Carta de Viriato da Cruz a Lúcio Lara

Cota
0007.000.048
Tipologia
Correspondência
Impressão
Manuscrito
Suporte
Papel comum
Remetente
Viriato da Cruz
Destinatário
Lúcio Lara
Data
Idioma
Conservação
Bom
Imagens
2

13. 11.59

Caro Lara,

    Apesar de hoje ser sexta-feira e dia 13, consegui renovar o meu séjour para até dia 30 deste mês. Só mais 15 dias.
    No telegrama que te enviei por carta posta no correio há duas horas, onde está:
«... By Portuguese cosignatory», deverá estar: «...By Portugal consignatory…». É este o motivo porque te escrevo esta nova carta. Quanto aos B., a Madame continua a ser chata na maneira de apresentar as suas queixas. Que eles se queixem de que eu não lhes escrevo - isso é admissível e justo. Mas que eles ponham acento no facto de eu não lhes dizer onde estou - isso é inadmissível para mim. Eu não estou obrigado - bem pelo contrário - a pôr ninguém, estranho aos n/ interesses, ao corrente dos meus domicílios. Essa exigência da B. só revela que ela, ou ainda não compreendeu a seriedade da n/ actividade, ou está a insistir, chatamente, em mariquices inúteis. Estou absolutamente convencido de que a Mme De B. poderá queixar-se do m/ silêncio, mas não faz exigências de saber onde me encontro.
    Estou também convencido de que, na altura em que a B. te disse que sabia onde eu me encontrava, ela não sabia nada (não tinha prova do que te afirmava): estava era a explorar-te e a fazer chantage. Porque não fez ela menção no jornal onde vinha anunciado o tal encontro de escritores?
    Eu continuo a teimar: devo escrever-lhes, sim senhor; mas não tenho obrigação de abrir uma excepção especial para os B. afim de lhes dizer onde me encontro. Isto é simples bisbilhotice. Que utilidade tem, para eles e para mim, essa informação?
    Não visitei nem me apresentei a nenhuma das pessoas conhecidas da B. (aliás duas) que habitam neste lado. Isto, já para evitar controles de informações sobre a minha pessoa - o que me chateia e não admito.
    A minha posição é clara: A César o que é de César; e a Deus o que é de Deus. Eu não misturo política com amizade. Isto é, nego-te a fazer descer a política ao nível das conversíces «domésticas».
    O egocentrismo da B. chega ao ponto de se esquecer que não dou informações do meu paradeiro a ninguém. Se ela sabe que a Deb. desconhece o meu paradeiro, porque diz que que eu desconfio deles? Nesse caso, desconfio de toda a gente, até de muitos dos m/ amigos de África, até de minha Mãe. Mas este argumento não lhes interessa é prosseguir na lenga-lenga de uma incompreensão chantagista. A mim, sinceramente, nada disso me cria conflitos psicológicos.

            (Assinatura)

Carta de Viriato da Cruz (Berlim?) a Lúcio Lara.

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