Memorando do MPLA aos governos africanos sobre o GRAE

Cota
0033.000.023
Tipologia
Memorando
Impressão
Policopiado
Suporte
Papel comum
Autor
MPLA - Movimento Popular de Libertação de Angola
local doc
Léopoldville (Rep. Congo)
Data
Idioma
Conservação
Mau
Imagens
20
Observações

Foi publicado no 2º volume de «Um amplo movimento…»

Acesso
Público

MOVIMENTO POPULAR DE LIBERTAÇÃO DE ANGOLA MPLA 51, Avenida Tombeur de Tabora – C.P. 720 LÉOPOLDVILLE MEMORANDO AOS GOVERNOS AFRICANOS SOBRE A FORMAÇÃO DE UM PRETENSO “GOVERNO PROVISÓRIO DA REPÚBLICA DE ANGOLA” O Comité Director do Movimento Popular de Libertação de Angola tem a honra de endereçar o presente Memorando ao Governo de ­­­­______________ A razão determinante pela qual o Comité Director do MPLA elaborou este Memorando­ deve-se mais à defesa dos superiores interesses do povo angolano do que à fidelidade aos princípios patrióticos que o MPLA defende. O MPLA impõe-se assim o dever de responder, de forma construtiva, às preocupações dos meios governamentais africanos face ao problema da divisão das forças nacionalistas angolanas. Essas preocupações salientam o facto que o destino de Angola se deverá inscrever necessariamente no destino de toda a África. O MPLA recorda, em relação a isso, um dos factos mais recentes que revelam a inquietação dos países africanos quanto ao futuro de Angola, as diligências ­empreendidas pelos delegados dos países irmãos na XVIª sessão da Assembleia da ONU por ocasião do debate sobre a situação em Angola, com o objectivo de reunir os representantes do MPLA e da UPA (União das Populações de Angola) e de os levar a conjugarem os seus esforços. Por essa ocasião, foi permitido aos membros do grupo afro-asiático julgarem a responsabilidade das organizações nacionalistas que, sob os mais falaciosos argumentos, levantam obstáculos à realização da unidade do nacionalismo angolano. O presente Memorando tem por objectivo: 1 – Recordar as acções empreendidas para a constituição de uma Frente de todas as organizações nacionalistas angolanas e as oposições encontradas no cumprimento dessa tarefa. 2 – Constatar o carácter e a natureza, contrários aos interesses de Angola e da África, das organizações que estiveram na origem da formação do pretenso “Governo ­Provisório da República de Angola”, a 5 de Abril de 1962. 3 – Alertar os Estados Africanos para os perigos de um eventual reconhecimento do pretenso “Governo Provisório da República de Angola”, o qual iria consagrar certamente a divisão do nacionalismo angolano e a intervenção estrangeira na questão angolana. Como consequência, o MPLA, fiel ao direito dos povos oprimidos e aos melhores princípios da luta pela emancipação da África, denuncia o carácter anti-nacional e não-representativo desse falso “Governo”. O MPLA declara solenemente que em nenhum caso daria o seu aval ao pretenso “Governo Provisório da República de Angola”. Perante a superioridade temporária do aparelho militar e repressivo do nosso inimigo – o colonialismo português – perante a ajuda material, financeira e diplomática que esse inimigo não cessa de receber da parte dos seus aliados, a direcção do MPLA, estabelecida no interior do país, após uma análise das condições em que se deveria prosseguir com a revolução angolana, reconheceu desde 1956 que a estratégia da luta do povo angolano pela sua independência deve estar assente na constituição de uma Frente unida de todas as forças nacionalistas. Aliás, ficou bem claro no espírito dos nossos dirigentes, assim como nos textos políticos do MPLA, que a vantagem de uma Frente unida como instrumento de libertação ajudaria o povo a forjar uma sólida consciência nacional e constituiria a melhor arma de desgaste contra as forças de repressão; o carácter nacional e aberto de uma tal Frente, a sua vocação para abranger todas as organizações nacionalistas e para mobilizar todas as energias nacionais revelou-se a mais decisiva garantia de sucesso da nossa causa. De facto, a libertação de Angola deve ser obra de todos os Angolanos e não apenas de uma fracção do seu povo. Para o MPLA, a Frente deveria, antes de mais, tender para a realização de um entendimento entre as forças nacionalistas para mais tarde, no desenrolar da luta, se identificar com a totalidade da nação em armas. Nesse sentido, tendo em conta as condições políticas internas e internacionais que faziam prever uma guerra de libertação de longa duração para Angola, o MPLA trabalhando na clandestinidade, elaborou em 1956 um Manifesto. Esse Manifesto, que foi amplamente divulgado, convidava o povo angolano a organizar-se para melhor combater em todas as frentes e em todas as circunstâncias “para a liquidação do colonia­lismo português, com o fim de fazer de Angola um Estado independente e instaurar um governo democrático, um governo de coligação de todas as forças em luta para a libertação da pátria”. Respondendo a esse memorável Manifesto, as organizações ­nacionalistas da época, enraizadas no interior do país, fundiram-se imediatamente com o MPLA. Estavam lançadas as bases para a salvação nacional. Mais tarde, quando foi necessário rever os seus estatutos para uma melhor ­adaptação às condições da luta anti-colonialista, o MPLA manteve o texto do art. 4: “Art. 4 – O MPLA tem por objectivos: – A luta [Lutar]1 juntamente com todas [outras] as organizações ­patrióticas angolanas, na mais larga união popular, pela liquidação, em Angola, do domínio colonial português e de todas as relações colonialistas e imperialistas e pela conquista da independência imediata e completa de Angola. – A defesa [Defender] e a realização [realizar] das reivindicações de todas as [das] camadas sociais angolanas, [mais] oprimidas e [mais] exploradas pelo regime colonial e em particular [nomeadamente] as reivindicações das massas camponesas e trabalhadoras que constituem a quase totalidade da população de Angola”. (Cf. Statuts e Programme du MPLA – Pierre-Jean Oswald, ed. Paris, 1961). O voto unânime que conservou inalterados a forma e o conteúdo do artigo 4 dos Estatutos constitui a prova de que a massa dos militantes compreendia o sentido da nossa luta que tinha por objectivo a concretização da unidade de todos os Angolanos. Tal é, igualmente, o espírito definido no Programa Mínimo do MPLA: “O MPLA luta pela realização do seguinte Programa Mínimo: a) Criação urgente de uma [sólida] Frente angolana de libertação que agrupe, numa larga união todos os partidos políticos, todas as organizações populares, todas as forças armadas, todas as personalidades do país, todas as ­organizações religiosas, todas as minorias nacionais ou étnicas [todas as nacionalidades ou etnias] de Angola, todas as camadas [classes] sociais africanas, todos os Angolanos residentes no estrangeiro, sem distinção de tendências políticas, de condições de fortuna, de sexo e de idade.” Por conseguinte, a realização de uma Frente Angolana de Libertação, longe de ­constituir para o MPLA um objectivo secundário ou recente, inscreve-se à cabeça dos seus estatutos e do seu programa políticos. * * * * * I – A acção do MPLA para a constituição de uma Frente Angolana de Libertação A ideia de uma Frente unida sempre constituiu uma constante da acção política do MPLA. Em declarações à imprensa, em comunicados aos militantes e à população angolana, à ONU, em Memorandos aos chefes de Estado e de governo, o MPLA nunca deixou de expressar a sua vontade a favor a uma Frente unida de libertação. Pode-se ler, por exemplo, esta passagem do Memorando dirigido à Conferência dos Chefes de Estado dos Países não-alinhados (Belgrado, Setembro de 1961): “Nesta etapa da luta de libertação do povo angolano, o MPLA considera como necessidade primordial, intensificar e elevar a luta nos planos político e militar. Mas esta acção deve ser levada a cabo numa frente de libertação angolana, cujas modalidades é necessário determinar com as outras formações nacionalistas. O MPLA, pelo seu lado, não cessa de apelar a todos os quadros responsáveis dos movimentos nacionalistas angolanos para a realização a curto prazo de uma conferência da unidade. Pensamos que a independência de Angola, se for obtida nas condições actuais da luta armada e com base na Frente de luta unida, terá melhores hipóteses de libertação de toda a dominação estrangeira e de toda a exploração.” Na altura em que se desencadeou a luta armada em Angola, a 4 de Fevereiro de 1961, o MPLA, fiel a esses princípios de unidade entre as massas e os dirigentes ­reunidos num amplo agrupamento democrático, decidiu intensificar os contactos pessoais com os responsáveis­ das outras organizações nacionalistas angolanas apresentando-lhes ­propostas e sugestões com vista a uma conferência de unidade. Foi assim que em Abril de 1961, dois membros do Comité Director do MPLA, investidos de plenos poderes, mantiveram conversações em Léopoldville com os responsáveis da UPA, da ALLIAZO (Aliança dos Originários do Zombo) e do MLEC (­Movimento de Libertação do Enclave de Cabinda) em torno de um projecto de programa, de acordo e de estatutos para a constituição de uma Frente. O projecto de Programa comum proposto pelo MPLA compreendia dois objectivos essenciais: a) “Lutar, por todos os meios, para a independência de Angola através da liquidação do colonialismo português e de todos os vestígios de relações colonialistas e imperialistas em Angola. b) Conquistar, preservar e reforçar todas as condições indispensáveis para que o povo angolano realize plenamente o seu direito à ­autodeterminação: que ele determine, livremente, o seu estatuto político e o sentido do seu desenvolvimento económico, social e cultural.” O projecto de acordo sobre a constituição de uma Frente de Libertação Angolana dizia: “O Movimento Popular de Libertação de Angola (MPLA), a Aliança dos Originários do Zombo (ALIAZO), o Movimento de Libertação do Enclave de Cabinda (MLEC), a União das Populações de Angola (UPA), ______ , ­animados pelo desejo de contribuir com todas as suas forças, para a conquista da independência da sua Pátria comum – Angola – e firmemente convencidos que só existem vantagens em se atingir esse objectivo através da ampla união de todas as forças patrióticas angolanas, para que a independência de Angola se baseie na unidade do povo, na colaboração fraterna entre todas as etnias de Angola, na ordem democrática e na integridade territorial do país – decidiram livremente assinar o presente acordo: Artigo I – O MPLA, a ALIAZO, o MLEC, a UPA, _____, decidem criar a FRENTE DE LIBERTAÇÃO DE ANGOLA, cujos estatutos, que aprovaram integralmente, e sem reservas, e que constituem um instrumento inseparável do presente acordo, estabelecem os princípios essenciais das relações entre todas as organizações membros da FLA. Artigo II – O MPLA, a ALIAZO, o MLEC, a UPA, _____, entendem ­consolidar e alargar a FLA a todo o território angolano, para obter no seu seio, a mais ampla e livre adesão das massas populares angolanas à FLA, para levar todas as organizações patrióticas angolanas a agruparem-se nela e a ganhar, para a causa do povo angolano, a simpatia e a solidariedade actuante dos povos do mundo inteiro amantes da liberdade. Artigo III – O MPLA, a ALIAZO, o MLEC, a UPA, _____, aprovam sem reservas o “Programa Comum” anexo da FLA que visa unir todo o povo ­angolano na luta pela independência, pela unidade nacional e pela integridade ­territorial de Angola. Artigo IV – O presente Acordo entrará em vigor depois da troca de notas escritas entre o MPLA, a ALIAZO, o MLEC, a UPA, _____, anunciando que o seu conteúdo foi ratificado pelos órgãos dirigentes competentes das organizações supracitadas. Artigo V – O presente Acordo foi estabelecido em Léopoldville, a ­­­___ de Abril de mil novecentos e sessenta e um, em dois textos, um em língua portuguesa e o outro em língua francesa, os dois textos fazendo igualmente fé”. O projecto de Estatutos da Frente estava assim redigido: “Artigo I – Denominação: FRENTE DE LIBERTAÇÃO DE ANGOLA. Artigo II – A Frente de Libertação de Angola criada pelo MPLA, a ALIAZO, o MLEC, a UPA, ____, agrupará numa ampla união, todos os partidos e ­movimentos políticos, todas as organizações populares, as forças armadas, as personalidades iminentes do país, as organizações religiosas, as etnias e classes sociais, os Angolanos residentes no estrangeiro, sem distinção de tendências políticas, condições de fortuna, sexo ou idade. Artigo III – Os objectivos da FLA são: a) Conquistar, por todos os meios, a independência imediata e completa de Angola. b) Defender e assegurar, por todos os meios, a soberania total e inalienável do povo angolano, a unidade nacional, a integridade territorial de Angola e o exercício da democracia na vida política do país.” O MPLA defendia o princípio segundo o qual a Frente, criada por métodos democráticos devia reflectir uma ampla união de todas as forças nacionalistas angolanas. O MPLA previa com efeito que a Frente, pela sua actividade, poderia evoluir durante a luta de libertação, para um Governo Angolano. Uma simples leitura desses documentos, que aqui reproduzimos, basta para provar o espírito de conciliação, a boa-fé e a seriedade política do MPLA. A aprovação pelas organizações­ nacionalistas da constituição de uma Frente teria naturalmente ­contribuído para um desenvolvimento mais eficaz da luta do povo angolano. Depois de uma série de diligências directas, mas infrutíferas, com os responsáveis das organizações nacionalistas angolanas, o MPLA, na voz do seu Presidente, declarava durante uma Conferência de imprensa em Léopoldville, a 30 de Outubro de 1961: “O aspecto essencial da nossa política interna continua a ser a procura constante da unidade de acção entre as diversas organizações nacionalistas da Angola combatente. É hoje um facto assente que o MPLA nunca poupou esforços para a criação de uma Frente comum das formações políticas. Em cada etapa importante do desenvolvimento da nossa luta de libertação nacional, lançámos apelos com vista à realização da unidade dos nossos movimentos.” Enquanto uma parte dos dirigentes da ALIAZO apoiou abertamente a ideia da constituição urgente de uma Frente, outra parte impediu esta organização de se afirmar como parceira do MPLA na campanha a favor de uma Frente de luta unida. O Sr. Holden ROBERTO, Presidente da UPA e alguns dos seus amigos da direcção desse Movimento, opuseram-se desde o início à própria ideia de uma Frente. No entanto, a oposição crescente que as populações de Angola, vítimas da guerra colonial, manifestavam contra a política anti-unitária da UPA, conduziram essa ­organização a declarar publicamente: “O exército de libertação nacional apoia sem reservas a constituição da Frente sob a direcção da UPA”. (Comunicado assinado por Holden ROBERTO e João BATISTA TRAVES in “Le Courrier d’Afrique” de 23 de Agosto de 1961 – Léopoldville). Essa é a prova de que a direcção da UPA teve de ter em conta a pressão das massas, em relação à ideia da constituição de uma Frente de Libertação Angolana, ainda que ela se reserve o papel dirigente. Como reacção a essa tomada de posição, reafirmada mais tarde pelas organizações submetidas à direcção da UPA, o Presidente do MPLA ­declarou a 11 de Dezembro de 1961, durante uma Conferência de Imprensa em Rabat: “Repetimos que o combate heróico, levado a cabo pelo povo angolano para a sua libertação nacional, tem insuficiências. Baseando-nos na firme determinação das massas angolanas que reclamam a unidade dos partidos políticos, o Comité Director do MPLA esteve sempre pronto a afastar os obstáculos à constituição de uma Frente de Libertação angolana. Na nossa opinião, a Frente deve surgir de um amplo confronto entre as formações nacionalistas. Foi por isso que nos opusemos ao ponto de vista expresso recentemente pelo Bureau Executivo da UPA que preconiza a criação de uma Frente sob sua exclusiva direcção. Da nossa parte não colocaremos qualquer condição prévia à convocação de uma Conferência de unidade que deverá estabelecer, de uma vez por todas, a coordenação político-militar dos nossos esforços, nomeadamente o comando único dos nossos grupos de guerrilha. Se todas essas tentativas falhassem, o campo estaria aberto à luta fratricida em Angola. Não iríamos assumir a responsabilidade de tal situação trágica perante o nosso povo, a África e o mundo.” Por seu lado, o Vice-Presidente Geral da ALIAZO, num artigo sobre as ­possibilidades da criação de uma Frente angolana, declara: “E a UPA? A atitude dos líderes da UPA em relação à formação de uma Frente comum angolana sempre foi desconcertante. Para o Holden, ele nunca foi ­partidário de uma tal “frente” e nunca o será. É verdade que em dois comunicados à imprensa, a UPA afirmou com veemência que de modo algum se opõe ao ­princípio da formação de uma frente comum angolana. Mas na prática é completamente diferente” (Cf. “Le Courrier d’Afrique” de 5 de Fevereiro de 1962). Os apelos e as diligências do MPLA a favor da constituição da Frente provaram sobejamente que ele continua a ser a única organização nacionalista que se bate pela unidade da causa angolana. Tal é testemunhado numa parte de um artigo do Sr. Eric ROULEAU que cita as conclusões a que chegaram os Srs. KASSANGA e CASSINDA que, como se sabe, condenaram os actos da direcção da UPA e do próprio Sr. HOLDEN: “Essas tomadas de posição constituem uma vitória política para o MPLA, partido dirigido pelo Sr. Mário de Andrade, que não cessou de reivindicar a constituição de uma Frente nacional, à qual o Sr. Roberto era absolutamente hostil. Resta saber se os “separatistas” da UPA poderão isolar a direcção do partido e em que medida estão realmente dispostos a colaborar com o MPLA” (Cf. “Le Monde” de 15 de Março de 1962). Face às oposições manifestadas por certas organizações políticas angolanas à constitui­ção de uma Frente, os nacionalistas angolanos assim como observadores estrangeiros interrogaram-se sobre as razões determinantes da atitude da UPA. O Sr. MATUMONA, Vice-Presidente Geral da ALIAZO afirmava sem rodeios, num artigo do “Le Courrier d’Afrique” de 5 de Fevereiro de 1962: “As pressões americanas são exercidas sobre a UPA, partido de Roberto Holden. De facto, não passa despercebido aos observadores que o apoio material e ­financeiro de que a UPA goza provém, na sua quase totalidade, dos Estados Unidos, mais precisamente do Comité Americano para a África. Essa ajuda financeira (...) teria lugar com a condição de a UPA não se ligar àqueles que os meios americanos chamam comunisantes. Isto explicaria a intransigência radical que sempre caracterizou Roberto Holden para se juntar ao MPLA ou a qualquer outra frente na qual o MPLA figurasse.” Explicações autorizadas relativas à oposição da direcção da UPA à realização da unidade dos nacionalistas angolanos, foram dadas por certos dirigentes pertencentes à fracção sã, singularmente pelo Sr. Marco KASSANGA, chefe de Estado-Maior da UPA e pelo Sr. CASSINDA, Secretário-Geral da Liga de Trabalhadores de Angola (formação sindical ligada à UPA). O Sr. KASSANGA, na sua conferência de imprensa em Léopoldville a 3 de Março de 1962, declarava: “Holden não queria sinceramente lutar pela libertação de Angola, mas pelo contrário, impor a luta ao povo angolano, a fim de forçar a aceitação da supremacia da sua tribo, da sua religião – o protestantismo – e da língua francesa tornada oficial para todo o território nacional. Para além disso, ele visava a eliminação da elite angolana, em virtude da sua falta de maturidade política, receando uma oposição que o impediria de realizar os seus planos pessoais” (Cf. “L’Essor” de 12 de Março de 1962 – Bamako). E o Sr. CASSINDA afirmou: “Apesar da existência em Léopoldville de várias organizações e movimentos nacionalistas angolanos no seio dos quais militam milhares de trabalhadores angolanos, fomos dominados, desde o início da criação da nossa Central, por um movimento político denominado UNIÃO DAS POPULAÇÕES DE ANGOLA “UPA” e toda a nossa actividade foi dirigida no sentido de servir os interesses desse movimento e contra os interesses legítimos dos trabalhadores angolanos e violando os nossos estatutos e todas as leis sindicais”. Quer dizer que a direcção da UPA (e em particular o seu Presidente) sempre se opôs à formação de uma Frente Nacional Angolana. Mas quando se viu constrangida a aceitar a ideia, a UPA pôs a condição da direcção exclusiva que segundo ela, deveria pertencer-lhe. As declarações públicas a esse respeito levam-nos a concluir que as razões determi­nantes da política anti-unitária e anti-democrática da UPA são: o conluio de seu presidente e de alguns dos seus amigos da direcção com interesses estrangeiros a África; a política de egoísmo partidário e de liderança usurpadora, mantida pela direcção da UPA; as ambições pessoais desmedidas, o orgulho e a falta de escrúpulos de alguns dos seus dirigentes, sobretudo do presidente desse partido. II – A UPA e a ALIAZO são partidos de base tribal ou regional. Num artigo escrito em Léopoldville e publicado no “Toward Freedom” (Vol X, N.º 6, Junho de 1961 – Chicago – USA), Russel Warren Howe declarava: a “UPA é essencialmente um partido Bakongo”. No mesmo artigo, Russel W. Howe advertia: “Se, como é possível, a pessoa de H. Roberto se impusesse enquanto ­autoridade principal do país, muitas coisas dependeriam da sua habilidade em estabelecer a sua autoridade sem utilizar medidas que fomentassem os ódios dos seus inimigos de tribo.” O jornalista francês Eric ROULEAU, que tinha mantido contactos com os ­dirigentes da UPA em Léopoldville, em Março e Agosto de 1961, pôde constatar que “os dirigentes da UPA são na sua maioria Bakongos” (Cf. “Le Monde” de 15 de Março de 1962). Mas os testemunhos mais autorizados e menos suspeitos sobre o carácter tribal ou regional da UPA vêm dos seus dirigentes, André CASSINDA e Marcos KASSANGA. Este último declarou, na sua conferência de imprensa de 3 de Março de 1962, em Léopoldville: “A luta armada desencadeada no Norte de Angola é, sob todos os seus ­aspectos, uma verdadeira luta fratricida. Um número aproximado a 8.000 (oito mil) Angolanos foram selvaticamente massacrados por elementos tribalistas da UPA, estupidamente armados e indisciplinados ao extremo. Esse desumano massacre, efectuado por Angolanos contra Angolanos, nasce de um cego tribalismo que se apresenta em quatro aspectos: religioso, linguístico, étnico e ideológico. Tribalismo religioso porque todos devem ser protestantes; tribalismo linguístico porque todos devem falar a língua “Kikongo”; tribalismo étnico porque todos devem descender de S. Salvador; tribalismo de ideologia política porque todos devem defender os interesses de Holden.” André CASSINDA, Secretário-Geral da LGTA, na sua conferência de imprensa de 16 de Março de 1962 em Léopoldville, revelava, por seu lado: “Apesar dos estatutos serem bem explícitos, o antigo Bureau Executivo, constituído inteiramente por políticos da União das Populações de Angola, impedia a entrada na nossa Central Sindical a todos os trabalhadores angolanos que não fossem membros da UPA. Por essa razão, milhares de trabalhadores angolanos foram rejeitados ou não foram admitidos no seio do sindicato pelo simples facto de não serem da UPA – S. Salvador”. No entanto S. Salvador é apenas uma das onze circunscrições do distrito do Congo angolano, o qual só representa um dos treze distritos de Angola. No que diz respeito ao PDA, trata-se da ex-ALIAZO (Aliança dos Originários do Zombo). Ora, os Estatutos da Aliança dos Originários do Zombo, redigidos em Léopoldville a 1 de Agosto de 1960, declaram o seguinte: “DENOMINAÇÃO: Artigo I – Na sequência do voto expresso pela grande maioria do povo, a anterior Associação Mutualista dos Originários do Zombo, então conhecida sob o nome de “ASSOMIZO” transforma-se, neste primeiro dia do mês de Agosto de mil nove centos e sessenta, numa Aliança dos Originários do Zombo – “ALIAZO”. OBJECTIVO: Artigo II – A Aliança dos Originários do Zombo – “ALIAZO”, movimento sem fim lucrativo, tem por objectivo reagrupar, num espírito de entendimento e de solidariedade, todos os originários do Zombo, com vista a salvaguardar os seus interesses comuns, e apoiando solidamente a unidade africana. ADMISSÃO: Artigo XVI – Em princípio, todo o originário do Zombo é, por direito, membro da Aliazo. Artigo XVII – No entanto, outras pessoas não originárias do Zombo podem ser admitidas como membros simpatizantes ou de apoio se elas expressarem esse desejo”. No “Programa Preliminar da ALIAZO antes da independência de Angola” pode ler-se: “Por consequência, para além das considerações de território, a ALIAZO ­dedicar-se-á a fazer compreender que de MBATA ao Uíge, apenas existe um povo, o povo MUZOMBO. Com efeito, na história do antigo Reino do Congo, de que todos descendemos, não se fala de Maquelenses, Kibokolenses, Dambenses, os de Sanzapombo, etc..., apenas se fala, em bloco, de BAZOMBOS, naquilo que nos diz respeito. Portanto, abaixo o regionalismo! Abaixo as rivalidades e as disputas estéreis! Abaixo as divisões dos colonialistas portugueses que nos dividem para melhor nos dominar! UNAMO-NOS, COMPATRIOTAS BAZOMBOS!” Esses trechos, apesar de fazerem às vezes referência a uma grande entidade africana ou denunciarem disputas entre os Zombos, testemunham de facto uma estreiteza de visão política visando criar um espírito micro-nacionalista dos originários do Zombo. Prova disso é que, em 1962, em contradição com os seus estatutos, os dirigentes da ALIAZO começaram a livrar-se da designação “Aliança dos Originários do Zombo” preferindo uma outra, “Aliança Angolana dos Originários do Zombo” (Cf. O artigo “As possibilidades da formação de uma Frente comum angolana”, publicado no “Courrier d’Afrique” de 3-4 de Fevereiro de 1962, pelo Vice-Presidente Geral da ALIAZO, A. MATUMONA). Não se pode afirmar que as mudanças de nome de “Aliança dos Originários do Zombo” para “Aliança Angolana dos Originários do Zombo” e desta para “Partido Democrata de Angola” tenham sido determinadas por um alargamento, no interior de Angola, da influência regional da ex-ALIAZO. Com efeito, muito depois da ALIAZO se ter tornado PDA, o Vice-Presidente Geral desse partido, A. MATUMONA, ainda afirmava no “Courrier d’Afrique” de 5 de Fevereiro de 1962: “Como se sabe, das organizações políticas angolanas nominalmente nacionais, a ALIAZO é, se se quiser, um partido localizado ou tribal. Os seus estatutos preconizam­ para as próximas estruturas de Angola, estruturas rigidamente ­federais, uma descentralização forte e efectiva do poder. Uma Angola unitária para os dirigentes da ALIAZO é uma utopia, é uma aberração.” O MPLA não pretende fazer nenhum juízo de valor sobre as organizações ­angolanas com carácter tribal ou regional – carácter confessado ou não dessas organizações. Mas o MPLA está convencido que é impossível afirmar e provar que a UPA e o PDA (ex-ALIAZO) sejam organizações verdadeiramente nacionais, possuindo uma influência que alastre à totalidade do território e que se exerça sobre o conjunto das populações de Angola. Na realidade, a UPA e a ex-ALIAZO são organizações com uma influência muito limitada em Angola, tanto do ponto de vista demográfico como geográfico. III – Sobre a frente UPA-PDA criada a 27 de Março de 1962 As consequências prejudiciais para o futuro de Angola que dizem respeito à formação eventual de uma Frente entre a UPA e o PDA, tinham sido antecipadamente previstas e denunciadas publicamente. Com efeito, o Sr. MATUMONA, Vice-Presidente Geral do PDA advertia já, num artigo publicado no “Courrier d’Afrique”, datado de 5 de Fevereiro de 1962: “Sem dúvida por razões de oposição, a UPA não quereria se aliar à ALIAZO. Mas os observadores bem atentos do problema angolano vêem nessa eventual coligação UPA-ALIAZO, a formação de uma “força-Norte” contra a “força-Sul” encarnada pelo MPLA. Uma vez essa coligação realizada, a UPA empreenderia então a conquista de todo o país e imporia a sua lei.” Pelo que acima se pode ler, está-se no direito de concluir que, antes de mais, a Frente UPA-PDA criada apressadamente a 27 de Março de 1962, constitui uma ­tentativa de consagrar a divisão do nacionalismo angolano e contém os germes de conflitos secessionistas no contexto da luta do povo angolano. Uma tal Frente não poderia representar a Nação Angolana nem arrogar-se o direito de a representar. Apesar da boa vontade e das acções concretas efectuadas pelo MPLA durante vários anos a favor da constituição de uma Frente realmente representativa, a UPA e o PDA criaram a “sua Frente” sem antes informar o MPLA e sem o ter levado a participar nas negociações para a sua formação, já que a 5 de Fevereiro de 1962, o Vice-Presidente do PDA afirmava no jornal acima citado: “Quanto ao MPLA, ele defende firmemente a unidade de todo o território angolano. É esse aliás o seu programa. E se bem que animado de um desejo real de não entravar a criação urgente de uma Frente angolana de libertação que agrupasse numa ampla união todos os partidos políticos, todas as organizações, todas as forças angolanas e todas as organizações religiosas e sindicais, segundo a opinião dos observadores, nunca passará pela ideia dos dirigentes do MPLA, ceder nesse ponto.” Portanto, sem querer pôr excessivamente o acento na discriminação deliberadamente consciente dos promotores da Frente UPA-PDA em relação ao MPLA, chamamos a atenção de todos os responsáveis africanos para a falta de honestidade política de que dão prova os dirigentes da UPA e do PDA face ao destino de Angola. Um tal maquiavelismo não teria outro objectivo senão o pretexto procurado para a criação de um pretenso “Governo Provisório”. Entre a data da criação da pretensa Frente de Libertação de Angola – 27 de Março de 1962 – e a da proclamação em Léopoldville de um pretenso Governo Provisório – 5 de Abril de 1962 – apenas passaram 9 dias. Relembrar esse facto permite as seguintes conclusões: a) Dadas as fracas possibilidades materiais e sobretudo organizacionais de todos os partidos e movimentos nacionalistas angolanos, é impossível pretender afirmar que a Frente UPA-PDA tenha podido atingir uma fracção considerável do povo angolano e expressar as suas aspirações. Tal manobra antes deixaria entrever da parte dos seus promotores, uma fuga às verdadeiras responsabilidades políticas em proveito de uma busca de honrarias. A hora actual exigiria sobretudo a busca de unidade de acção das forças nacionalistas, o reforço e o aperfeiçoamento dos nossos métodos e meios de luta nacional. b) Entre 27 de Março de 1962 e 5 de Abril de 1962, a Frente UPA-PDA, que não foi criada no interior de Angola e que não pôde penetrar no país, nunca teve órgãos representativos em território angolano. Por conseguinte, essa Frente nunca constituiu uma realidade viva e actuante no interior de Angola. Entre 27 de Março e 5 de Abril de 1962, não houve qualquer indicação a partir da qual se possa concluir que o povo angolano tenha aceite a constituição dessa Frente. Dado o carácter discriminatório e não democrático que presidiu à formação da Frente, esta não pode pretender representar o povo angolano no seu conjunto. c) Não responde às aspirações legítimas de uma ampla e indiferenciada união do povo angolano. Não apresenta de modo algum tendência para identificar-se com a nossa Nação. Parece então ficar claro que a Frente UPA-PDA não tem uma consistência real e não possui finalidade política, nem progressista nem nacional. A sua existência é pouco conhecida do povo angolano e nunca recebeu o apoio consciente das massas. Por conseguinte, a Frente UPA-PDA constitui, ao que parece, uma simples manobra de diversão mascarando mal o estrangulamento da UPA e a sua pressa em se “reabilitar” no estrangeiro com a criação de um pretenso “Governo Provisório”. IV – A Frente UPA-PDA não é uma Frente nacional nem uma Frente das forças combatentes do nacionalismo angolano A Frente UPA-PDA não é uma Frente nacional; dada a deliberada exclusão pronunciada­ contra o MPLA, ela também não representa as forças combatentes do nacionalismo angolano. O MPLA foi a primeira organização política angolana a lançar ao povo angolano a palavra de ordem “Acção directa” contra o colonialismo português, durante uma conferência­ de imprensa dada no dia 6 de Dezembro de 1960 na Câmara dos Comuns em Londres, sob os auspícios do “Movement for Colonial Freedom”. Foi o MPLA que desencadeou a insurreição armada em Angola nos dias 4, 5 e 6 de Fevereiro de 1961. Estes dois acontecimentos, que marcam a primeira ruptura irreversível do nacionalismo angolano com as ilusões reformistas alimentadas até então por outras ­organizações nacionalistas­­ angolanas confirmaram a maturidade política do povo angolano e colocaram o MPLA, inequivocamente, à cabeça do movimento revolucionário em Angola. Que o MPLA foi a primeira organização nacionalista a desenvolver no interior do país uma intensa actividade política para as massas, é provado pelo facto de representar a formação política mais atingida, em todos os escalões da sua organização, pela repressão colonial. A maior parte dos quadros nacionalistas que se encontram nas prisões portuguesas pertencem ao MPLA. A insurreição armada desencadeada no mês de Fevereiro alastrou sucessivamente de Luanda para os distritos de Cuanza Norte, Malange e Congo. A preocupação manifestada por uma certa imprensa ocidental que separou, de um lado a luta armada nas regiões de Luanda, Cazengo e Malange e de outro a que é levada a cabo no distrito do Congo, apresentando-as como não estando relacionadas, constitui uma prova de ingerência estrangeira que procura dividir e opor as forças nacionalistas angolanas entre si. Essa imprensa desenvolveu uma propaganda exagerada tendente a fazer da UPA a promotora da luta armada iniciada na segunda semana do mês de Março de 1961 no distrito do Congo. No entanto, numa entrevista dada pelo Presidente da UPA, o Sr. Holden ROBERTO, ao “New York Times”, pode ler-se: O líder do movimento africano para a independência de Angola deplorou ontem a extrema violência dos africanos para com os colonos portugueses no Norte de Angola – província de S. Salvador. O Sr. HOLDEN disse que alguns membros da sua organização estiveram implicados nesses ataques mas negou que agissem sob as ordens do seu partido. Ele disse que os atacantes eram trabalhadores contratados rebelando-se contra o trabalho forçado. Sou um revolucionário – ­declarou – apenas porque um cristão que fica silencioso diante de um crime torna-se cúmplice desse crime. (Cf. “New [incompleto no original]). Esse testemunho do Sr. Holden ROBERTO, assim como o de milhares de Angolanos refugiados no Congo depois do mês de Março de 1961, nega portanto de forma ­irrefutável que a UPA tenha preparado o desencadear da luta armada no Norte de Angola. O MPLA possui cerca de 50.000 militantes com cartão e vários milhares de outros militantes, que por razões evidentes devidas ao trabalho na clandestinidade política, não possuem cartões. A forma de adesão do MPLA dá a esse Movimento um carácter e uma vocação nacionais. “ADESÃO: Artigo V – Podem ser membros do MPLA todos os Africanos de Angola que aprovem o programa e os estatutos e que se comprometam a executar, pela sua prática diária, a política do MPLA.” Pelo espírito e a letra do artigo V dos estatutos acima citados, o MPLA não pretende ter a veleidade de se transformar num Partido único de Angola, de criar e alimentar rivalidades entre as outras organizações políticas angolanas. Milhares de militantes do MPLA lutam ao lado do povo em todas as regiões onde se manifesta a guerra contra o colonialismo português. Mais que um Partido, o MPLA é um Movimento. Mas não pode ser definido como um Movimento ideológico, de classe, regional ou tribal. O seu programa sugere para a Angola livre e independente de amanhã, a necessidade de garantir o exercício das liberdades e dos direitos definidos pela Declaração Universal dos Direitos do Homem, o respeito pela propriedade privada, a coexistência de todas as classes sociais angolanas com base na justiça social, um Estado com uma estrutura e um funcionamento democrático, um governo de coligação nacional que respeite o princípio da Carta das Nações Unidas e pratique uma política externa de coexistência pacífica. O MPLA é um Movimento nacional chamado a representar, pelo leque e ­composição real dos seus membros, a universalidade da Nação Angolana. Ele quer-se um Movimento democrático por definição, pelos métodos que utiliza e pelos objectivos que se propõe atingir. Um Movimento que constrói a sua doutrina com base na experiência e no pensamento criador dos seus militantes e dirigentes assim como com base na ­experiência da luta anti-colonialista de todos os povos africanos. As incessantes diligências a favor da constituição de uma Frente de Libertação e o papel que jogou na convocação e na realização da Conferência das Organizações Nacionalistas das Colónias Portuguesas – verdadeira Frente de luta unida de que é um dos inspiradores e fundadores, é prova suficiente que o MPLA é um combatente pela Unidade angolana e pela unidade africana. O MPLA é membro da Conferência dos Povos Africanos (o seu Presidente pertence ao Comité Director) assim como da Conferência de Solidariedade dos Povos Afro-Asiáticos. O acolhimento oficial e fraterno que os dirigentes do MPLA encontram junto dos Chefes de Estado africanos e as mensagens dirigidas ao MPLA pelos Chefes de Estado da Ásia e da África e por várias organizações internacionais, já projectaram a acção do MPLA no plano internacional. O MPLA é a primeira organização nacionalista angolana a ter resolvido concreta­mente o problema da formação de quadros militares, políticos e técnicos com vista a elevar o nível da luta do povo angolano e assegurar o sucesso da independência de Angola. É a única formação política angolana a ter criado, na República do Congo (Léopoldville) uma organização de assistência aos refugiados angolanos – o CVAAR – (Corpo Voluntário [Angolano] de Assistência aos Refugiados) – cujo campo de acção e a eficácia já não têm de ser demonstrados. Todos estes factos sublinham o espírito e o sentido das responsabilidades de que dão provas os dirigentes do MPLA. Através do seu jornal “Unidade Angolana” editado em Léopoldville em duas línguas nacionais (Kimbundo e Kikongo) e duas línguas estrangeiras (Português e Francês), o MPLA empenha-se em criar dentro e fora de Angola uma larga opinião pública que manifeste um apoio à organização e por consequência à luta do povo angolano. É óbvio que a Frente UPA-PDA, usando medidas de exclusão contra o MPLA não poderia ser considerada como uma Frente das forças combatentes de Angola. A exclusão deliberada do MPLA dessa Frente prejudica a capacidade de organização e de acção do nacionalismo angolano. V – Sobre o pretenso “Governo Provisório da República de Angola” 1 – Bastaria ter provado que a Frente UPA-PDA foi uma criação artificial para que estivesse implicitamente demonstrado que o “Governo Provisório” é uma impostura. Por respeito ao povo angolano e por respeito ao direito dos povos oprimidos, esse pretenso “Governo Provisório” não deveria ser reconhecido por nenhum Estado e particularmente por nenhum Estado africano. 2 – Lembremos apenas que treze meses separaram a data da proclamação do Governo Provisório da República Argelina da data em que o Conselho ­Nacional da Revolução Argelina decidiu o princípio da sua constituição; assim como o Conselho Nacional da Revolução Argelina e o Comité de Coordenação e de Execução foram criados dois anos depois da FLN ter conquistado um vasto apoio popular e se ter imposto como um verdadeiro partido-nação. Sem pretender inferir daí que a revolução angolana deveria ter copiado o modelo argelino, não se pode comparar a seriedade das decisões dos dirigentes da revolução argelina com a falta de escrúpulos e a irresponsabilidade dos promotores do pretenso “Governo Provisório da República de Angola”. Sendo evidente que a Frente UPA-PDA foi um simples pretexto para a criação do pretenso “Governo Provisório da República de Angola”, nada prova que a UPA ou o PDA ou a Frente UPA-PDA sejam um partido-nação. A UPA e o PDA foram criados no exterior de Angola, na República do Congo (Léopoldville) e a sua penetração no Norte de Angola é recente, relativamente fraca e regista mesmo um recuo. Para além do carácter tribal ou regional dessas duas organizações, é preciso lembrar que a UPA nunca deu a conhecer ao povo angolano os seus estatutos e que praticou o princípio da clientela seleccionada numa base étnica, regional, religiosa e linguística. Por várias vezes, a direcção da UPA manifestou a sua oposição em juntar todas as famílias ideológicas, étnicas e sociais da nação angolana. O Sr. Colin LEGUM, jornalista inglês, bom conhecedor das questões africanas e que está longe de nutrir simpatia pelo MPLA – afirmou num artigo recente no “Observer”: “O MPLA é geralmente considerado como um Movimento de esquerda revolucionário (é denunciado como comunista por Holden). A UPA é considerada como um Movimento nacionalista; é de conhecimento público que a UPA recebe apoio e fundos dos EUA” (Cf. Artigo “Angola rebels turn guns on one another” no “The Observer” – 18 de Março de 1962). Na revista “Time Magazine” também se pode ler: “O líder rebelde Holden ROBERTO insistiu no facto de a sua UPA não ter sido ajudada pelo Ghana e declara desprezar o Presidente Nkrumah considerado por ele como demasiado à esquerda. Mas o Ghana e a Guiné encorajaram um grupo rival dominado por comunistas e chamado MPLA.” (Cf. “Time Magazine” de 19 de Maio de 1961). Reagindo à Conferência de imprensa do Chefe de Estado-Maior da UPA, Marcos KASSANGA, o vice-presidente dessa organização, num Comunicado de 3 de Março de 1962 ousou chamar aos responsáveis do MPLA “Burgueses sem pátria”. Esse Comunicado mereceu do Vice-Presidente da ALIAZO a seguinte observação: “Para evitar dizer mais, esse comunicado revela o espírito dos dirigentes da UPA e a sua intenção de excluir por todos os meios a oposição – se ela existir – e de assegurar para si a supremacia da luta do povo angolano...” (Cf. “Le Courrier d’Afrique” de 10/11 de Março de 1962). A direcção actual da UPA, cujos nomes foram tornados públicos a 13 de Novembro de 1961 (V. “Le Courrier d’Afrique” dessa data), não foi designada por um órgão institu­cional, mesmo de carácter revolucionário. Que nos seja ainda permitido reproduzir esta passagem da conferência de imprensa de Marcos KASSANGA, a propósito dos métodos de trabalho no seio da UPA: “Holden, desconfiando das actividades do comandante Batista, que eram as da verdadeira causa nacional, designou-se comandante-em-chefe no decurso de uma conferência de imprensa que teve lugar dia 7 de Junho de 1961 em Léopoldville, sem o consentimento nem o apoio das personalidades que constituiam o Estado-Maior do Exército de Libertação Nacional de Angola”. Vemos portanto que a UPA não pode ser considerada uma instituição democrática. Fica demonstrado por um lado o carácter artificial da Frente que está na origem do pretenso “Governo Provisório da República de Angola”. Fica também claro por outro lado, que nem o PDA nem a UPA são um partido-nação susceptível de transferir uma qualquer representatividade para o pretenso “Governo” em causa. 3 – Retenhamos esta acusação do Chefe de Estado-Maior da UPA: “Perseguindo a denúncia da luta fratricida, confirmamos, para além dos 8.000 Angolanos massacrados sob as ordens de Holden Roberto, o assassinato do comandante Ferreira e da sua coluna de 21 elementos enviados para o interior do país pelo Movimento Popular de Libertação de Angola, MPLA, a fim de reforçar a luta pela libertação de Angola” (Cf. “L’Essor” de 19 de Março de 1962 – Bamako). Com base nesta acusação e em inúmeros testemunhos escritos ou orais fornecidos por refugiados angolanos na República do Congo (Léopoldville), temos o direito de concluir que a UPA se afastou há muito tempo da luta contra o inimigo – o colonia­lismo português – para se consagrar à sabotagem do reforço da luta armada assim como ao assassinato, nos campos de batalha, de quadros militares e políticos das outras organizações e até da sua própria organização. Sobre a direcção da UPA pesa a grave acusação pública de ser um grupo contra-revolucionário, acusação que por si só basta para negar a validade da Frente UPA-PDA e ainda mais a do pretenso “Governo Provisório da República de Angola”. 4 – O pretenso “Governo Provisório da República de Angola” não é um governo ­refugiado da Angola combatente porque foi criado e proclamado em Léopoldville – ­República do Congo. Ainda menos poderia ser considerado como um Governo no exílio. 5 – O povo angolano, porque tem direito à sua independência pela qual luta o MPLA até à vitória final, tem o direito de se organizar em Estado. Mas esse direito pertence exclusivamente a ele. O Estado angolano não pode ser uma parte da sociedade angolana, mas sim a própria sociedade angolana organizada para fins de direito. É o povo angolano que deve dar a si próprio, de forma plausível, uma organização jurídica, um Estado e um Governo. O MPLA exclui, desde já, o argumento que o pretenso Governo tenha sido eleito pelo povo (pelo simples facto que não é possível haver eleições em Angola). No entanto, o MPLA insiste em que a atitude do povo angolano face aos indivíduos que se ­atribuíram pastas nesse pretenso governo, não permitiria concluir que se está diante de um caso de investidura plausível, pois não está marcada pela passividade ou pela aceitação geral. É por isso que o MPLA afirma que o pretenso “Governo Provisório da República Angolana” não tem representatividade, não pode representar a nação Angolana e não é depositário nem de jure nem de facto da soberania nacional. 6 – Se o direito deve seguir os factos, e se os factos não demonstram com validade que o pretenso “Governo Provisório da República de Angola” é uma emanação da vontade popular, se a Frente UPA-PDA nunca dirigiu a vida política do povo angolano, é evidente que o pretenso “Governo Provisório da República de Angola” não é objecto da vontade e da colaboração do povo angolano por um lado, e por outro não possui qualquer direito de impor um poder de coerção ao povo angolano. Mas mesmo que o pretenso “Governo Provisório da República de Angola” quisesse e visasse esse fim, a UPA, o PDA ou a Frente UPA-PDA não possuem, em território angolano, os instrumentos de coerção necessários para o sucesso de tal experiência. 7 – Qualquer observador imparcial que for à República do Congo (Léopoldville) constatará que a influência exercida pela UPA e pelo PDA sobre os refugiados ­angolanos é de longe ultrapassada pela que é exercida pelo MPLA. O Sr. KASSANGA afirma o seguinte: “Holden ROBERTO pratica uma política de intimidação no seio dos Angolanos exilados na República do Congo (Léopoldville), afirmando ter grandes influências entre as personalidades eminentes do Governo que, segundo ele, dão total apoio à sua política e que as autoridades administrativas locais lhe tinham confiado a gestão dos assuntos dos refugiados angolanos no Congo” (Cf. “L’Essor” de 19 de Março de 1962). 8 – A UPA, o PDA e a Frente UPA-PDA não possuem, no interior de Angola, nenhuma instituição administrativa, judicial ou militar que permita exercer efectivamente um controlo sobre uma parte do território nacional angolano. Se a luta heróica do povo angolano levada a cabo por militantes de diversas organizações, entre as quais algumas ainda são desconhecidas no exterior, conseguiu libertar da influência da administração portuguesa regiões cujos limites variam durante a guerra em curso, isso não significa no entanto que a UPA ou o PDA tenham instaurado, mantido e dirigido nessas regiões uma nova organização político-administrativa. Aliás, as revelações feitas pelo Chefe de Estado-Maior da UPA na conferência de imprensa já acima citada, não deixam nenhuma dúvida a esse respeito. Consequentemente, o pretenso “Governo Provisório da República de Angola” não exerce qualquer autoridade territorial. 9 – Por fim, perante as graves acusações públicas, algumas das quais transcritas no presente Memorando, sobre as estreitas ligações dos dirigentes da UPA (­nomeadamente o seu Presidente que também é o “Primeiro-Ministro” do pretenso “Governo ­Provisório da República de Angola”) com interesses estrangeiros a África, tudo leva a crer que o pretenso “Governo Provisório da República de Angola” não poderá determinar, decidir ou levar a cabo uma acção política por si próprio. O passado civil e político de alguns dos membros desse pretenso “Governo Provisório da República de Angola” não garante nada que possa identificar-se com a personalidade, a vontade ou as actividades reflectidas pelas aspirações de um autêntico governo angolano. É certo que a formação do pretenso “Governo Provisório da República de Angola” vai consagrar antigos factores de divisão do povo angolano, introduzir e alimentar novos elementos de divisão. As aspirações do povo angolano à liberdade e os sacrifícios por ele consentidos para se libertar da dominação estrangeira também foram traídos. A personalidade e a liberdade de África estão igualmente diminuídas por esta alienação intrínseca do pretenso “Governo Provisório da República de Angola” a interesses estrangeiros. É por isso que o MPLA nega absolutamente toda a legitimidade ao pretenso “Governo Provisório da República de Angola” porque o processo da sua formação lhe conferiu uma natureza que o impedirá de se conformar com a vontade do povo e de reflectir essa vontade nos seus actos. Antes pelo contrário, é um “Governo” condenado a ser desacreditado, desacreditando igualmente os governos que poderiam eventualmente reconhecê-lo. É óbvio que o prestígio da luta heróica do povo angolano também [é] abalado pela existência do pretendo “Governo Provisório”. CONCLUSÃO O inimigo irreconciliável do MPLA é o colonialismo português. O objectivo da luta incessante do MPLA é a independência de Angola, através de uma revolução que destrua o regime colonial. O MPLA afirma que a condição essencial, não só para a vitória da revolução e da consolidação da futura independência de Angola, mas também para a realização completa da unidade africana, reside na unidade do povo e de todas as forças combatentes do nacionalismo angolano. O MPLA denuncia a Frente UPA-PDA e o pretenso “Governo Provisório da ­República de Angola” não tanto por constituírem uma manobra de diversão mas sobretudo porque prejudicam a unidade do povo e a integridade combatente do nacionalismo angolano. O MPLA considera que o respeito pela unidade do povo e pela unidade do nacionalismo em luta contra o colonialismo, assim como o respeito pela soberania popular e pelas condições que garantam a consolidação da independência nacional, são elementos constantes da moral, do direito e dos valores dos povos coloniais. O MPLA considera que a necessidade de um governo está inscrita no processo real do Movimento de libertação do povo angolano. Mas o MPLA acredita que a autenti­cidade e a legitimidade de um tal Governo deverão decorrer por um lado, de uma ­investidura concedida por todo o povo angolano sem discriminação e, por outro lado, de uma garantia de representatividade da Nação. Por outras palavras, um verdadeiro Governo deverá traduzir a sua vocação universal em fazer da libertação de Angola a obra de todos os Angolanos e não de uma fracção do povo, seja qual for a sua importância. A Nação Angolana merece um Governo nascido da vontade popular, o qual, pelo processo da sua formação, possa oferecer garantias de se pôr ao serviço de toda a Nação. A revolução angolana que quer conquistar a independência de Angola para instaurar um regime democrático que garanta a igualdade, sem discriminação de qualquer espécie, de todos os cidadãos da pátria, não se deve traduzir numa guerra civil, secessionista ou ideológica. A Frente UPA-PDA e o pretenso “Governo Provisório” que dela deriva, sendo por natureza anti-unitários, discriminatórios e arbitrários, apenas consagram a divisão do nacionalismo angolano e desenvolvem a luta fratricida já instaurada em Angola pela UPA. O MPLA lutará em qualquer circunstância contra a divisão do nacionalismo angolano. É por isso que o MPLA se permite alertar o Governo de ­­­­­­­­­________________ contra as graves consequências que resultariam de um eventual reconhecimento do pretenso “Governo Provisório da República de Angola”. Léopoldville, 15 de Abril de 1962 [carimbo do CD do MPLA] O COMITÉ DIRECTOR DO MOVIMENTO POPULAR DE LIBERTAÇÃO DE ANGOLA

Memorando do MPLA aos governos africanos sobre o GRAE (Léopoldville)

A publicação, total ou parcial, deste documento exige prévia autorização da entidade detentora.