Carta de Eduardo Santos a «Caros amigos»

Cota
0050.000.001
Tipologia
Correspondência
Impressão
Dactilografado
Suporte
Papel comum
Remetente
Eduardo Macedo dos Santos
Locais
Data
Idioma
Conservação
Bom
Imagens
3
Observações

Foi publicado no 3º volume de «Um amplo movimento…»

Acesso
Público

Alger, 1 de Maio de 1963
Caros amigos:
O portador desta carta é o nosso camarada e amigo Viana. A sua viagem foi decidida para vos participar de um certo número de assuntos, parte dos quais, vão descritos nesta carta e para vos entregar o budget conseguido nesta capital.
1– TLEM[CEN]
Chegaram de avião os dez camaradas vindos de Léo. A viagem decorreu sem incidentes, todos estão bem e aguardam apenas que o grupo esteja definitivamente concluído para iniciar o trabalho que é do vosso conhecimento. Decidimos aproveitar a viajem do nosso camarada Viana para entregar os passaportes e pagar as viagens dos camaradas que actualmente se encontram na Europa e que decidiram aceitar o engajamento militar. O Viana informar-vos-á a identidade dos camaradas que virão e as suas devidas justificações. Esperamos que vocês aí, nos ponham ao corrente do ritmo de chegada dos próximos camaradas, para aqui tomarmos as medidas convenientes. Cremos que talvez seja melhor vestir no mínimo os camaradas que vierem, uma vez que, tivemos de realizar aqui uma despesa enorme, para satisfazer as necessidades mínimas dos camaradas nesse domínio. Cremos que as despesas aí talvez sejam mais baratas uma vez que beneficiamos da troca em mercado negro. Informo-vos também que o Benedito talvez venha para Tlem. Nós pensamos solicitar a sua colaboração nesse plano.
BUDGET
Resolvi pedir aos nossos amigos aqui um Budget de 18 milhões de francos argelinos. Isso foi possível porque se desconhecia o montante que devíamos receber do budget precedente que nos foi satisfeito, como sabem, parcialmente. Inclui já no actual budget as despesas que realizamos actualmente com a deslocação dos camaradas de Léo para Tlem. Os argelinos concederam-me apenas 15 milhões importância de que o nosso camarada Viana é portador. Acrescento que o Viana levar-vos-á mais algum dinheiro que é parte da importância de 5.250.466 que resultou da contribuição pública do povo de Tizi-Ouzu depois das manifestações do 4 de Fevereiro. Quero esclarecer-vos que a totalidade do budget dos 18 milhões nos foi concedida mas que só nos satisfizeram em quinze. Tenho um documento onde os argelinos estão comprometidos a nos satisfazerem os 3 milhões que restam. Entretanto eu creio que não é tão cedo que vamos consegui-lo. Junto uma folha anexa com as contas.
ARMAS
Brevemente partirão daqui por barco caixas com medicamentos e armas endereçadas para o CVAAR com destino para Pointe Noire. Peço-vos que a partir da recepção desta carta comecem imediatamente a montar um posto do CVAAR em Pointe Noire para facilitar a recepção das caixas. É possível que sejam enviadas no total cerca de quatro toneladas de armas. Isto é segredo rigoroso. Ainda este mês devem seguir os transportes de que me referi na minha última carta; trata-se de um camion, 2 jeeps, um 403. Juntamente com os carros seguirão também armas. Logo que esteja ao corrente do dia do embarque aqui das embalagens a que me refiro receberão um telegrama meu com as indicações convenientes.
Creio que os assuntos do Lima estão a decorrer bem. Eu deduzo assim porque o Lima solicitou a deslocação do camarada Benigno para Rabat que seguiu há cerca de quatro dias. Não tenho outras indicações.
SEMINÁRIO JEUNESSE DEMOCRÁTICA MUNDIAL
O nosso Movimento participou no meeting que a jeunesse democrática mundial realizou nesta cidade como sessão inaugural do seminário. Angola foi o primeiro país a falar. Fomos extraordinariamente ovacionados. O camarada Viana poderá relatar-vos como se desenvolveu todo o seminário. Foi pena que não tivéssemos um representante da nossa Jeunesse para participar nos trabalhos do seminário. Nós resolvemos não ir para lá do meeting.
CONTACTOS
Contactei os camaradas chineses a nível da embaixada. Fiz os pedidos inscritos na minha missão. Prometeram responder-nos mais tarde pois precisavam contactar com o governo na capital. Até a data, de resto é cedo, ainda não obtive nenhuma resposta. Devo ainda contactar os Jugoslavos dentro da perspectiva duma possível deslocação de elementos do nosso Comité Director a Belgrado, conforme ficou resolvido na minha primeira estadia em Alger e que o Comité Director aprovou, em sessão expressamente convocada em Léo para ouvir o meu relatório. Entretanto sei já que o princípio da viagem está mais ou menos acordado, faltando apenas marcar em definitivo as datas e a natureza da nossa missão à Jugoslávia. Espero contactar ainda os soviéticos e a Croissant Rouge para tratar do problema das esposas dos nossos camaradas que vão para Tlem. Creio que o Lúcio já enviou a lista das bolsas que pretendemos que os argelinos nos concedam. Caso contrário ele que me envie a lista para eu fazer de intermediário junto do ministro e forçar as coisas.
BUREAU
Teremos no próximo sábado dia 4 do corrente o nosso Bureau em condições de funcionar. É possível que vós creiam que eu exagerei um pouco nas despesas que realizei para apetrechar devidamente o nosso Bureau. Entretanto procedi assim porque estou convencido que necessitamos aqui de um Bureau que impressione. Esta capital é actualmente em África o lugar da maior intriga internacional e que concentra mais representações, jornalistas e observadores estrangeiros. Ora um Bureau devidamente montado talvez possa exercer alguma influência psicológica de que nós poderemos aproveitar. De resto eu tenciono apresentar as contas das despesas efectuadas às entidades responsáveis para conseguir que nos indemnizem. Não o faço actualmente porque penso que a altura não é oportuna. A partir da recepção desta carta vocês devem remeter toda a correspondência para a direcção do nosso Bureau que é a seguinte:
38/40 RUE DIDOUCHE MOURAD – PORTE 44D – 2ème étage
ALGER
Logo que o telefone esteja instalado, mandar-vos-ei o número.
RABAT
Ainda não foi possível deslocar-me a Rabat porque tenho problemas por resolver nesta cidade. Logo que tenha terminado partirei imediatamente e avisarei a minha chegada por telegrama.
INFORMAÇÃO
Não recebemos a mais pequena informação sobre as nossas coisas. Estou completamente a zero sobre o andamento da situação. Pelo menos enviem-nos de tempos a tempos um boletim. Peço que lembrem ao Aníbal e o Carreira que eles ficaram de me enviar documentos e fotografias para a brochura. Nada recebi até a data.
Creio que vocês podem aproveitar os camaradas que vêm para Tlem para enviar propaganda que é sempre necessária aqui: podem enviar-nos para termos no nosso bureau os documentos que vocês acharem convenientes, brochuras, números do jornal unidade angolana (os únicos que saíram), fotografias para expor, incluindo as dos massacres dos portugueses e que estiveram durante muito tempo expostas na nossa vitrine em Léo durante a comemoração do primeiro aniversário do 4 de Fevereiro.
CÓDIGO
É absolutamente necessário que vocês aí estabelecem códigos com as representações que se encontram no estrangeiro. Creio que isso deve ser enviado directamente aos nossos camaradas que são representantes do movimento ou que estão actualmente a realizar missões que necessitam de um contacto repetido com o órgão executivo.
Nada mais tenho para vos comunicar. Saudações fraternais do vosso camarada e amigo.
[assinatura de Eduardo dos Santos]

Carta de Eduardo Santos, em Argel, anunciando ida de Gentil Viana

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