nós e tendo em conta o que expusemos acima, que devemos trabalhar sinceramente para reformar a concepção falsa e errónea que nos fizemos uns dos outros, para construir sobre bases sólidas e chegar a combater eficazmente todos os factores nefastos à nossa Causa, esta nobre Causa de todos os Angolanos, e não de uma fracção ou de um único homem, como sempre o repetimos nas nossas declarações. Acreditando, quanto a nós, que o diálogo é o melhor remédio para os nossos problemas, tanto mais que o desfecho da nossa luta reside num diálogo com os Portugueses, é com prazer que aceitamos receber um dos vossos delegados para uma troca de pontos de vista, de preferência para nós aqui em Léopoldville, na terça-feira 17 de Março às 16h, a não ser que haja imprevistos, na nossa representação sita no nº 2, Rua nº 7, Bairro Foncobel, Comuna de Kalamu. Entretanto, queira aceitar, Senhor e Caro Compatriota, os protestos dos nossos sentimentos nacionalistas e sinceros. Pelo Comité Director, Emmanuel KOUNZIKA Vice-Presidente.

Colectânea de documentos sobre o GRAE: «Crise au sein du 'grae'»: Comunicado de Imprensa do MPLA sobre demissão de Savimbi; Declaração de Savimbi; Comunicado de imprensa de J. J. Liahuca; Transcrição da carta de Fidelino Loy de Figueiredo pelo MPLA; Carta de Emmanuel Kounzika a Agostinho Neto

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