Ffm 17/X/1959
Meu caro V. [Viriato]
Esperei até ao último momento que viesse algo do Gh[Ghana], para ainda te dizer qualquer coisa sobre o assunto.
Tinha-lhes perguntado no telegrama se era possível termos cá os via antes de 13 e nem uma resposta ao telegrama veio.
Por muito que possamos compreender as enormes dificuldades político diplomáticas que o n/ caso encerra, não sei se algo justifica que não tenham respondido ao telegrama algo como que enviei. Frisei-lhes bem que o teu pass caducava a 18, e não percebo porque nem ao menos desse caso trataram. Será que eles vêem outras maneiras de discutir o assunto. Mas eles sabem também que a n/ situação aqui é insustentável por mais tempo. Eu esgotei praticamente as finanças do meu sogro, e terei que recorrer a outro «empréstimo» se tiver que viajar.
A situação aqui em casa já é notoriamente indesejável. Eles têm sido umas óptimas pessoas, mas de há um tempo nota-se que coitados estão fartos. Quando vim ainda procurámos quartos (que aliás extraordinariamente caro) mas a família insistiu que por mais 2 meses não valia a pena fazermos essa despesa. Entretanto os dois meses passaram... Hoje vou escrever a Paris pedindo ao M. que veja na Embaixada de G. quanto tempo levam a dar um visto de turista. E se não tiver qualquer resposta até dia 15 de Novembro embarco para qualquer sítio. Não é bem assim…
Entretanto penso escrever novamente segunda feira ao novo Advisor ou talvez ao Nkrumah. Ainda vou pensar. Estou inclinado por este último.
A tua carta pela calma que mostravas, sossegou-me. Eu estava algo preocupado (e estou) contigo, pois não percebo como te vais desenvencilhar. Seria bom veres já aí as hipóteses que há de embarque. Barco e avião. Embarcarmos aí afigura-se-me (após 18/X) mais seguro, a não ser que surja uma nova forma do Gh. Aqui não se pode embarcar sem visto. E aí? Se aí se pudesse, talvez fosse furo embarcarmos sem visto e anunciarmos a nossa chegada. Depois tudo é mais fácil. Pelo menos tu podias já fazê-lo.
Como vai o negócio da Editora. Diz qualquer coisa.
Hoje não escrevo mais. Quando puder respondo convenientemente à tua última carta. Saudades de todos.
Abraços do Lúcio [assinatura].
Carta de Lúcio Lara (Frankfurt/Main) a Viriato da Cruz