Carta de Agostinho Neto a Ahmadou Ahidjo

Cota
0056.000.036
Tipologia
Correspondência
Impressão
Dactilografado (2ª via)
Suporte
Papel comum
Remetente
Agostinho Neto - Presidente do MPLA
Destinatário
Ahmadou Ahidjo - Presidente dos Camarões
Data
Idioma
Conservação
Bom
Imagens
2
Observações

Foi publicado no 3º volume de «Um amplo movimento…»

Acesso
Público

 Brazzaville, 30 de Novembro de 1963 SUA EXCELÊNCIA AHMADOU AHIDJO PRESIDENTE DA REPÚBLICA DOS CAMARÕES YAOUNDÉ Excelência, Temos a honra de levar à mais alta consideração de Vossa Excelência um facto bastante doloroso, que prejudica o desenvolvimento e o reforço da luta do Povo angolano pela sua libertação. Depois de ter ordenado o encerramento da Representação do MPLA sob o pretexto de que “o MPLA não pertence aos partidos que formam o ‘governo angolano no exílio’”, as autoridades da República do Congo-Léopoldville procederam a uma busca numa residência dos médicos do CVAAR – organismo de assistência aos refugiados ­angolanos – onde estavam guardados alguns móveis da Representação encerrada. Os agentes encarregues da busca manifestaram o desejo de deter o Presidente e alguns dirigentes do nosso Movimento, sem adiantar a mínima justificação. Como estes estavam ausentes, procederam à detenção do Presidente da JMPLA – DANIEL CHIPENDA – e de um responsável militar do MPLA – António CONDESSE, como reféns, segundo julgamos saber. Esses actos arbitrários seguem-se a uma série de dificuldades sofridas pelo nosso Movimento e suportadas pelos nossos militantes. O MPLA, desde a sua fundação, determinou como uma das suas tarefas fundamentais a unificação das forças nacionalistas angolanas em luta contra a dominação colonialista, o melhor garante da vitória e a melhor contribuição ao objectivo principal de realizar a Unidade Africana. Forçado a deslocar uma parte importante da sua direcção para o exterior do País, nomeadamente para os Países vizinhos irmãos, o MPLA sempre teve a preocupação de respeitar solenemente os interesses e as leis dos Países que lhe ofereceram hospitalidade e nunca, sob nenhum pretexto, o MPLA se imiscuiu nos seus assuntos internos. O MPLA pode aceitar que, no uso da sua soberania e no interesse da sua política, o Governo de um País irmão lhe dificulte ou proíba as suas actividades patrióticas. Sublinha, no entanto, que tais medidas são contrárias ao espírito e à letra da Carta de Addis Abeba, pela qual os Países Africanos se comprometeram em aumentar a sua ajuda aos combatentes da liberdade e expressaram o desejo de unificar os diferentes movimentos nacionalistas em cada País, de forma a acelerar a libertação de toda a África. Mas o MPLA não pode entender e não pode aceitar que os seus militantes sejam arbitrariamente detidos e as suas actividades contra o colonialismo português dificultadas. Tais medidas constituem, aos olhos do Povo angolano e aos olhos dos militantes do MPLA, uma grave intromissão nos assuntos angolanos que enfraquece a confiança do nosso Povo na solidariedade africana e enfraquece as próprias forças angolanas, comprometendo seriamente o resultado da nossa luta. Tanto mais que tais medidas, que duram desde a instalação do MPLA no Congo, visam impor ao nosso Povo uma facção do nacionalismo angolano que está longe de ser a mais representativa. Por isso fazemos a Vossa Excelência um veemente apelo para que, em nome da Unidade e da solidariedade africanas, em nome da justiça e do direito dos Povos, Vossa Excelência intervenha junto do Governo da República do Congo-Léopoldville para que os nossos irmãos sejam libertados e para que seja garantida a integridade moral e física dos nossos militantes, seriamente ameaçada, e para que as nossas actividades patrióticas possam continuar naquele País. Esses factos, de uma extrema gravidade para o futuro do nosso País, são a ­consequência de uma análise insuficiente do problema angolano em toda a sua complexidade, que levou ao reconhecimento por alguns Países irmãos de África, de um “governo no exílio” para Angola, o qual não representa a maioria do nacionalismo angolano. Assim solicitamos a Vossa Excelência que sejam tomadas desde já medidas para que o problema angolano seja reexaminado no seu verdadeiro contexto e a partir de bases que possam unir e não dividir as forças combatentes, de acordo com as sábias decisões tomadas a 18 de Maio de 1963 em Addis Abeba pelos Chefes de Estado de África. Enquanto o nacionalismo angolano estiver dividido, qualquer ajuda trazida no quadro de Addis Abeba será ineficaz. Estamos certos que este apelo premente, que traduz as nossas preocupações legítimas sobre o futuro da nossa Pátria, encontrará o melhor eco junto de Vossa Excelência. Queira aceitar, Excelência, os protestos da nossa elevada consideração. Em nome do Comité Director Agostinho NETO Presidente

Carta de Agostinho Neto a Ahmadou Ahidjo, Presidente da República dos Camarões (Brazzaville)

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