Carta aberta do Rev. Domingos da Silva sobre calúnias

Cota
0051.000.046
Tipologia
Carta aberta
Impressão
Policopiado
Suporte
Papel comum
Autor
Domingos Francisco da Silva
local doc
Léopoldville (Rep. Congo)
Data
Idioma
Conservação
Bom
Imagens
3
Observações

Foi publicado no 3º volume de «Um amplo movimento…»

Acesso
Público


CARTA ABERTA AO POVO ANGOLANO
DO REV. DOMINGOS FRANCISCO DA SILVA
A CALÚNIA DESMASCARADA
Não há mentira mais nojenta e mais digna de desprezo do que essa que acusa, [o] MPLA como partido de brancos ou de mulatos!
O mundo inteiro e todos os homens de são moral e alto critério, dentro e fora da Nação Angolana o sabem, através dos nossos programas, dossiers profusamente espalhados e conferências, assim como numerosos visitantes do nosso Bureau que [o] MPLA é um partido genuinamente angolano, formado só por angolanos e lutam conscientemente para a libertação da sua Pátria escravizada há 500 anos.
Não se encontra também nos nossos Departamentos de Assuntos Sociais promiscuidade de nenhum elemento branco como aliás [se] verifica nos outros partidos. Todo visitante honesto sabe que esta é a expressão da verdade.
De resto são bem conhecidos nos meios nacionais e internacionais os homens que patrocinam este partido, (MPLA) que está empenhado numa luta para a libertação total e incondicional de Angola. A sua linha política é clara que dispensa qualquer comentário. O MPLA não engaja nem compromete os recursos económicos de Angola perante qualquer Nação do bloco Oriental ou Ocidental. A sua linha política é de não-alinhamento. Esta proposição é clara como o sol de meio-dia. O MPLA não quer autonomia nem negociações a retalhos. O MPLA quer a independência total e incondicional.
Seria desnecessário citar os nomes dos homens que encabeçam este Movimento, pois são de todos bem conhecidos. Os angolanos que visitaram o nosso Bureau conhecem-nos sendo muitos deles já bastante familiarizados com eles desde Angola.
O PROPÓSITO DO CALUNIADOR
Não será preciso muito esforço para se compreender o propósito dos mentirosos e caluniadores por mais desfarsantes [sic] e camuflados que pareçam.
Qual o critério que lhes guia na forja de afirmações as mais disparatadas e mais destituídas de verdade?
Ei-los: – 1º – Desorientar o bom Povo Angolano para não haver entre ele entendimento para se fazer a unidade a todos bem desejada e esperada de dia para dia. Isto é para satisfazer os estranhos desejos dos colonialistas e capitalistas que tudo conseguem por portas e travessas.
2º – Aquelas baleias humanas que querem encher as suas buchas à custa do Povo Angolano encontraram nos egoístas homens angolanos um terreno favorável para se servirem da situação para semear a divisão e ódio entre o Povo Angolano.
3º – O egoísmo e o desejo ardente do mando são alguns dos factores que colaboram com as forças que tentam destruir os verdadeiros nacionalistas angolanos. É assim que se explica a tenaz oposição ao espírito de unidade a única chave mágica, que sem a qual é impossível vencer o inimigo colonialista.
COMUNISTAS
O termo comunista foi pela primeira vez trazido ao nosso conhecimento pela gestapo portuguesa (PIDE). Forjava este termo à volta da vítima, quando não dispunham de outras razões para a impelir nas suas malhas.
Comunista é a acusação mais barata e de resultados mais frutuosos de que se serviam os colonialistas para se desembaraçar dum angolano ou dum calcinhas. Trata-se dum negro educado à custa de sacrifícios do País!
Hoje parece – o termo comunista – uma herança de que muitos se desfrontam [sic] abusivamente para prejudicar um organismo ou indivíduos que lhes fazem sombra.
Este procedimento diabólico não enquadra nem patriotismo, nem nenhum segmento de justiça. É a abominação de desolação predita pelo profeta Daniel.
São pedras de tropeço perante um Povo eleito que luta pela sua liberdade!
Milhares dos nossos compatriotas estão apodrecendo nas prisões e enxovias de Angola e Lisboa atingidos por essa seta maligna – comunismo!
O que restou buscando o refúgio nos países irmãos são açurrados [sic] para as malhas da mesma rede – comunismo!
Quem ajuda a fazer a maligna batida?! – São elementos africanos a soldo dos capitalistas! – É triste dizê-lo!
Somos comunistas só porque somos pela política de não-alinhamento. Só porque recusamos comprometer nesta fase da luta a economia de Angola, porque julgamos que só o Povo de Angola compete definir a sua posição no quadro económico.
Só por esta nossa atitude que constitui uma garantia para todos os países desejosos de fazer.
OS MULATOS NO MPLA
Queremos ser sinceros na nossa afirmação. Existe de facto no seio do MPLA uma pequenina percentagem de mulatos, como os há também na UPA e noutros partidos angolanos. Esta é uma verdade que ninguém de qualquer partido o poderá negar sem cair em terrível contradição. Mas os nossos poucos mulatos que se encontram no seio do MPLA valem tanto em matéria de patriotismo como os seus irmãos negros. Irmãos disse, porque são filhos das nossas irmãs de raça. Têm qualidades que se recomendam à nossa aceitação, se não veremos.
Dentre vários casos que atestam a sua fidelidade à causa nacional citaremos apenas alguns.
1º – Nos preparativos do projecto para a primeira tentativa da Revolução pro-independência de 1924-28 figuram dentre os homens que encabeçavam o Movimento Revolucionário Angolano que ouso chamar o avô dos Movimentos actuais, alguns mestiços que se distinguiram pela sua situação política a favor do Movimento Revolucionário. Podemos citar para exemplo; o velho Henrique Macedo, Joaquim Macedo, e Pais Brandão, que sofreram as mesmas prisões, deportações e torturas como muitos dos seus compatriotas negros.
Se aquela Revolução aliás bem preparada outro relevo não teve, mercê aos traidores que nunca faltaram em todos os tempos, que denunciaram e prejudicaram a batalha que estava quase ganha!
Não obstante a dura repressão do Governo português, conseguiram que a Sociedade das Nações mandasse o Dr. Ross e Dr. Gramer para investigar da situação nas colónias portuguesas. O relatório destes Embaixadores da Organização Internacional confirmava a exposição do Movimento Revolucionário Angolano. A África inteira estava sob o jugo colonial com a excepção da Ethiopia, e não houve quem então apoiasse a causa Angolana.
2º – Caso: Os dois anos que precederam a actual Revolução foram ricos em ­exemplos: – Um bom número de mestiços trabalhavam em estreita colaboração com os seus compatriotas negros na preparação do terreno para a Revolução. Quase todos eles dispensavam dois terços dos seus vencimentos para a obtenção do material que capacitou os nacionalistas desencadear a campanha que o mundo bem conhece.
Ninguém dos zoilos [sic] acusadores participou nessas actividades preparatórias que são precisas em todas as Revoluções.
3º – Caso: Já dentro da guerra um comboio de camions com 500 negros angolanos com destino ao campo da execução foi interceptado por dois mestiços do MPLA obrigando os respectivos chauffeures a despejar os prisioneiros que meteram a salvo. Porém, os chauffeures infelizmente negros também ao serviço dos colonialistas, denunciaram o procedimento daqueles mestiços. Estavam prestes a serem mortos, porém, safaram-se a tempo, para se juntar ao MPLA. Os 500 homens salvos combatem com ardor e patriotismo contra colonialismo português!
Ora, pergunto eu, qual seria o procedimento de qualquer partido nacionalista angolano, por mais racista que fosse para com os mestiços supracitados?
É assim que se explica a presença deste grupo de compatriotas mestiços no seio do MPLA. Quem ousará condenar este grupo que justifica de modo eloquente o seu patriotismo? Creio eu que existe mestiços no seio de todos os partidos sem que as suas acções precedentes os recomendassem. Esta é a evidência da verdade a desafiar a todos os aduladores e traidores que se chafurdam na lama de acusar e intrigar um partido sob todos os títulos o mais aceitável e mais nacionalista!
O MPLA nunca quis perder tempo em formular desmentidos desnecessários convencido de que a máscara de que se servem os Directores do Posto e dos caluniadores é bastante transparente para oferecer o perfil do monstro que tenta desorientar o nosso Povo numa hora que reclama a unidade.
A MENTIRA DESMASCARADA
Creio que o Povo já teve tempo de compreender que era uma autêntica e estúpida mentira, quando se dizia que os medicamentos do CVAAR matavam no prazo de três meses, pois já lá vai mais de um ano que ninguém ainda morreu nos tratamentos nos nossos postos espalhados ao longo da fronteira Angola-Congo.
No interior de Angola também já compreenderem o triste jogo dos impotentes mentirosos e caluniadores que vencidos no campo das competências e dignidade clara se chafurdam quais javardos da montanha na lama da mentira. Agora secou-se a lama e o público já não aceita participar na dança dos doidos e farsantes nacionalistas que têm por divisas o egoísmo. Mas infelizmente há ainda aqui e ali quem acredita no burro do saltimbanco que escreve no chão com suas patas as 25 letras do alfabeto.
Creio que ao bom entendedor meia palavra basta.
Ass: Rev. Domingos Francisco da Silva
Vice-Presidente do MPLA
Léopoldville, 26 de Junho de 1963

Carta aberta do Rev. Domingos da Silva sobre calúnias «A calúnia desmascarada» (Léopoldville)

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