Carta de Ernesto Lara Filho a Lúcio Lara

Cota
0014.000.002
Tipologia
Correspondência
Impressão
Dactilografado
Suporte
Papel comum
Remetente
Ernesto Lara Filho
Destinatário
Lúcio Lara
Locais
Data
Idioma
Conservação
Mau
Imagens
2
Acesso
Público

Ernesto Lara Filho
Pensão Jardim
Avenida Navarro 65
COIMBRA

Coimbra, aos 1 de Julho de 1960

    MEU CARO LÚCIO

    A carta de hoje é importante. Pelo menos eu desejava que logo que a recebesses acusasse a recepção da mêsma. Ora vamos lá ao que interessa. Tive exame ontem, de Literatura, espalhei-me e tenho estado adoentado. Exames e intestinos tem-me liquidado a já pouca alegria que trago comigo. Ontem, quando estava na esplanada do Montanha fui surpreendido pelo Viriato e pela Zita que passavam para o Norte - Arrifana - e tinham desambarcado a 29. Com a Zita vinha o teu sobrinhito e a Helena da Figueira. Que iam fazer ao Norte? Enterrar a tua tia Marta que faleceu nessa madrugada. Não se sabe o que foi. Sabe-se apenas que tinha pedido uma ligação para Lisboa, pretendia falar com a tia Clém e a determinada altura começou a sentir-se mal e morreu poucas horas depois. Não sei mais nada e isto é suficiente para te incomodar. Eu não pude ir ao enterro em virtude de ter exame. Deves calcular como ficou a tua família com esta notícia logo de entrada. Entretanto a tia Clém e Quéca tinham partido para a Arrifana de combóio.
    Quanto aos nossos assuntos e depois destas coisas familiares. Por correios anteriores seguiram respectivamente: Relatórios do Pancada & Morais "Aplicação de Capitais" de 1958 e 1959. De 1960 ainda não há, evidentemente. Têm seguido sempre jornais. ABC, CONGO, e outros que vou arranjando. Por carta seguiram recortes do Congo nos quais deves ter interesse. Nesta mesma carta seguem recortes que te devem interessar. Tomo a liberdade de te enviar as minhas coisas - que peço devolvas e comentes. Fixe? Tens lido o "Portugal Livre" e o "Portugal Democrático" que se publicam em São Paulo? Já há uma emissora portuguesa em Caracas a emitir contra o Antoninho. Segue um artigo do Orlando sobre arte quiôca. Peço-te devolução das coisas minhas e do Orlando para o meu arquivo. Lê com atenção o recórte sobre "Informação Económica" do Jornal de Angola. Acusa recepção de tudo para minha tranquilidade. Escreve-me sempre pois tenho todo o interesse em estar em comunicação contigo. Recebi a vossa declaração dirigida ao Governo Português que está brilhante. Não a mostrei a ninguém. Ela no entanto foi recebida qui pelos jornais. Alguns fizeram referências, mas deves calcular o que escreveram. Vou ver se arranjo o D.Notícias" que em toda a sua hedionda estupidez comenta o caso "à la Situação".
    Tenho meditado muito na ida a Paris. E vejo que a solução só pode ser essa que vocês indicam na Declaração. Mas êstes tipos estão a enviar tropas a tôda a força. Seguiu o Uige carregado, deixou uma companhia em Cabinda e trouxe outra que vai para Malange. Entretanto foram requisitadas todas as carreiras aéreas para Angola - quatro semanais! - para transporte de tropas, segundo se deduz. Isto estará a querer rebentar?
    Escreve-me e conta-me coisas de ti. E da Ruth e do Paulinho. Eu tenho de estudar pois penso que os tipos não vão ter o arrôjo de me chumbarem pois fiz prova escrita para dez. Mas são capazes de tudo. A malta de Angola regista a maior percentagem de reprovações da sua história, nas universidades da Metrópole…
    Dei os teus cumprimentos ao Tonecas que te quiz escrever, mas eu disse que não o fizésse. É melhor assim. Têm seguido jornais onde acusam a recepção…

NOTA: "Seguiu o relatório do Banco de Angola - 1959.

…de trópas. Em Angola. Mais nada por hoje e cai a carta que pedes. Grande e com as informações necessárias. Escreve sempre e pede tudo o que entenderes. Vou a Lisboa breve e de lá mandarei o Anuário estatístico.
    Abraços à Ruth. A Alda recomenda-se. Ao Paulinho um beijo.
    Um "quáta-péka" do
    Ernesto

Carta de Ernesto Lara Filho (Coimbra) a Lúcio Lara

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