Relatório sobre a situação em Angola

Cota
0027.000.038
Tipologia
Relatório
Impressão
Dactilografado
Suporte
Papel comum
Autor
MPLA - Movimento Popular de Libertação de Angola
Data
Idioma
Conservação
Mau
Imagens
5
Observações

Foi publicado no 2º volume de «Um amplo movimento…»

Acesso
Público

 RELATÓRIO SOBRE A SITUAÇÃO EM ANGOLA Na noite de 14 de Março de 1961, a UPA (União das Populações de Angola) lançou as palavras de ordem de ataque às plantações dos colonos. Esta acção está na base do desencadear da luta armada em Angola. Os factores que contribuíram para a presença da UPA na luta armada são: a) O facto da UPA ter sido organizada no Congo ex-belga por originários angolanos nascidos no distrito do Congo (em Angola). b) As facilidades concedidas pelas autoridades congolesas para a sua circulação no país, o que lhe permitiu contactar as populações do distrito do Congo, onde a UPA pôde desenvolver uma campanha de propaganda e agitação política. c) O apoio directo da República da Tunísia em armas e munições; informações de certos meios da FLN permitem-nos tirar a seguinte conclusão: a República da Tunísia forneceu à UPA cerca de 1.500 armas (espingardas, metralhadoras e pistolas e as ­respectivas munições). d) Condições psicológicas favoráveis por parte das massas angolanas para passar à luta armada, por causa do tipo esclavagista do colonialismo português, da ­actividade política do MPLA que tinha desenvolvido a propaganda e a agitação política no ­interior e no exterior, dos ataques às cadeias civis de Luanda desencadeados por ­militantes do MPLA e finalmente da influência do movimento de libertação do continente africano. e) O apoio diplomático e material dos Estados Unidos da América que utilizam missionários protestantes como instrumentos de influência junto dos dirigentes da UPA. (A maior parte dos dirigentes da UPA foi educada por missionários protestantes americanos que actuaram em Angola e no Congo ex-belga). DESENVOLVIMENTO DA LUTA O desenvolvimento da luta permitiu o estabelecimento de duas zonas de influência militar em Angola. a) Distrito do Congo (Superfície: 92.570km2; População total: 400.153 hab.; População negra: 398.037 hab.). A iniciativa das operações militares nesta zona pertence à UPA. Desde o início da acção armada, os seus grupos de guerrilha puderam utilizar armamento clássico eficaz, o que lhes permitiu atacar com êxito várias aldeias do distrito do Congo, infligindo perdas consideráveis ao inimigo do ponto de vista militar e económico. O aspecto negativo da luta armada da UPA foi a eliminação física de angolanos pertencentes a outras tribos e a outros partidos políticos, assim como de mestiços. b) Distritos de Luanda, Cuanza-Norte e Malange (Superfície total: 180.670 Km2; População total: 959.907 hab.; População negra – 918.165.) A iniciativa das operações militares nesta zona pertence ao MPLA. Os militantes que nesta zona se ocupavam da propaganda e da agitação política puderam organizar, desde o início da luta armada (15 de Março de 1961), vários pelotões de guerrilheiros totalizando, para os três distritos, cerca de 5000 homens assim distribuídos: Distrito do Cuanza-Norte – cerca de 2.000 homens; Distrito de Luanda – cerca de 2.000 homens; Distrito de Malange – cerca de 700; Distrito do Congo – cerca de 300 homens. Os nossos grupos de guerrilha iniciaram os combates com armas rudimentares (catanas, enxadas, facas, paus e armas de fogo nativas) e só a partir dos primeiros combates puderam obter algum armamento recuperado às unidades militares portuguesas. Apesar da carência em armamento, os nossos grupos de guerrilha tiveram um êxito considerável nos combates contra os portugueses. A sua actividade militar pode resumir-se da seguinte forma: Distrito de Luanda: ataques a NAMBUANGONGO, CAXITO, ÚCUA, FUNDA, CAMBAMBE. Balanço – ocupação total de Nambuangongo e do Úcua pelos grupos de guerrilha por um período de 5 meses e a sua transformação em bases de resistência; nos outros locais citados, as nossas forças infligiram ao inimigo pesadas perdas militares e económicas e forçaram as populações civis portuguesas a abandonar as suas propriedades e a procurar refúgio em Luanda (capital). Distrito do Cuanza-Norte: ataques a QUITEXE, QUIBAXE, LUCALA, NOVA-CAIPEMBA e CAMABATELA. Balanço – ocupação de Quibaxe por um período de 5 meses e estabelecimento de uma base de resistência; nos outros locais foram ­infligidas também pesadas perdas ao inimigo, tanto militares como económicas, com o ­consequente abandono das propriedades pela população portuguesa. Distrito de Malange: os nossos grupos de guerrilha, partindo das bases de ­resistência instaladas na floresta, atacaram várias plantações de café e de algodão situadas na Baixa de Cassange e obtiveram grandes sucessos. É preciso salientar que os nossos grupos de guerrilha puderam instalar bases de resistência em Tomboco e em 31 de Janeiro, no Distrito do Congo. As massas populares colaboraram activamente com os guerrilheiros, quer seja em actividades de sabotagem, liquidando soldados inimigos, ou abastecendo e informando os guerrilheiros. Depois do mês de Agosto de 1961, a luta em Angola toma aspectos diferentes. Os portugueses desencadearam então uma grande ofensiva contra os patriotas angolanos. Utilizaram, nessas operações, cerca de 40.000 soldados, equipados com armas modernas e bem protegidos pela aviação. Depois de violentos combates durante dois meses, onde o inimigo teve sempre uma grande superioridade em armas, os patriotas perderam todas as posições ocupadas e foram obrigados a refugiar-se nas matas onde ainda se encontram cercados pelas tropas portuguesas. A população civil africana também se refugiou nas matas, com a excepção da população do distrito do Congo que se refugiou na sua maior parte na República do Congo (ex-belga). No final do mês de Setembro, o Departamento de Defesa do MPLA reuniu-se em Brazzaville e em Léopoldville com dois dos seus comandantes (Comandante Ferreira e Comandante Benedito) que tinham saído do teatro das operações para informar os quadros dirigentes do MPLA sobre a situação militar em Angola. Decidiu-se que o Comandante Ferreira deveria voltar a Angola com algumas armas e munições compradas em Brazzaville, com panfletos de propaganda política e um plano estratégico para fazer face à situação militar actual. Estava acompanhado de 21 guerrilheiros que constituíam um pelotão. A alguns dias do objectivo, ainda no distrito do Congo, grupos de guerrilha da UPA atrairam sobre o nosso pelotão para uma emboscada e conseguiram aprisionar os nossos guerrilheiros. Sabemos hoje que o comandante Ferreira e o seu pelotão foram assassinados pelos partidários da UPA depois de terem sido submetidos a bárbaras sevícias. A nossa Representação de Léopoldville é muito frequentada por inúmeras ­delegações que chegam todos os dias de Angola, enviadas pelos nossos comandantes, que exigem um envio imediato de armas e de munições para poderem resistir aos ataques ­persistentes das patrulhas portuguesas que visam a liquidação total da resistência. Os nossos comandantes insistem na urgência do envio de armas e de munições porque se o reabastecimento não se faz com urgência serão obrigados a render-se às tropas portuguesas. Sabemos que os grupos de guerrilha da UPA estão na mesma situação. Portanto a situação é muito grave porque pode conduzir à liquidação total da nossa resistência armada. Também é preciso constatar que a situação actual desencadeou uma verdadeira “corrida ao armamento” da parte dos dois partidos porque a condição psicológica dos grupos de guerrilha e das massas populares é favorável à recepção do material de ­qualquer uma das duas organizações. Pensamos que se a UPA obtiver armas e munições antes de nós, pode alargar a sua influência nas zonas dominadas pelo MPLA e colocarse numa posição dominante na luta armada. A situação concreta é portanto a seguinte: 1 – Paralisação da luta armada nas zonas de guerrilha angolanas por falta de armas e munições. 2 – Possibilidade da UPA monopolizar a condução da luta armada, não hesitando mesmo em recorrer à luta fratricida para atingir os seus objectivos. 3 – “Corrida ao armamento” praticada pelas duas organizações. Somos de opinião que os nossos aliados naturais devem permitir ao MPLA uma superioridade militar total em relação à UPA, na medida em que actualmente a ­influência do MPLA é maioritária nos aspectos políticos e militares abaixo da fronteira sul do distrito do Congo e na medida em que existem possibilidades para o MPLA de alargar a sua influência militar e política no distrito do Congo. Conakry, 28 de Novembro de 1961 CONTINUAÇÃO DO RELATÓRIO1 I – Organização. O MPLA prossegue o seu trabalho político de formação de Comités de Acção tanto no interior de Angola como na República do Congo. O povo angolano está a reagir favoravelmente. Actualmente, o número de militantes do MPLA está na ordem dos 35.000. Foi criado em Léopoldville, pelo Comité Director do MPLA e ratificado por uma assembleia de militantes, o Conselho Político Nacional, formado por 25 membros. O Conselho Político Nacional tem por missão debater os problemas relacionados com a política interna e externa do Movimento. O Conselho é uma espécie de Assembleia Consultiva. A partir do início de Dezembro, o MPLA lança o seu órgão de combate: A UNIDADE ANGOLANA. Este jornal é editado em 4 línguas: Kimbundu, Kicongo, Português e Francês. Encaramos a possibilidade de o editar também em Umbundu e “Fiote” (língua vernacular do Enclave de Cabinda). Além disso, o movimento prepara a publicação de um boletim interno, órgão de formação política e ideológica dos nossos militantes. São organizadas conferências durante as quais dirigentes e militantes do MPLA fazem exposições sobre os problemas da construção da independência, o sentido do movimento revolucionário nos países recentemente libertados do colonialismo, as implicações e as consequências da atitude desses países no plano nacional e internacio­nal, exposições sobre o princípio do marxismo-leninismo. No domínio da assistência aos refugiados angolanos, o MPLA criou o CVAAR (Corpo Voluntário Angolano de Assistência aos Refugiados). As actividades do CVAAR já iniciaram em Léopoldville. Esta organização dispõe de um edifício composto de 3 salas e um salão anexo que funciona como Dispensário-Hospital. Os médicos dispõem de material indispensável para a observação dos doentes e de instrumentos para as intervenções de pequena cirurgia e assistência em ginecologia e obstetrícia. O MPLA está a encarar agora a possibilidade de construir um dispensário na região do Baixo-Congo, perto da fronteira de Angola, onde se encontram cerca de 160.000 refugiados angolanos. Pensamos que para o cumprimento das numerosas tarefas do CVAAR, a Cruz Vermelha da URSS poderia enviar para o porto de MATADI medicamentos, material médico, escolar e agrícola.

Relatório sobre a situação em Angola (Conakry). Está anexado ao documento 0027.000.037

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