Conferência de imprensa de Mário de Andrade (com perguntas e respostas)

Cota
0050.000.070
Tipologia
Conferência de imprensa
Impressão
Policopiado
Suporte
Papel comum
Autor
Mário Pinto de Andrade - Chefe do departamento de Relações Exteriores do MPLA
local doc
Léopoldville (Rep. Congo)
Data
Mai 1963
Idioma
Conservação
Bom
Imagens
12
Observações

Foi publicado no 3º volume de «Um amplo movimento…»

MOVIMENTO POPULAR DE LIBERTAÇÃO
DE ANGOLA
MPLA
51, Avenue Tombeur de Tabora
B. P. 720 – Tel. 2452
LÉOPOLDVILLE
[carimbo do CD do MPLA]

CONFERÊNCIA DE IMPRENSA DE MÁRIO DE ANDRADE, CHEFE
DO DEPARTAMENTO DAS RELAÇÕES EXTERIORES DO MPLA
No espírito das resoluções adoptadas pela primeira Conferência Nacional do MPLA, o Comité Director da nossa organização decidiu reforçar as alianças naturais que existem entre os movimentos nacionalistas e os países africanos independentes. Também pretendemos harmonizar as nossas posições políticas com as dos Chefes de Estado Africanos em relação aos grandes problemas que condicionam o futuro do nosso continente.
Em vésperas da Conferência de Addis Abeba, duas missões de informação visitam um certo número de países africanos com vista a coordenar uma acção comum sobre as medidas a tomar contra o colonialismo português.
O apoio constante que o povo e o governo argelinos, presidido pelo irmão BEN BELLA, nos concede tanto no plano político como material, encoraja as nossas iniciativas diplomáticas na perspectiva da Conferência de Addis Abeba.
Aliás, existe unanimidade em África quanto à determinação dos responsáveis dos destinos dos povos africanos em acelerarem a liquidação das últimas fortalezas coloniais.
A acção militar do povo angolano entra numa nova fase. Com efeito, o MPLA pôde ultrapassar os obstáculos que desde 4 de Fevereiro de 1961 travavam o desenvolvimento das forças nacionalistas, com o enquadramento político-militar das massas combatentes.
Os aspectos negativos da insurreição apresentavam-se, no nosso caso, com as características seguintes: uma resistência localizada, ausência de um comando único, carência na definição dos objectivos políticos da luta e divisão do movimento nacionalista. Era portanto necessário planificar uma acção que permitisse a mutação das condições nas quais se debatiam as massas angolanas e elevar o nível da luta político-militar. Paralelamente, era preciso que os grupos que, no interior do país, suportavam o peso do exército colonial, depois de terem abandonado as posições conquistadas ao inimigo, mantivessem uma actividade militar.
Foi assim que esses grupos nacionalistas tiveram de se retirar para zonas praticamente inacessíveis ao inimigo – florestas e montanhas – e organizar-se em núcleos de resistência militar.
Ao mesmo tempo que mantínhamos uma actividade militar reduzida, estávamos engajados na solução dos problemas específicos da guerra de libertação.
Foi assim que o MPLA acelerou a formação dos seus efectivos militares, experimentados nas técnicas da guerrilha, o enquadramento político-militar da população e o estabelecimento de estruturas organizacionais no interior do país.
Além disso, realizámos uma verdadeira mobilização dos quadros para a acção armada, estabelecemos uma estrutura militar adaptada às condições de desenvolvimento da luta e procedemos à instalação orgânica do MPLA no território nacional.
No momento presente, estamos em condições de afirmar à opinião pública que o MPLA pode prosseguir a luta armada contra o colonialismo português sobre novas bases.
Há numerosas adesões de chefes regionais à nossa organização, e a acção clandestina desenvolve-se nas cidades de Angola.
Assim podemos afirmar que o povo angolano baseia cada vez mais as suas esperanças na linha política do MPLA.
O Exército Popular de Libertação de Angola (EPLA), ponta de lança do MPLA, com cerca de 10.000 homens, dos quais 250 jovens quadros formam a elite treinada pelos irmãos da Argélia e do Marrocos, constitui o garante do desfecho da fase actual e da realização dos objectivos revolucionários do nosso movimento. Este exército modificou as suas estruturas e criou um comando operacional que dispõe de unidades de guerrilha com vista a mobilizar e enquadrar o povo angolano.
Desde Janeiro último, uma nova frente de combate foi aberta no enclave de Cabinda, fronteiriça do Congo-Brazzaville. Os grupos de guerrilha em acção nessa região já provaram a sua capacidade militar através de combates que tiveram de levar a cabo contra o exército colonial português, nomeadamente a 20 de Janeiro no decurso do qual os combatentes do EPLA liquidaram uma patrulha inimiga.
As condições estão reunidas para alargar a guerrilha a todo o território do enclave. O enquadramento político-militar das forças nacionalistas dos distritos do Cuanza-Norte e de Luanda também está concluído.
Muito recentemente, no mês de Abril, as nossas forças armadas realizaram uma acção na estrada Luso [?]-Damba, que liga a cidade de Luanda à do Uíge, tendo liquidado trinta soldados portugueses. Dois oficiais subalternos do exército colonialista foram feitos prisioneiros e fuzilados depois de julgamento: Joaquim Rodrigues e Luís Pereira.
Esses sucessos da nossa acção político-militar não escaparam ao inimigo que, nos seus relatórios do estado-maior, sublinha que a partir de uma certa fase as tropas portuguesas começaram a ser atacadas, já não por angolanos, mas por guerrilheiros argelinos. Estamos portanto numa boa escola...
Perante esta situação, o Governo português, debatendo-se com os seus problemas internos e isolado no plano internacional, utiliza ao máximo alguns grupos de traidores através dos quais faz constar que a nova Lei Orgânica do Ultramar, que está em discussão na Assembleia Nacional, deve significar o processo lusitano conducente à independência de Angola. De facto, a Lei Orgânica do Ultramar refere-se simplesmente ao modo de eleição do Conselho Legislativo. Mesmo que ele resultasse de uma eleição, os seus membros apenas se representariam a si próprios já que o direito de voto está reservado a uma ínfima minoria de Angolanos não ultrapassando 0,3% da população. É inconcebível que o Governo Português, amarrado a uma concepção política anacrónica e dependente da exploração colonial, possa empenhar-se numa qualquer via que leve à autonomia do nosso país.
É por isso que a luta do povo angolano deve prosseguir no plano político-militar até a independência nacional.
Na luta pela liquidação do colonialismo em África e no caso concreto da libertação de Angola, o MPLA estima que os países africanos independentes são chamados a desempenhar um papel primordial.
Referindo-nos às resoluções tomadas pelas Conferências dos países africanos e pelas diversas reuniões dos partidos políticos, às declarações dos chefes de Estado, às iniciativas dos grupos afro-asiáticos na ONU atestando uma determinação comum em liquidar o colonialismo em África, o MPLA propõe-se apresentar em Addis Abeba um plano de acção concreto contra o colonialismo português.
Estamos convencidos que chegou a hora dos países africanos radicalizarem as suas posições contra esta “besta peçonhenta”, como o dizia o presidente BEN BELLA numa mensagem endereçada aos nacionalistas angolanos. A radicalização das atitudes africanas contra o Governo de Lisboa deve comportar necessariamente o boicote total e efectivo de Portugal e o recurso ao Conselho de Segurança com vista à sua expulsão da ONU. Naturalmente o MPLA pedirá insistentemente que a Conferência de Addis Abeba chegue a uma acção concertada e a uma coordenação de esforços para a ajuda material aos movimentos de libertação das Colónias Portuguesas.
Mas longe de iludir o problema da divisão do nacionalismo angolano, proporemos em breve, às outras organizações, uma nova plataforma de unidade baseada num programa mínimo de luta contra o colonialismo português.
A mediação dos chefes de Estado africanos reunidos em Addis Abeba poderá ser um factor do nosso entendimento. Se a realização de todas essas medidas for cumprida, então nenhum grande obstáculo maior subsistirá no caminho do povo angolano para a independência nacional e a unidade africana.
[Seguem-se diversas perguntas e respostas]
Maio/1963 MPLA
Departamento das Relações Exteriores
Secretariado de Coordenação – Léopoldville

Conferência de imprensa de Mário de Andrade (com perguntas e respostas) (Léopoldville, Maio 1963)

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