Carta de Paulo Jorge a Luís de Almeida

Cota
0087.000.038
Tipologia
Correspondência
Impressão
Dactilografado
Suporte
Papel Comum
Remetente
Paulo Jorge
Destinatário
Luís de Almeida
Locais
Data
Idioma
Conservação
Bom
Imagens
2
Paulo T. Jorge
31, Shari Hasan Aasim
Apt. 8 - ZAMALEK
CAIRO . R.A.U.

Cairo, 26 de Outubro de 1966

M. Luís de Almeida
38/40, Rue Didouche Mourad
Porte 44 D - 2ème Etg.
ALGER

Estimado Camarada,
Após um breve interregno no prosseguimento da nossa troca de correspondência, eis-me de novo a endereçar-te linhas.

Por virtude de um excesso de trabalho que actualmente pesa sobre mim não me foi possível responder-te com a devida prontidão à tua carta de 4 de Outubro e que me revelava aliás uma disposição diferente de ver as coisas anteriormente ocorridas o que sinceramente me aprouve. Lamento contudo a série de implicações que têm ocorrido em redor da tua pessoa pois em nada beneficia a tua actividade e consequentemente a nossa Causa. Refiro-me em particular a situação que me relatas sobre posições assumidas pelo camarada Helder Neto e que, em função do que me dás a conhecer, é bastante desagradável.

Como te dei a conhecer, a partir do dia 10 do corrente realizou-se aqui no Cairo mais uma reunião da Comissão dos Três para a hipotética reconciliação entre nós e o tal “governo”. Durante o período que duraram as discussões, estava ocupadíssimo, como deves calcular, para tratar de todos os pormenores que se impunham à elaboração da nossa documentação e constituição dos respectivos dossiers. A 15 do corrente assinou-se enfim o chamado acordo entre nós e o outro lado. Todavia a imprensa interpretou mal o acordo quando ela afirma que se havia chegado a “um acordo de cooperação”. Na realidade nós apresentámos cinco propostas como “bases de partida para se chegar a uma unidade de acção”. Pelo correio enviei-te não só o nosso Memorandum como a publicação das nossas propostas e as propostas adoptadas pela Comissão que constam no acordo assinado o qual, devo já dizer-te, foi por nós admitido mais como táctica do que como compromisso ou desejo de uma tal unidade. Chamo a tua atenção para o 4º ponto do acordo que diz textualmente: «Suivant immédiatement la conclusion des travaux de la Comission militaire d’enquête de l’OUA, un Comité commun du MPLA et du GRAE sera constitué sous les auspices de l’OUA afin d’étudier les modalités d’une coopération entre les deux mouvements, tant dans le domaine militaire que politique». E mesmo esta fase só será por nós encarada quando se verificar o cumprimento das cláusulas anteriores. Por outro lado, estávamos convencidos que a assinatura deste acordo seria denunciado pelo H.R. o que na realidade aconteceu, de acordo com um despacho da A.F.P. que igualmente está contido nos documentos que te enviei.

O facto de ter de me ocupar imediatamente do Seminário que aqui está decorrendo sobre a «Revolução Nacional e Social em África» e para a qual o Movimento foi convidado e no qual me encontro como Delegado, pouco tempo livre tenho tido para me ocupar da totalidade de problemas que se me apresentam.

Sobre os bilhetes para ti e tua família devo dizer-te que já discuti a sua concessão faltando apenas a aprovação do nosso amigo Fayek. Contudo creio que eles serão seguramente concedidos. Ainda há dias voltei a ocupar-me deste assunto e logo que acabe o seminário (a 29 do corrente) o problema será solucionado da melhor forma.

Tenho estado a estudar o problema do teu alojamento e já fui avançando alguns argumentos para obtenção de um aumento do teu futuro budget afim de te facilitar a tua vida e actividade no Cairo tendo em conta as tuas obrigações familiares.
Dentro de dias devo partir para Addis-Abeba na medida em que fui informado de que faço parte da nossa Delegação à OUA. Assim a questão da tua chegada ao Cairo, creio que só poderá ser encarada em fins de Novembro. Quero com isto dizer que seria da melhor conveniência que dispusesses todos os teus preparativos para que a tua chegada se registasse no fim de Novembro. Escrever-te-ei de novo sobre esta questão a fim de se ultimarem e se concretizarem as datas bem como os necessários preparativos ao vosso acolhimento.

Agradeço-te as tuas démarches sobre o meu «passapa» e peço-te que continues a interceder nesse caso. Contudo, acho estranho que se leve tanto tempo a emitir um tal documento uma vez «que o princípio estava já admitido».

Escrevi há tempos ao Comité Executivo Transitório da UGEAN, o qual tu presides, sobre o caso do camarada Fernando de Oliveira, da Secção de Poitiers. Ora, nem esse camarada recebeu qualquer resposta por parte do C.E.T. ao seu delicado problema, o que acho inconcebível e reprovável, nem tampouco eu recebi qualquer referência à carta por mim escrita solicitando a vossa intervenção para uma solução ou emissão de sugestões sobre o assunto daquele nosso camarada. Agradeço pois que, com os demais camaradas, te debruces sobre esta questão e me digas algo sobre ela.

Uma vez mais volto a pedir-te a direcção do Costa Andrade, pois gostaria de lhe escrever.

Recebi a tua carta enviada pelo camarada da SWAPO. Obrigado. Quanto à fotografia inserida no «El Moudjahid» ela apresenta apenas os dois delegados do tal «grae» e nada mais. A notícia ou a legenda inserida é portanto incorreta. Quem tu queres saber é o André Miranda. O outro que está ao lado é o dito representante deles no Cairo. Portanto, nessa fotografia não há ninguém do MPLA. A nossa Delegação era constituída pelos camaradas Azevedo, Chipenda, eu e o Barros. Ora tu conheces cada um de nós. Seria portanto interessante de fazeres ver aos nossos «frères» o erro cometido e de esclareceres essa gente sobre o tal acordo assinado aqui no Cairo de acordo com os elementos que te enviei, pelo correio.

Bom, estimado camarada, tenho de ir para mais uma sessão do seminário. Saudações a todos os camaradas, à tua mulher e filhos.

Aceita as minhas mais Revolucionárias e Fraternais Saudações.

Paulo T. Jorge
Fotocópia de uma Carta de Paulo Jorge a Luís de Almeida
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