Carta do MPLA a Jonas Savimbi

Cota
0018.000.054
Tipologia
Correspondência
Impressão
Dactilografado (2ª via)
Suporte
Papel comum
Remetente
MPLA - Movimento Popular de Libertação de Angola
Destinatário
Jonas Savimbi
Data
Idioma
Conservação
Bom
Imagens
4
Observações

Foi publicado no 1º volume de «Um amplo movimento…»

[incompleta]1 B.P.800 – Conakry – Guiné Ref. 203/18/61 Caro compatriota SAVIMBI, Recebemos e agradecemos a tua carta de 10 do corrente, bem assim como a cópia da que endereçaste à UPA. 1 – Não recebemos a tua carta de Janeiro em que nos informavas da presença de Holden na Suíça. 2 – Retivemos a tua sugestão de colaboração com a UPA. O MPLA nunca praticou uma política de isolamento. Mais: O MPLA é a única organização política angolana que já fez apelos escritos à unidade de todas as organizações patrióticas angolanas. Aquando da Conferência de Tunis (Janeiro de 1960) membros da nossa organização procuraram o Sr. Holden e propuseram-lhe colaboração. Mas o Sr. Holden, que apareceu em Túnis com amigos americanos e que se importava mais com distribuir a revista da «American Committee on Africa», do que com a unidade angolana, nunca manifestou um desejo sincero de colaboração. Pelo contrário: O Sr. Holden, não se sentindo mais sozinho na arena política, começou a desenvolver contra nós uma campanha de calúnias, acusando o MPLA, ora de uma organização comunista, ora de um instrumento do colonialismo português. Aliás, a colaboração (mais ainda: o Front) é uma exigência de princípio da política do MPLA. No nosso programa maior declaramos: «Luta em comum com todas as forças patrióticas angolanas, um amplo movimento de massas populares, a fim de que o povo angolano conquiste o poder...». No nosso programa mínimo tornamos a declarar: «Criação urgente de uma sólida Frente angolana de libertação, que agrupe numa larga união, todos os partidos políticos, todas as organizações populares, todas as forças armadas, todas as personalidades eminentes do país, todas as organizações religiosas, todas as nacionalidades ou etnias de Angola, todas as classes sociais africanas, todos os angolanos residentes no estrangeiro, sem distinção de tendências políticas, de condições de fortuna, de sexo, de idade... ». Poder-se-á falar mais claro quanto à política de unidade do MPLA? Poder-se-á exigir um Programa mais aberto à união? 3 – O MPLA não é uma organização comunista. A doutrina do MPLA não é o marxismo. A doutrina do MPLA é sempre o produto da discussão colectiva e do acordo colectivo dos organismos dirigentes e dos membros do MPLA em face dos problemas concretos de Angola. O MPLA não é igualmente uma organização que pratica, no seu seio, a intolerância ideológica. Exceptuando os que defendam o colonialismo e o fascismo, todos os angolanos de todas as outras tendências políticas, filosóficas ou religiosas podem ser membros do MPLA. Há no seio do MPLA, católicos, protestantes, fetichistas, indivíduos sem opção religiosa, democratas, democratas-cristãos, socialistas, simpatizantes das várias experiências políticas e sociais feitas neste ou naquele país, comunistas, etc. De acordo com os princípios do nosso tempo e com a Declaração Universal dos Direitos do Homem, nós consideramos direitos sagrados de cada pessoa: pensar livremente, ter opinião, ter ideias e convicções próprias. Nós pensamos que o reconhecimento a cada pessoa desses direitos não significa que cada pessoa angolana vá, amanhã, impor ao conjunto da população angolana as ideias que cada um defende. No respeitante às decisões supremas sobre os destinos de um povo, nós somos: – pela discussão livre e pacífica, de todos os cidadãos, sobre os problemas nacionais; – pelo pronunciamento de cada cidadão, sobre os problemas essenciais do país, através do sufrágio universal, igual, directo e secreto; – pela submissão da minoria à maioria nacional. Estamos convencidos que isto é democracia praticável e justa. Só assim se poderá preservar a união do povo angolano, só assim poderá reinar a paz entre todas as pessoas angolanas. A não ser que um Congresso do MPLA venha a decidir o contrário, nós estamos firmemente dispostos a seguir essa linha política, sem medo de qualquer potência estrangeira e sem abdicações que ofendam a nossa dignidade de combatentes pela independência do povo angolano. Nós estamos convencidos de que aqueles que, hoje, numa Angola ainda escravizada, não têm a coragem de lutar pela união do nosso povo na base do patriotismo e da tolerância ideológica; aqueles que, com medo da América ou das Missões, já praticam a intolerância e uma política de guerra fria entre angolanos; esses, amanhã, numa Angola liberta, semearão o terror inquisitorial em Angola e comportar-se-ão como donos do nosso povo e do nosso país. Mas não sejamos ingénuos. A África está cheia de lições. Atrás dessa atitude intolerante (que leva até a uma triste e bárbara guerra fratricida) costumam estar sempre os imperialistas. Vê o caso do Congo. Quem está atrás da tragédia congolesa? Quem é que explora, por ano, 70 quilos de rádio puro e vende o grama de rádio por 120 mil dollars? Quem é que tem interesse em manter posições no Congo? Quem explora os diamantes, o petróleo, o manganês, o ferro... de Angola? Quem é que terá interesse, amanhã, em manter as suas posições económicas em Angola? Quem são os países que terão interesse, amanhã, em investir em Angola? Como poderão, amanhã, esses interesses não-angolanos manter as suas posições económicas, a não ser por meio de Tchombés intolerantes e ambiciosos? 4 – Tens razão quando dizes que não há ajudas desinteressadas. Toda a ajuda é dada a uma determinada força em luta. Toda a ajuda inscreve-se, pois, numa luta determinada, associa-se intimamente a essa luta bem determinada. Por conseguinte, o que toda pessoa honesta e inteligente deve fazer é procurar responder a esta pergunta premente: Das forças que oferecem ajuda no plano internacional, quais são aquelas que estão dispostas a ajudar, consequentemente, a realização das aspirações das grandes massas populares do nosso país? Serão os banqueiros de Wall Street e da City? Serão, por exemplo, os camponeses chineses? Não se faz política só com desejos ou sonhos, nem com ânimos abatidos. A política só pode ser concretamente realizada com os factos e os homens reais que existem sobre a Terra. Nós não perfilhamos esse pessimismo dos que afirmam que o homem é um inimigo imutável de outro homem. O progresso humano, desenvolvendo-se embora aos zig-zags, desmente essa visão pessimista e nihilista da humanidade. É possível melhorar, progressivamente, a vida e as relações humanas. Se não acreditássemos nessa possibilidade, não estaríamos, hoje, a lutar por uma Angola onde o homem possa vir a ter mais pão, liberdade, cultura e viver pacífico e decente. Sendo assim, é nosso dever responder à pergunta: Sobre o plano internacional, quais são as forças que estão realmente interessadas na libertação das grandes massas oprimidas e exploradas de todos os países? 5 – O MPLA não teve nem tem a pretensão de ser a único partido angolano, nem rejeita a colaboração com todas as forças que lutam pela liberdade. O MPLA colabora com o Partido Africano da Independência da Guiné dita portuguesa, com a AIliance des Ressortissants de Zombo (partido angolano em Léo), com a Associação des Ressortissants de l'Enclave de Cabinda, com a União Nacional dos Trabalhadores Angolanos, com a Goan League, com a Goan Political Convention, com a Mozambique African National Union. Neste momento, o MPLA é um dos partidos que está a gastar energias e dinheiro para realizar uma conferência dos partidos nacionalistas de todas as colónias portuguesas de África e da Ásia. Podemos fazer ainda mais? Sim, podê-Io-emos, no futuro. Mas o que temos feito é o que se tem podido fazer com nossos fracos meios materiais, e com um número reduzido de angolanos que se vêm consentindo sacrifícios. É só com a acção humana concreta que se pode fazer avançar uma causa. Os votos e expressões verbais de simpatia são uma inegável ajuda moral, mas não fazem, directamente, andar uma causa. 6 – Eis, caro compatriota, a nossa posição. Mas Angola é pátria de milhões de pessoas. Nós só nos exultaríamos se esses milhões de pessoas tomassem em suas mãos os destinos da sua pátria comum. Que cada um se pronuncie sobre os problemas do país e que cada um lute na unidade! 7 – Mandámos-te o nosso programa, mas ainda não nos deste a tua opinião sobre ele. O que pensas francamente dele? [Deve faltar pelo menos uma folha]

Carta do MPLA (Movimento Popular de Libertação de Angola) a Jonas Savimbi

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