Liège, 29 de Janeiro de 1960
Caro amigo Lúcio
É com bastante prazer que traço estas linhas. Paris ficou para trás, agora aqui passo os dias quasi inteiramente a escrever e a ler.
Esta carta, como deves ter notado, tem a data sublinhada. É gôsto que tenho pelo “processo”.
Já não tenho notícias vossas há umas 3 semanas, e é evidente que estando agora aqui, vais ter uma maçada suplementar em escrever-me.
Tenho alguns projectos que penso poder realizar até ao fim do ano, embora me falte alguma documentação. Serei talvez obrigado a pedir-te auxílio nesse sentido.
Quando ainda em Paris, pediras-me uns livros. Houve uns percalços na minha vida, e infelizmente não pude satisfazer o teu pedido - com pesar podes crer. Por enqunato tampouco posso ainda enviar-tas. No entanto conservo ainda comigo a lista dos quatro livros, e espero que, dentro de um mês, poderei comprá-los. É que penso conseguir ganhar umas massas em breve, não sei ainda nada de certo.
Assim pois, amigo Lúcio, cá estou no meu novo país.
Diz à Ruth que será com prazer que a receberei cá - ou que vocês me receberão, aí, ou ailleurs. Boa saúde para o miúdo. A Andrée fala basto em vós, e vocês, não imaginam como ela gosta de vocês.
Cá por mim, só desejo boa sorte e que em breve nos encontremos. É preciso ver como arranjar essa coisa da escola pró miúdo.
Saudades. Abraços e muitos beijos.
Para o Tutu e todos os nossos amigos.
Cumprimentos ao Bacouche se o vires.
Vosso Marcelino
Carta de Marcel [Marcelino dos Santos] (Liège) a Lúcio Lara.