Carta de Lúcio Lara a Abel

Cota
0011.000.023
Tipologia
Correspondência
Impressão
Dactilografado (2ª via)
Suporte
Papel comum
Remetente
Lúcio Lara
Destinatário
Amílcar Cabral
Data
Idioma
Conservação
Bom
Imagens
2
Observações

Foi publicado no 1º Vol. de «Um amplo Movimento...»

Acesso
Público

Carta a Amílcar Cabral [dactilografada] Casablanca, 21 de fevereiro [de 1960] Caro Abel Cá vim encontrar a tua carta que tal como o telegrama enviado para Marselha me sossegaram quanto ao problema da t/ esposa. Junto envio a carta que ela tinha escrito para Túnis e que só agora encontrei entre a papelada, razão por que ta não enviei há mais tempo. Espero que tenhas decidido tudo que vos diz respeito da melhor maneira. Suponho que não deve haver perigo iminente que ela volte pª casa, mas convém tomar o máximo de precauções. Os amigos daqui deram-nos a hospitalidade prometida e estamos muito bem instalados na Casa da União Marroquina do Trabalho. Dado que se vivem aqui horas bastante trabalhosas, com o caso da bomba francesa, ainda não tive oportunidade de conversar a sério com os dirigentes da U.M.T. a fim de estabelecer um pequeno programa que me permita aproveitar da melhor maneira para a nossa luta o tempo que cá estiver. Vejo certas possibilidades de deixar bem vincadas todas as formas de ajuda que carecemos e creio que teremos um apoio concreto dos sindicalistas daqui que são de facto gente de acção que não perde muito tempo com coisas vagas à maneira de certas organizações políticas nossas conhecidas. Logo que possa dar-te-ei pormenores do que for fazendo. Por um amigo de cá que chegou de Conakry soube que o V. [Viriato da Cruz] está lá e que até estava a participar num Seminário sobre problemas sindicais que acaba a 23, sendo mesmo possível que vá depois a Dakar a uma outra reunião de sindicatos. Isto é muito bom, pois mostra que o n/ amigo já está vivendo uma vida de acção que muito contribuirá para o reforço da nossa luta. Este amigo que veio de Conakry não me soube dizer nada sobre o que teria acontecido ao V. em Ghana, mas o facto de ele estar em Con. pode significar que as coisas no Gh. não correram pª já muito bem. Aguardemos porém notícias. Eu vou-lhe escrever hoje e se souber algo comunico-te, pedindo-te que faças o mesmo, pois temos necessidade de saber sempre o que se passa connosco para melhor estabelecermos os nossos planos de acção. Acaba hoje uma Semana Internacional pª a defesa das Liberdades Democráticas e Sindicais. Só ontem tive conhecimento desse facto e até há pouco ainda estive indeciso sobre se devia telegrafar ao BIT de Genève pedindo que intercedessem junto do Governo Português no sentido de respeitar os acordos internacionais respeitantes àqueles direitos e liberdades. Pensando melhor, porém, resolvi não o fazer. Em nome de quem? Do n/ Front seria algo descabido, pelo menos assim me pareceu à priori. Assinar o telegrama com os nossos nomes também não é para já significativo. Resolvi pois não o fazer e apenas tomar nota de mais esta ausência nossa e ver como será possível repará-la. Dado que muito em breve (Maio), se realiza a Conferência dos Sindicatos Africanos, nós, embora não tendo sindicatos a representar, podemos enviar ou bem um observador, ou bem propor uma resolução concreta, que me parece dever consistir num pedido a todas as organizações sindicais representadas para fazerem por um lado pressão directa sobre o Gov. Port. e por outro lado pedirem a intervenção das Organizações internacionais no sentido de obrigar o Gov. P. a cumprir os seus deveres quer no que respeita aos Sindicatos, quer no que respeita às outras liberdades democráticas. Se o problema de nos juntarmos se resolver dentro em breve teremos ocasião de falar sobre este assunto. Devemos mesmo todos começar a preparar uma agenda sobre as questões que devemos tratar naquilo que deverá ser como que um Congresso ou uma reunião Magna da Frente. Diz-me se aproveitaste comunicar para Lx. [Lisboa] todas as modificações, CARTA inclusive, havidas na Organização. Tenho esperança que sim. Aqui ofereceram-me a possibilidade de passar ao copiógrafo o que fosse necessário. Penso que seria de aproveitar fazer umas 200 cópias da CARTA em francês. Tu aí tratarias como ficou combinado da impressão da Carta em português e da sua tradução em inglês. Creio que terias possibilidade de a fazer copiografar em inglês. Trataríamos depois de legalizar ou registar a FRAIN na ONU. Nada sei de concreto sobre o julgamento dos nossos amigos. O M. [Mário de Andrade] apenas me disse na carta que me escreveu que estava à espera de um advogado de Lx, mas nada mais. Será que sempre irá lá um advogado da Ass. Int. de Juristas [Associação Internacional de J.]? Que pensas da hipótese de se tentar que algumas organizações sindicais ou políticas telegrafem ao Juiz Dr. JORGE HENRIQUE DA CRUZ PINTO FURTADO que é quem vai presidir ao julg. de 7/3 mostrando-lhe a sua preocupação quanto ao destino dos nossos camaradas? Diz-me logo que possas o que pensas do assunto. Fizeste algo para a tal brochura afro-as. [afro-asiática]? Eu vou começar hoje a trabalhar nisso. Receio bem que fiquemos um pouco atrasados, mas dadas as circunstâncias da nossa vida era difícil ter já tudo pronto. Eu só amanhã terei em meu poder a mala onde tenho a maior parte da documentação. Essa mala esteve sempre fora do meu alcance desde 7 que foi quando a preparámos para a viagem. Quero ver se em todo o caso não perdemos esta oportunidade, por isso te peço que me envies logo que possas o que tiveres feito sobre Gu. e C.V. [Guiné e Cabo Verde]. Esta já vai longa. No fundo destinava-se apenas a dar-te o m/ endereço aqui que é o seguinte: L. Lara – Maison de l'U.M.T. – rue de la Marine – Casablanca. Se fores a casa dos nossos amigos comunica-lhes. Aliás a Ruth deve-lhes escrever breve a esse respeito. Não te esqueças de tentar um contacto com a Goan League. Creio que isso tem o maior interesse, na previsão de determinadas acções concertadas que venham a ser possíveis. Bem, meu caro. Bom trabalho e até breve. Espero as tuas notícias. Saudades da Ruth. O Paulchen cá vai andando, cada vez mais confuso com tudo o que se passa à sua volta. A Lena ainda está contigo? Como reagiu a Iva [I. Cabral] a essas viagens imprevistas? Se ambas aí estiverem dá-lhes saudades nossas. Um bom abraço do

Carta de Lúcio Lara (Casablanca) a Abel [Amílcar Cabral]

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