Extracto de uma carta ao Departamento de Guerra do MPLA

 [Nota manuscrita por L. Lara: Instalação na fronteira de Cabinda] EXTRATO DE UMA CARTA Ao Departamento de Guerra [Sem data] Caríssimos Compatriotas Por intermédio desta viemos manifestar a nossa viagem, por ter corrido em ritmo de boa viagem e presentemente, nos encontramos na volta de Kimongo, local em destino, em missão, escolhido pelo Departamento de Guerra. Aqui em Dolisie assim como em Kimongo, encontrámos grandes números de Angolanos simpatizados no nosso Movimento, e dias mais não tardarão, fazerem-se de grandes membros efectivos; assim apontamos com grande orgulho a colaboração de dois Angolanos, Joaquim Dias Lopes (de alcunha Pôu-sango) e Francisco Lubota; o primeiro é natural de Luanda, emigrante, de 30 anos no Congo, 55 anos de idade, e a quem apontámos-lhe como nosso embaixador; e o segundo, refugiado, natural de Miconge-Cabinda, com a idade de 32 anos. Estamos certos que o número de simpatizantes aumentará dia a dia, e assim no espaço de pouco tempo, teremos um bom número de efectivos. Aqui, a história é a mesma como em certos lugares da fronteira de Angola; aqui aparece homens, traidores, ao serviço da UPA para conselhar [sic] o povo, a não aceitarem, a nossa propaganda, em palavras de que o nosso movimento é de brancos e está a favor dos portugueses, e que os medicamentos se encontram envenenados, e o mesmo produzirá o efeito daqui uns meses. Assim, tínhamos sido corridos do Ganda-Binda, aldeia, que fica 15 km de Kimongo, esse povo reconhecendo a nossa presença aqui, dia para dia, nos chegam, e pedem- -nos apoio. É certo que, o povo de Ganda-Binda, tinha recebido conselho, dum povo, situado perto do rio Luango. Estamos certos de que, em abertura dum dispensário, para tratar carinhosamente todos, o povo compreenderá muito depressa. Situação geográfica – Maiombe região montanhosa, e coberta de paus das florestas, tem grandes serras, vários rios e riachos; na sua situação é muitas vezes melhor que na fronteira de Massabi; quanto o plano. Apenas nota-se muito aqui e em geral em todo distrito angolano ao serviço dos portugueses, esses angolanos muitos deles têm armas para apanhar ou matar angolanos ao serviço da revolução. Estamos a 25 quilómetros do grupo Afonso Bissafi, e verificámos que é por aquelas bandas que se deve furar visto que, segundo informações acolhidas, nenhum angolano vive dentro do território, ao passo que os povos de Angola que fazem fronteira Kimongo ao Loango muitos deles vivem em Angola e são os colaboradores dos portugueses. Pensamos que o grupo de Kimongo, se conserve no mesmo lugar, para nos dar facilidade de tratar e politizar os angolanos que se encontram desde Kimongo ao rio Loango e, depois for notando-se e estudando-se a maneira possível desta fronteira. É à beira do rio Loango, que existem também povos refugiados com vestígios da UPA. Foi então que em 20 de Maio do corrente ano aí nesta aldeia angolanos mataram o tal sujeito Agostinho escapando a família que correu aos portugueses para pedir socorro. Foi neste mesmo dia que apareceu cá o camarada Carreira. Daí o boato correu e não sabiam se nas matas estavam soldados da UPA ou do MPLA. O boato correu que nas matas se encontravam 300 soldados. No dia seguinte a gendarmaria foi a Iola-Panga fazer démarches ao grupo Afonso-Dissafi se conhecia o caso. Procuraram saber do camarada Carreira quem era ele, o que trazia, o que vinha fazer, o que levava, de que cor era o carro, de que marca, e quantos companheiros trazia. Este boato desapareceu alguns dias depois, e no dia 29 de Maio, apareceu dois aviões portugueses no posto de Kimongo a sobrevoarem, sobretudo na casa onde nós morámos e uma mão, mostrar a casa. Soubemos de fonte limpa, que as autoridades portuguesas em missões pediram captura às autoridades administrativas de Kimongo a captura de quatro indivíduos refugiados, em Ganda-Binda, os quais se encontram já presos, e lá ou elas estamos certos que as autoridades Congolesas não devem fazer mal. Apoio das autoridades – Autoridade máxima em Kimongo é o Snr. Samba Adão; pessoa que nos parece honesta; quando pela má incompreensão de certas pessoas em relação ao nosso serviço, ele defende-nos como uma grande autoridade exemplar e progressista, este já tem o nosso Estatuto, e mais certos documentos, e está satisfeito com a nossa presença. Pedimos mais Estatutos, livros do MPLA digo de Angola, vitória ou morte (antigos) e novos Estatutos do CVAAR, e Boletim, jornais a unidade Angolana, comunicados em francês e português, mapa de Angola e Congo, papéis e envelopes para escrever. Desenvolvimento dos serviços sanitários – é um dos problemas que os colonialistas portugueses não souberam resolver quanto assistência do povo em qualquer parte como aqui vê-se homens, mulheres e crianças com variadíssimas deformações, provocadas por doenças não tratadas, e a não assistência na verdade continua implicar e levar a morte milhares de indivíduos. Só desde 5 de Maio a presente data, quero dizer há vinte e cinco dias já foram tratados 650 seis centos e cinquenta pessoas, entre consultas, injecções, curativos e outros tratamentos. É nessa medida que vamos fazendo compreender aos angolanos, aqui refugiados e emigrados, e será o fim de dar cabo as intrigas postas pelos nossos inimigos; hoje a missão está sendo cumprida de Kimongo às aldeias do rio Loango. Há aqui na verdade grande necessidade de se abrir um grande e bom dispensário. Nós estamos prontos a tratar a todos, e vê-se já que 50% de doentes 500 Congoleses. É o primeiro dispensário a abrir-se na fronteira Congo-Brazzaville com Angola; nós o povo em geral pede-nos a instalação permanente e a efectividade dos medicamentos. Caso muito encontrado: Doença do aparelho digestivo, paludismo, doenças infecto contagiosa, doenças do aparelho respiratório, sarnas, feridas, úlceras, doenças ósseas e articulares, doenças de senhoras, doenças dos olhos e da pele. Pedimos que as informações do quadro de saúde, sejam transferidos ao CVAAR para este melhor estudarem, e pedimos também, que seja colocado aqui mais um voluntário. Conclusão. É muito necessário a presença nas fronteiras os dispensários da CVAAR pois, em relação dos serviços feitos, nós estamos num pé de melhor posição que o grupo Afonso Bissafi, apesar que o ponto estratégico para nós será também lá. N.B. – Pedimos mais um camarada que saiba falar o fiote-quiambe. Pedimos a abertura de um bureau em Dolisie. Despesas: Durante um mês gasta-se para quatro indivíduos, de alimentação – 18.510 fr. Transportes – 7.800 fr. (totalidade = 26.310fr). Pedimos emprestado, algum dinheiro aos camaradas de Iolo-Pango, importância esta que tem servido para nossa alimentação, e passagens do camarada que segue viagem, portador deste documento. Em relação às despesas de passagens de ida e volta Kimongo à Maconge-Kimongo Dolisie-Kimongo Iolo-Pango, gasta-se muito dinheiro nos maximbombos visto que paga-se por quilómetro 5 francos e estamos certos que a soma de passagem aumenta se for possível. Desde que saiu o camarada Carreira aqui já andamos, em virtude de haver mais massas. Durante a estadia em Dolisie recebemos de vários compatriotas, e membros do MPLA ofertas de uns francos que somamos 2000fr. (dois mil francos). Esta oferta pessoal é que aproveitamos e soma-se nos vinte e cinco mil francos que recebemos no Departamento de Guerra para despesas geral. Junta uma lista dos medicamentos para ser atendida, e despachada quando o portador deste regressar. Até aqui não se conseguiu ainda casa, por haver dificuldades dos proprietários, e combinámos com um proprietário que tem uma casa boa mas por concluir. E sobre a mobília, falámos com um carpinteiro que pediu-nos 23.000fr., preço de duas mesas, seis cadeiras, um divã, uma prateleira, dois bancos, dois mochos. Ass. O Comandante [carimbo do EPLA] PEDIDOS DE MEDICAMENTOS Algodão----- 500 gramas--------------------------------------- 5 pacotes Adesivo rolos----------------------------------------------------- 10 rolos Gaze esterilizado------------------------------------------------- 30 metros Ghotaplast (pronto socorro)----------------------------------- 30 caixinhas Álcool desnaturado---------------------------------------------- 2 garrafas Criolina----------------------------------------------------------- 2 " Comprimidos sulfamidas--------------------------------------- 500 comprimidos " sulfaguanidina-------------------------------- 500 " " aspirina-------------------------------------- 500 " " quinino-------------------------------------- 500 " " multiplex------------------------------------ 3000 " " vitam. B12---------------------------------- 100 " Sulfato de magnésio--------------------------------------------- 3000 gramas Óleo de rícino---------------------------------------------------- 3000 " Alcopar------------------------------------------------------------ 20 pacotes Antepar------------------------------------------------------------ 20 frascos Colírio de argerol------------------------------------------------ 500 gramas Pomada oftálmica------------------------------------------------ 2 bisnagas Penicilina 4.000.000 UI---------------------------------------- 30 frascos Estreptomicina 1 gr.--------------------------------------------- 30 " Pomada penicilina---------------------------------------------- 100 gramas " sulfamidas-------------------------------------------- 100 " Borato de Sódio-------------------------------------------------- 100 " Água oxigenada-------------------------------------------------- 2 volumes Pincéis diversos- (digo pinças)--------------------------------- 3 pinças Seringas hipodérmicas nº10 e 5 cc.-------------------------- 4 seringas Termómetros clínicos------------------------------------------ 2 termómetros Vaselina pomada------------------------------------------------ 500 gramas Salicilato de metilo--------------------------------------------- 1000 " Água destilada 10 cc.------------------------------------------- 50 ampolas Papel para embrulho de medicamentos---------------------- Papel e envelopes para escrever-------------------------------- Livro para inscrição de doentes-------------------------------- 1 livro Bisturi------------------------------------------------------------- 1 bisturi Roupas para refugiados--------Sulfamidas em pó------------ 250 gramas Cálcio injectável------------------------------------------------- 20 ampolas Vit. C injectável------------------------------------------------- 20 " Vit. B1 "---------------------------------------------------- 20 " Anti-hemorroidal comprimidos ou supositórios ----------- Coramina--------------------------------------------------------- 10 ampolas Óleo canforado-------------------------------------------------- 10 " Coaguleno-------------------------------------------------------- 10 " Vicks -------------------------------------------------------------- 10 caixinhas e mais medicamento necessário.