Carta da Frente Comum à ONU

Cota
0015.000.046
Tipologia
Correspondência
Impressão
Policopiado
Suporte
Papel comum
Autor
Front Commun des Partis Politiques de l'Angola (ALIAZO e MPLA)
Remetente
ALIAZO e MPLA
local doc
Léopoldville (Rep. Congo)
Data
Idioma
Conservação
Mau
Imagens
3
Observações

Foi publicado no 1º Vol. de «Um amplo Movimento...»

Acesso
Público

Carta da Frente Comum à ONU [policopiada – original em francês] FRENTE COMUM DOS PARTIDOS POLÍTICOS DE ANGOLA CAIXA POSTAL Nº 8085 LÉOPOLDVILLE (REPÚBLICA DO CONGO) Léopoldville, 31 de Outubro de 1960 Senhor Presidente da Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas «ONU» NOVA IORQUE Senhor Presidente Os principais partidos políticos angolanos cujos nomes seguem, que têm as suas raízes em Angola mas operam mais livremente nos territórios dos países independentes, tomam respeitosamente a liberdade de, pela presente, virem acrescentar mais alguma informação às numerosas informações que já possui sobre a sorte de Angola e do seu povo. Trata-se pois dos partidos: Movimento Popular de Libertação de Angola «M.P.L.A.», União das Populações de Angola «U.P.A.», Aliança dos Originários do Zombo «ALIAZO», agrupando a maioria dos originários de Angola, residentes tanto em Angola como no estrangeiro. Estes partidos possuem bureaux pelo mundo fora, nomeadamente: na Europa (França: Paris – Inglaterra: Londres – Bélgica: Liège – Alemanha Federal: Hamburgo e Düren); na América (Estados Unidos: Illinois – Brasil: Rio de Janeiro e São Paulo); em África (Tunísia: Túnis – Guiné: Conakry – e enfim nas duas Repúblicas do Congo, em toda a sua extensão). É pois em nome destes partidos que tomamos a liberdade de lhe dirigir a presente carta. A este título queremos antes de mais testemunhar-vos a nossa viva gratidão pela resolução votada por unanimidade pela Assembleia das Nações Unidas de que tendes a presidência, resolução pela qual os povos amantes da liberdade e que têm os seus representantes na ONU tomaram desta vez posição no sentido de os territórios não-autónomos se fazerem representar nas sessões da ONU para defenderem eles próprios os seus próprios interesses. Ao ouvirmos esta notícia – que foi recebida com consternação em Portugal – os nossos corações quase que sangraram de emoção e ficámos um pouco aliviados ao pensar que a partir de agora o véu que sempre encobriu a miséria mais inaudita dos angolanos, fruto da obra colonizadora de «cinco séculos» de Portugueses em Angola, será enfim retirado para que se manifeste a verdade sobre as reais intenções de Portugal quanto às colónias sob sua dominação, que cinicamente se empenha em apelidar de províncias ultramarinas. Contudo o nosso alívio teria sido total se não soubéssemos nessa altura que, devido à força das circunstâncias, Portugal acabará por ceder e fará representar os nossos territórios no seio da ONU, mas infelizmente fá-lo-á através dos seus apaniguados, homens já corrompidos, que não querem saber dos massacres que continuamente se abatem sobre milhares de angolanos cujo único crime é reclamarem um tratamento com o mínimo de humanidade possível. Pretendendo antecipar-se a esta manobra, os signatários da presente carta, dirigiram-lhe, ao mesmo tempo que os seus vivos agradecimentos pela adopção desta resolução, a sua petição onde pediam que esta medida fosse aplicada de forma total e concludente, aceitando apenas representantes oriundos dos partidos políticos desses países, que são quem representa legitimamente os povos oprimidos, e não representantes escolhidos a dedo pelos colonialistas, cuja única intenção é de abafar a causa dos oprimidos em proveito dos seus mesquinhos interesses. Ora as nossas apreensões tinham fundamento, pois não se passaram sequer dois dias e vínhamos a saber que Portugal tinha organizado manifestações em Moçambique, uma das «províncias portuguesas», para opor os nativos do país, sob a ameaça das armas, a esta resolução que prejudica Portugal, ao dar aos colonizados o direito de se fazerem representar por homens da sua confiança. No momento em que vos escrevemos, manobras semelhantes estão em vias de preparação em toda a extensão de Angola, com o mesmo intuito de opor, sempre sob a ameaça das armas, o povo angolano a esta resolução que lhe confere um primeiro direito de se fazer ouvir. Não quisemos esperar a realização destas manifestações forçadas que enganam a opinião mundial. Por isso nos apressamos em o avisar, Sr. Presidente, através do nosso telegrama deste dia, cujo texto segue: «POPULAÇÕES ANGOLANAS OPRIMIDAS PROTESTAM CONTRA MANOBRAS DISSIMULADAS DOS COLONIALISTAS PORTUGUESES OBRIGANDO A MANIFESTAR EM BREVE SOB AMEAÇA ARMAS CONTRA DECISÃO COMISSÃO TUTELA ONU STOP ESTAS MANIFESTAÇÕES NÃO TRADUZEM DE MODO ALGUM OPINIÃO POVO ANGOLANO FULLSTOP SEGUE CARTA» Como dizíamos acima, os portugueses, ao se darem conta da importância da decisão do Conselho de Tutela, e conhecendo o peso dos povos membros que a votaram, já se puseram em campo para detectar, entre os Angolanos, os homens que defendem os seus interesses. Não duvidamos contudo da boa fé dos nossos irmãos que os Portugueses vão preparar para defender a causa de Portugal, pois assim que lhes couber essa sorte fatal se verão diante dum dilema cruel: trair o povo angolano e prolongar assim a sua escravidão em proveito de um colonizador desumano – ou, em vez disso, desvendar a verdade que envergonharia Portugal e aceitar então a morte, seja qual for a forma que os portugueses lhe derem, pois com efeito os civilizadores lusitanos possuem vários meios para matar os seus súbditos, que seria supérfluo pormenorizar. Sabe agora, Senhor Presidente, que a delegação que seria preparada e composta por Portugal e enviada por ele para defesa dos interesses de Angola ou de qualquer outra colónia portuguesa, não seria em nada diferente das precedentes que sempre defenderam a causa de Portugal e justificaram por todos os meios a exploração dos povos colonizados. Para preparar e formar esta delegação, Portugal parece fixar, neste preciso momento, a sua escolha nas pessoas que passamos a indicar: – Sr. Manuel Pereira do Nascimento, contabilista de empresas e presidente da Liga Nacional Africana e membro da gestapo portuguesa «P.I.D.E.» (Polícia Internacional de Defesa do Estado); – Agnelo de Castro Paiva, antigo funcionário das Finanças e actualmente ligado ao Fundo de Publicações Oficiais do Estado; – Alfredo Furtado Antas, antigo secretário administrativo, actualmente sem trabalho. Por outro lado, estamos de antemão convencidos que esta delegação não terá qualquer direito de abordar os membros das delegações estrangeiras com assento na ONU e muito em particular os delegados dos países africanos, pois os Portugueses não autorizariam nunca tal contacto dos seus delegados com os de outras delegações, receando que venham a ser dissuadidos pelos seus irmãos africanos. Como o Sr. Presidente pode notar pelo conteúdo desta carta, estamos perfeitamente ao corrente da evolução da situação em Angola, de onde se evadem continuamente muitos dos nossos irmãos que vêm engrossar as nossas fileiras no exterior do país. Para terminar, reiteramos o desejo do povo angolano, que temos o dever de representar: «apenas podem ser considerados interlocutores válidos junto da O.N.U. os delegados da Frente Comum dos Partidos Políticos dos territórios sob dominação portuguesa». Ousamos esperar que a nossa petição venha a ser objecto da sua melhor atenção e mereça o seu apoio a favor da causa dos oprimidos que nós somos e, agradecendo de antemão, pedimos-lhe que aceite, Senhor Presidente, a expressão dos nossos emocionados sentimentos. A FRENTE COMUM DOS PARTIDOS POLÍTICOS DE ANGOLA – ALIANÇA DOS ORIGINÁRIOS DE ZOMBO «A L I A Z O» – UNIÃO DAS POPULAÇÕES DE ANGOLA «U. P. A.» – MOVIMENTO POPULAR DE LIBERTAÇÃO DE ANGOLA «M. P. L. A.»

Carta da Frente Comum dos Partidos Políticos de Angola ao Presidente da Assembleia-geral da ONU, assinado por ALIAZO, UPA e MPLA (Léopoldville)

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