Carta de Lúcio Lara ao Comando Operacional do MPLA

Cota
0060.000.026
Tipologia
Correspondência
Impressão
Dactilografado
Suporte
Papel comum
Remetente
Lúcio Lara
Destinatário
Comando Operacional do MPLA
Data
Idioma
Conservação
Bom
Imagens
2
Observações

Foi publicado no 3º volume de «Um amplo movimento…»

Acesso
Público


MPLA
COMANDO OPERACIONAL Dolisie, 20 de Março de 1964
Dolisie
AO COMANDO OPERACIONAL DO MPLA
BRAZZAVILLE
Caros Camaradas
Aproveito o regresso do Jeepão [sic] para vos pôr ao corrente dos últimos acontecimentos aqui:
1 – Caso EDUARDO FERNANDES – Quando ele chegou de Brazza no Jeepão, eu encontrava‑me nas Pacaças, tendo aqui chegado só na noite do dia 17. Como o Jeep devia partir a 18 até Kimongo, mandei recado ao E. Fernandes para vir ter comigo para lhe comunicar a vossa decisão de o transferir para o Kimongo até conclusão do seu processo. Ele não apareceu nesse dia, que aliás passou ao que me informaram, fora de casa. O carro partiu pois sem ele, visto que havia uma missão de transporte de barracas para as Pacaças que estava combinada, não podendo ser adiada, pois havia camaradas que a certas horas deveriam vir ao desvio, para fazerem o transporte.
O indivíduo só cá apareceu hoje e às minhas observações sobre a vadiagem a que voltara a entregar‑se, respondeu desabrida e insolentemente. Já era minha ideia fazê‑lo aguardar na prisão aqui do CIR até que viesse o carro, antes até que o carro voltasse a Kimongo. Assim disse‑lhe que devia aguardar aqui na prisão decisões futuras a seu respeito. Sempre insolente, e dizendo que o queríamos matar, não teve outro remédio senão entrar na prisão.
Vamos pois começar o inquérito a seu respeito, de acordo com a vossa nota de 15 de Março.
2 – O Camarada INHALA também se encontra preso, embora preste serviço na Cozinha. Aguardo a vossa chegada para se ver o seu caso, que desconheço.
3 – SITUAÇÃO NAS PACAÇAS – Conforme vos foi comunicado, tomaram-se medidas de precaução contra um possível bombardeamento e um ataque de surpresa. Há 3 grupos nas montanhas em redor em alerta permanente e estabeleceu‑se um ponto de recuo, para onde foi o material, que está protegido por uma tenda.
Falei com os camaradas sobre a necessidade de continuar as operações a despeito da situação de alerta, e nomeadamente de apressar a questão do posto avançado. O Comando queixa‑se da falta de efectivo para as inúmeras tarefas que tem de efectuar. Concluímos no entanto que era necessário avançar com o efectivo actual, e mesmo nas condições de alerta actuais, que deviam ser uma razão de mais para não manter os grupos juntos no antigo acampamento.
Há algumas necessidades urgentes a satisfazer, tais como o problema de peúgas (que é um problema maior) e o do abastecimento do posto, onde concluímos ser necessário fazer algumas missões unicamente para deixar lá o ravitaillement dos grupos futuros.
Neste preciso momento em que vos estou a escrever, chegou‑me às mãos o relatório do camarada Spencer sobre o que se tratou nas Pacassas, o que me dispensa de maiores pormenores. Afinal acaba de chegar também aqui o Cam. Capache dizendo que já não vai hoje. Registarei em todo o caso nesta carta as últimas informações para que tomem conhecimento delas quando aqui chegarem.
Da última vez que passei nas Pacassas, ficou combinado que voltaria lá no dia 24 ou 25 para passar lá uns dias. Por outro lado teremos uma missão no Ditadi no dia 30 e outra em Kifuma 2 e Batamanga no dia 2 de Abril. Possivelmente só depois desta data irei a Banga, pois agora nos próximos dias é muito provável que não encontre lá ninguém, visto que os grupos devem ter saído.
ZONA A:
No próprio dia em que parti para as Pacassas esteve cá o Cam. Minga que veio acompanhar três camaradas que levantaram problemas na sua Zona: trata‑se de dois dos camaradas que fizeram o estágio acelerado (Zacarias Chimpolo e Pedro Vicente Gomes) e do Cam. Daniel Mendes. O Zacarias Chimpolo levanta um problema de ter a sua mulher grávida em Ganda Binda, creio que ao cuidado da OMA e que teria manifestado desejo de a ver antes de ir para a Zona A. Garantiu ao respec­tivo Comando que regressaria logo que tivesse resolvido os problemas familiares, pelo que eles o deixaram vir, porque segundo dizem ele levantaria muitos problemas que eles não podem enfrentar em vésperas de partir para missão. O mesmo problema (esposa) se passa com o Pedro Vicente, mas a esposa está no Congo Léo, para os lados de Tshela e ele quer fazê‑la atravessar. Como aconteceu estar cá nesse dia o Makaka de Batam. em busca de reforço, devido a uma deterioração da situação, o Pedro Vicente partiu com ele, mais três camaradas que ainda se encontravam aqui (Mateus Pongi, Ngungu Célestin e António Gomes) que tinham feito também o curso acelerado. A situação de Batamanga deverá ser discutida em particular em reunião do CO. Apreciar-se-á também o caso dos dois camaradas que acabo de referir e que são devidos a erros difíceis de determinar.
O caso Daniel Mendes é também esquisito, no mínimo que se lhe pode chamar. Pretexta questões de feitiçaria que o impedem de estar em Banga, pedindo para voltar para a Zona B. Sem ter em mente qualquer solução definitiva do seu caso, pois prefiro aguardar a vossa chegada, pedi ao Comando da Zona B que se pronunciasse sobre uma eventual reintegração do dito camarada e estou aguardando uma res­posta. Entretanto o camarada Cadete enviou‑o ontem de novo à Zona A, em missão de ligação.
Batamanga – Como disse apareceram de novo graves dificuldades com os chefes que se mantêm upistas e que dificultam o trabalho dos camaradas. Estes não desanimam e como uma das razões das dificuldades é o veneno que a UPA meteu nos chefes sobre a ineficácia e a ligação com o inimigo do MPLA, sugeri aos camaradas que convidassem os chefes a visitar o nosso Presidente e de passagem, e com as devidas ­precauções mostrar‑lhes‑íamos algo do nosso potencial. Creio que o chefe principal se mostra despeitado pelo facto de o cam. Neto não ter falado com ele quando lá esteve.
Todos estes pontos teremos ocasião de os abordar, bem como as necessidades mais urgentes (impermeáveis, novos mapas de Cabinda, guias de marcha, questão do Kimongo, etc.)
V ou M
[assinatura de L. Lara]
[Nota manuscrita por L. Lara: Falta referir o Mvouti e as últimas da ponte do Lombe bem como a ponte perto de Ilupanga.]

Carta de Lúcio Lara (Dolisie) ao Comando Operacional do MPLA

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