Carta de Viriato da Cruz a Lúcio Lara

Carta de Viriato da Cruz
[manuscrita]

Conakry, 27 Fevereiro 1960
[Acrescentado à mão por Lúcio Lara: R 5/3]
Caro Lara,

De posse da tua carta de 21 do corrente.
Efectivamente estive no Seminário Sindical de Dalaba. E, anteontem, por intermédio do Tohiri, enviei-te uma carta. A propósito: aconselho-te a atar as melhores e mais profundas (se bem que sempre prudentes) relações com os sindicalistas daí. Estou sob a impressão de que o movimento sindical africano vai ser das coisas mais sérias, mais activas, mais unidas e mais consequentes de África inteira.
O Seminário de Dalaba destinou-se a dar uma formação sindical mais elevada a quadros dirigentes do sindicalismo africano. Esse Seminário foi realizado com ajuda da Federação Sindical Mundial e sob direcção da UGTAN. Eu fui, nele, a única pessoa sem nenhuma responsabilidade sindical. Felizmente a minha formação política e económica (e mesmo de teoria sindical) contribuiu para que a matéria do Seminário não tivesse sido completa novidade para mim. A minha participação no Seminário confere-me, hoje, diante do sindicalismo africano, uma certa autoridade que estou pondo imediatamente ao serviço dos nossos interesses específicos.
Possivelmente participarei de outras Conferências Sindicais. Proximamente em Dakar (a partir de 11 de Março) e em Casablanca (Maio). A Conferência de Dakar versará sobre o «Seguro Social» dos trabalhadores. Na expectativa de eu participar dessa conferência, agradecia que me enviasses, na volta do correio, o material que tenhas aí sobre a legislação do trabalho, sobre Seguro Social e sobre problemas gerais dos trabalhadores em Angola (principalmente) e em outras colónias portuguesas. Se te for possível pedir a Lxª [Lisboa] material (legislação sobretudo) sobre o Seguro Social dos trabalhadores nas colónias, seria uma óptima coisa. Mas que tudo chegue a tempo de me permitir preparar algo para a Conferência de Dakar.
2 – Podes enviar material da Conferência de Túnis para os seguintes endereços:
(ANGOLA)
– Dr. Eugénio Ferreira. C.P. 535, Luanda.
– Dr. Diógenes Boavida, C.P. 2641, Luanda.
– Monsenhor Manuel das Neves – Paço Episcopal – Luanda.
– Liga Nacional Africana – Luanda.
– Associação Regional dos Naturais de Angola – Luanda.
– Associação Africana do Sul de Angola – N. Lxª [Nova Lisboa]
– Jornal «A Província de Angola» – Luanda.
– Jornal «O Apostolado» – Paço Episcopal – Luanda
– S.E. Revma. o Arcebispo de Angola – Luanda
– «Jornal de Benguela» – Benguela
– Dr. Amílcar Barca – Benguela
– Governador Geral de Angola – Luanda.
Acho que devemos começar a fazer chegar às autoridades dos Governos civis dos nossos países cópias do nosso material político. Eis porque incluo na lista o Governador Geral. Deves estar de acordo que a melhor maneira de oficializar a nossa política é pôr os governadores, os Ministros e Salazar a falar (mesmo mal) mas a falar, nos seus discursos, da nossa actividade política anti-colonialista.
3 – Junto te remeto cinco dinars (dinheiro tunisino).
4 – O que fazes aí? Tens estado em contacto com Lxª? Leste a reportagem sobre Angola, publicada no «Le Monde» de 10 e 11 de fevereiro corrente? Na última reportagem fala-se do M.P.L.A. As duas reportagens são muito boas.
5 – Cumprimentos à Ruth. Beijos ao Paulinho. Saúde!
O meu melhor abraço
V.

P.S. – Já fiz e vou expedir, neste momento, uma nova exposição (pedida) para o Ministro dos Negócios Africanos de Ghana.