Carta de Aníbal Melo a Viriato da Cruz

 Aníbal Melo Léopoldville Léopoldville, 18 de Julho, 1961 Caro Compatriota Viriato Cruz, Oportunamente, recebi a sua carta. Entregou-ma o nosso Matias Miguéis, com quem não tenho, infelizmente, podido encontrar-me, porque se ausentou para Ponta Negra. Não esqueci a amável oferta da sua ajuda e só a não utilizei ainda porque tenho ­remetido os meus projectos pessoais para mais tarde, se as circunstâncias o permitirem. Por agora, parece-me que não devo afastar a minha ajuda ao interesse da luta que todos nós sustentamos, mesmo sem perder a noção da extrema modéstia dessa ajuda. Pode ser, no entanto, quando menos o espere, que as circunstâncias me permitam certa liberdade. Passando ao assunto que a si me traz, põe-se-me uma questão de consciência que pretendo esclarecer, para tomar a atitude que se me afigure justa. Reina em Léopoldville uma atmosfera de viciosa agitação, que nem sempre facilita um julgamento honesto dos factos e que receio venha a trazer complicações para o futuro do nosso País. Neste ambiente surgiu agora um elemento novo de perturbação. Afirma-se que o meu Caro Compatriota se demitiu do cargo de Secretário que vinha desempenhando no seu Partido por um motivo que sinceramente me alarma: por uma questão racial e na qual a UPA teria grande quinhão de responsabilidade. Será possível? Compreenda; ultimamente tem-se enredado a UPA numa teia de acusações sem fundamento, mas esta, que lhe diz respeito, é de natureza bastante mais grave e é bom que se faça luz sobre ela. Na incerteza, não posso adiantar outra atitude que não seja esta de procurar conhecer a verdade junto de si, se não vê nisso inconveniente. Quererá o meu Amigo favorecer-me com uma resposta a tal respeito? O Belo, antes de partir, anunciou-me a sua próxima vinda. Será certo? Na esperança de uma resposta breve, creia-me ao seu dispor, Aníbal Melo [com assinatura]