Carta de Lúcio Lara aos camaradas em Conakry

Cota
0014.000.045
Tipologia
Correspondência
Impressão
Dactilografado (2ª via)
Suporte
Papel comum
Remetente
Lúcio Lara
Destinatário
Camaradas de Conakry
Data
Idioma
Conservação
Bom
Imagens
1
Observações

Foi publicado no 1º Vol. de «Um amplo Movimento...»

Acesso
Público

Carta aos camaradas em Conakry [dactilografada] Accra, 1 de Agosto de 1960 Meus caros Estupidamente enviei-vos um telegrama há dias, talvez pela ânsia em que estava de vos dizer algo de concreto. A verdade é que foi a primeira vez que falei com o amigo do Zito directamente, pois o seu conselheiro fazia sempre cera. Ao que constatei ele só tinha sido informado da minha exposição duas semanas antes, o que confirmou as minhas apreensões quanto à actuação do conselheiro. Tivemos uma grande conversa em que veio muito à baila a questão do nosso compatriota [Holden Roberto] que reside aqui. Fiz o possível por pôr os pontos nos ii sem contudo fazer quaisquer afirmações no ar. Informou-me finalmente que tudo indicava que eu devia partir breve, devendo eu telefonar para lá amanhã para saber de alguma coisa. Mostrei-lhe que não estava disposto a estar a secar aqui mais uma semana que fosse na expectativa de partir e mostrei-lhe que tinha tido bilhete marcado para partir esse dia e que o tinha desmarcado em face da conversa tida com o cons.[elheiro], a quem ele aliás atribuiu todas as culpas desta espera toda... É de notar que tendo encontro marcado, como vos disse na última carta para as 9 h 30 só cheguei às falas com o sujeito às 13... É preciso ter estômago... e fome... O Lumumba passa cá creio que amanhã e ao que consta demorar-se-á 2 dias. Deve ser muito difícil contactar com ele; no entanto vou tentar o impossível, para de viva voz tentar saber algo das suas intenções a n/ respeito; vou aproveitar ao mesmo tempo falar-lhe nos médicos que poderiam ser-lhes úteis neste momento (refiro-me claro aos n/ amigos que estão na Europa). Mas como vos disse deve ser muito difícil contactar com ele. Chegou hoje aqui o amigo da Côte d'Ivoire que pediu pª traduzirmos aquele artigo italiano. Vem radioso... Espero que tenham recebido a carta que foi por mão própria (por um primo (?) do v/ vizinho Dr. Ba). Como vos disse logo que parta (se partir) telegrafarei. Infelizmente nada mais posso adiantar quanto à m/ viagem. Falei há dias com o Secretário Geral da AAPC. Diz que pessoalmente, como Sec. Geral não pode enviar telegramas de protesto contra as prisões recentes e as outras arbitrariedades com a defesa dos réus, mas apenas protestar contra a presença dos lusos em África. Terá razão em parte, mas a verdade é que tenho a impressão que se não fosse ser chateado nem isso faria. De resto limitaram se a mandar a circular junta após a minha conversa com o secretário administrativo. O Sec. Geral diz que está convencido que o CPP [Convention People's Party] e o TUC [Trade Union Congress] farão meeting; vamos a ver. Ele disse-me também que esteve com alguns de vós aí. Quando lhe perguntei se tinham trocado quaisquer impressões, disse-me que não, mas que vocês lhe tinham entregue um «papel» (sic), que pelos vistos nem leu. Reclamei quanto ao facto de não estarem em contacto connosco, ao que todos eles prometeram tomar medidas para que isso não se volte a verificar. Ontem aqui no campo fizemos uma espécie de levantamento do rancho. Deram-nos durante o almoço e o jantar, os eternos pescoços de galináceo, mas desta vez «podre» de cheirar mal. Foi uma bronca. O responsável, que por sinal é uma excelente pessoa (é das Índias Ocidentais) ficou fulo connosco, mas quando foi à Frigidaire buscar o resto que tinha sobrado, para nos certificar da qualidade dos ditos pescoços de galináceo, veio de lá um fedor que ele mesmo não podia suportar. A verdade é que aqui se passa fome, o que é de lamentar. Enfim, étapes da revolução... Até à próxima. Abraça-vos o

Carta de Lúcio Lara (Accra) aos camaradas em Conakry

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